“É de prever que a escassez de oferta de imóveis novos no mercado se agrave”

No que toca ao mercado imobiliário, há já consequências diretas, ainda que com impacto limitado, decorrentes da aplicação de sanções pela União Europeia à Rússia.


Depois de dois anos a lidar com uma pandemia sem precedentes nos nossos tempos, quando finalmente começávamos a sentir o perfume do regresso à normalidade, eis que, quase um século depois, a Europa – e o mundo, como não - se vê de novo palco de uma guerra cujas dimensões são ainda difíceis de imaginar na sua plenitude.

O nosso primeiro pensamento vai, obviamente, para as vítimas inocentes, para o socorro possível aos refugiados, para o consolo das famílias divididas e enlutadas, desejando que a paz regresse o mais rapidamente possível.

Mas obviamente que quem tem responsabilidades na condução de um negócio, já de si desgastado por dois anos de pandemia, não pode deixar de refletir sobre as consequências do conflito no leste europeu para a vida dos projetos empresariais.

No que toca concretamente ao mercado imobiliário, há já consequências diretas, ainda que com impacto limitado, decorrentes da aplicação de sanções pela União Europeia à Rússia que, desde logo, restringe a deslocação em espaço europeu e o congelamento de fundos a centenas de cidadãos russos e bielorussos.

Por outro lado, Portugal acabou de suspender a apreciação de candidaturas para Autorização de Residência e Investimento – os chamados “vistos gold – a cidadãos russos. Convenhamos que, aqui, o impacto é limitado.

Segundo dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, entre outubro de 2012 e janeiro de 2022 foram concedidas a cidadãos russos 431 autorizações de residência, ou “vistos gold". Num mercado que transaciona mais de 200.000 imóveis residenciais por ano o impacto é quase nulo.

Mas há mais efeitos do que os meros efeitos diretos que nos devem fazer refletir.

Desde logo, a presente crise introduz genericamente um novo nível de insegurança e incerteza, de que os mercados gostam muito pouco. A incerteza é a maior inimiga do investimento.

Incertezas nos mercados, quer em termos cambiais, quer bolsistas, quer de taxas de juros. Mas incertezas também logísticas, afetando a capacidade de deslocação de pessoas e movimentação de bens. Daí que se imponha olhar com prudência para os tempos que se avizinham.

Sabíamos já que a trajetória em termos de taxas de juro se tinha alterado, pondo fim a um prolongado ciclo de taxas extremamente baixas. Curva esta replicada pela inflação.

Conhecíamos também a escassez de produto novo, sobretudo orientado para as famílias de classe média, que se vivia já em Portugal, agravada durante o período da pandemia e influenciada por fatores como a burocracia - que prolonga excessivamente os prazos de licenciamento -, a fiscalidade – nomeadamente ao nível do IVA -, a escassez de mão de obra e de matérias-primas, cada vez mais caras, e a descapitalização dos operadores do setor, nomeadamente subempreiteiros.

E a prudência diz-nos que dificilmente os fatores anteriormente referidos evoluirão positivamente em contexto de guerra na Europa, pelo que é de prever que a escassez de oferta de imóveis novos no mercado se agrave. E se assim for, a pressão continua sobre o produto usado, fazendo subir os preços e, consequentemente, degradando o acesso ao financiamento.

Tempos incertos, estes, que acima de tudo pedem a paz.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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