Gonçalo Byrne e a cidade como “organismo vivo”: “O edifício tem raízes e precisa da cidade para viver”

Uma conversa com Gonçalo Byrne, presidente da Ordem dos Arquitectos, sobre a remodelação do Edifício Sede do Banco de Portugal e a importância da arquitectura na vida das pessoas. O podcast No País dos Arquitectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. Subscreva nas plataformas para podcast.

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José Manuel Rodrigues
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Sede do Banco de Portugal
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No 40.º episódio do podcast No País dos Arquitectos, Sara Nunes, da produtora de filmes de arquitectura Building Pictures, conversa com o arquitecto Gonçalo Byrne sobre a remodelação do Edifício Sede do Banco de Portugal, um projecto que foi desenvolvido em co-autoria com o arquitecto João Pedro Falcão de Campos.

Este é o último episódio da terceira temporada do podcast e Gonçalo Byrne, para além de falar desta intervenção, realça também, enquanto presidente da Ordem dos Arquitectos (OA), a importância da arquitectura na vida das pessoas.

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Logo no início da entrevista, Gonçalo Byrne aponta algumas lacunas em Portugal. Se, por um lado, o país tem uma “visão hiper-legislativa”, por outro defende o diálogo entre os diferentes intervenientes para que os arquitectos possam participar não só no “fazer cidade”, mas também para garantir que os critérios de qualidade sejam aplicados nas diferentes intervenções: “O modelo da contratação no exclusivo critério da oferta mais baixa é aplicado na ordem dos 90%, ou 90 e tal por cento. Ou seja, os outros modelos, do Código dos Contratos Públicos (CCP), não são aplicados. O que é que isto quer dizer? Quer dizer: adjudicar ao preço mais baixo, sem ter mais nenhuma outra preocupação é um pensamento único de um critério único que, obviamente, não é um critério de qualidade. Quando muito é um critério de quantidade financeira. Portanto, não há qualquer preocupação da qualidade da resposta. Existe, claramente, uma falta de diálogo entre as formas de conhecimento, entre as profissões e há uma concentração numa jurisprudência, que é fundamental, que é importantíssima, mas que devia estar integrada no mundo do conhecimento bastante mais abrangente”.

Gonçalo Byrne defende ainda que se deve caminhar para “uma cidade inclusiva” e considera que “a qualidade na prestação do serviço da arquitectura” é algo a que “todos têm direito”. Ou seja, não deve ser um assunto que apenas diga respeito às “arquitecturas de luxo” ou às “arquitecturas dos grandes promotores imobiliários”.

Remodelação da sede do Banco de Portugal

Durante a conversa, o arquitecto explica que um dos objectivos do projecto da sede do Banco de Portugal focava-se também na abertura do edifício à cidade. É nesse contexto que Gonçalo Byrne refere que “a cidade é um organismo vivo”: “O edifício tem raízes na cidade e precisa da cidade para viver. Precisa da rua (...) e da vida partilhada das pessoas”.

A intervenção envolveu o reforço estrutural de todo o quarteirão, a reconversão da igreja num “grande átrio” do Banco e Museu do Dinheiro e a introdução de infra-estruturas de acessibilidade, desempenho energético e segurança. Pelo meio, houve trabalhos de demolição, reforço de fundações e escavações: “Era um quarteirão que tinha dentro de si – embora em grande parte escondido – toda essa história da passagem da cidade medieval até a cidade moderna, que é a cidade pombalina. Estava lá tudo. E um dos desafios foi tornar, de algum modo, visível e comunicável essa história”.

O que ficou também visível dentro do Banco e que muitos não imaginavam foi a porta de uma casa-forte que nos transporta para o universo do Tio Patinhas; a antiga Igreja de São Julião, que um incêndio deflagrou em 1816; e o troço da antiga Muralha de Dom Dinis que – tendo estado enterrado sob o saguão do quarteirão – pode ser visto agora por quem visitar a igreja/Museu do Dinheiro.

Esta igreja foi o último espaço, de um conjunto de vários edifícios, que o banco foi adquirindo, entre 1868 e 1933. Sabe-se que, nos anos 70, do século XX, a antiga igreja esteve para ser trasladada. Todas as pedras das suas paredes chegaram a ser numeradas sequencialmente, para permitir a reconstrução do edifício num novo local da cidade. A trasladação acabou por não acontecer em virtude de mudanças políticas, mas os números permaneceram inscritos nas pedras.

Para delimitar e corrigir acusticamente os espaços da igreja e do museu, concebeu-se um conjunto de cortinas. Aqui, a artista plástica Fernanda Fragateiro executou uma pintura manual que reproduz os manuscritos originais do Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.

Lisboa “resiliente”

Durante a entrevista, Gonçalo Byrne faz uma longa viagem no tempo e recua à época medieval. Ao percorrer essa história, o arquitecto mostra como Lisboa é “resiliente” e sublinha que há “uma ponte de contacto muito interessante entre a medicina e a arquitectura”, lembrando as sucessivas epidemias que obrigou a fuga de muitos e provocou a morte da maioria: “A Baixa Pombalina medieval não era flor que se cheire. Quando havia uma peste, as pessoas morriam que nem tordos. As ruas eram labirínticas, tortuosas e estreitas. A construção tinha entre quatro e cinco pisos... Não havia esgoto. O esgoto era a janela (...). Imaginem o que acontecia no centro da cidade quando havia uma peste. As pessoas morriam, de facto, que nem tordos, durante dois ou três anos. Escapavam os aristocratas e os burgueses, que tinham quintas nos arrabaldes”.

Portanto, para a conservação da higiene dos lugares alterou-se a forma de fazer arquitectura: “Esta história da higienização das cidades é uma história paralela fascinante da evolução da forma das cidades (...) e há uma relação directíssima sobre a gravidade e as conquistas que se vão fazendo também no domínio da saúde pública”.

No final da entrevista, Gonçalo Byrne revela ainda o impacto que a arquitectura pombalina assumiu na cidade de Lisboa. À luz do pensamento iluminista, cresce uma necessidade de mudar a cidade, de fazer uma grande reforma na estrutura e na sociedade. Uma das mudanças que o arquitecto aponta diz respeito às igrejas que quebram “a obrigatoriedade do terreno sacro” e passam a ocupar “sempre o topo dos quarteirões” na cidade.

Neste contexto, o arquitecto revela a importância do diálogo e da partilha no desenvolvimento das cidades: “A arquitectura é algo que está intimamente ligado à vida das pessoas e à vida das cidades (...). Eu costumo dizer que o objectivo último dos arquitectos é pensar e projectar com mais gente. Também com os utilizadores porque é fundamental e tem de haver um alargamento deste diálogo. Hoje em dia há, claramente, essa consciência. Basta ler uma iniciativa que se chama New European Bauhaus (NEB), ou seja, o Novo Bauhaus Europeu, que é um documento produzido pela Comissão Europeia, lançado em 2021, para perceber que esta relação com a vida e a arquitectura é fundamental e, sobretudo, com uma vida que se quer de qualidade partilhada”.


No País dos Arquitectos é um dos podcasts da Rede PÚBLICO. Produzido pela Building Pictures, criada com a missão de aproximar as pessoas da arquitectura, é um território onde as conversas de arquitectura são uma oportunidade para conhecer os arquitectos, os projectos e as histórias por detrás da arquitectura portuguesa de referência.

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