Covid-19: creches privadas sem pessoal para manter salas abertas

Contratação de substituição tem sido uma tarefa “muito difícil, senão impossível”, diz presidente da associação de creches particulares. Associação pede apoio ao Governo para reforçar quadros de pessoal e colmatar baixas por covid-19.

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Há cada vez mais funcionários de creches em isolamento Anna Costa

As creches e os jardins-de-infância privados estão a fechar salas devido à falta de educadores e auxiliares relacionada com as baixas por covid-19. A presidente da Associação de Creches e Pequenos Estabelecimentos de Ensino Particular (ACPEEP), Susana Baptista, explicou nesta terça-feira ao PÚBLICO que não estão a conseguir contratar pessoas para um período tão curto, como são os sete dias de isolamento, e isso é “um problema substancial”. Em carta aberta enviada ao Governo, a ACPEEP pede que estas instituições privadas também sejam contempladas com um apoio extraordinário e temporário para reforçar o quadro de pessoal.

“O mais fácil era implementar uma medida que já existe e alargá-la” também às creches privadas, começa por explicar Susana Baptista, que pede que aqueles estabelecimentos sejam incluídos na medida de Apoio ao Reforço de Emergência de Equipamentos Sociais e de Saúde. Esse apoio permite, por exemplo, contratar pessoas desempregadas que estão a receber o subsídio de desemprego sem que percam acesso a ele.

Aprovado pela Portaria n.º 82-C/2020, de 31 de Março, o apoio destina-se a “assegurar a capacidade de resposta das instituições públicas e do sector solidário (IPSS [Instituições Particulares de Solidariedade Social], Misericórdias, Casas do Povo)”, como se pode ler na carta aberta dirigida ao primeiro-ministro e à ministra do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, da qual não constam as creches privadas.

“Tratando-se de um regime extraordinário e, portanto, de carácter temporário e transitório, a vigência da Portaria n.º 82-C/2020 para Apoio ao Reforço de Emergência tem vindo a ser prolongada em função da evolução não linear da pandemia e das pressões que esta foi gerando sobre as entidades nas áreas social e da saúde, mas apenas do sector solidário, deixando desprotegido o público do sector particular, não financiado pelo Estado, que representa cerca de um quarto deste universo”, lê-se ainda na carta aberta, na qual se sublinha que “é urgente o Estado ajudar as organizações a não fechar, para poderem continuar a receber crianças”.

Por isso, a presidente da ACPEEP recorda que “as crianças são as prejudicadas, se não tiverem aulas”. “A única coisa que pedimos é que [o apoio] seja estendido também ao nosso sector, e não se compreende porque é que não foi porque afinal estamos todos a trabalhar para o mesmo”, defende.

Sem esta medida, a tarefa de contratar alguém para substituir durante um período tão curto é “muito difícil, senão impossível”, alerta. “Para virem fazer esta substituição, as pessoas deixam de ganhar do desemprego. É certo que vão receber um ordenado normal, mas também por um período muito curto, e elas não querem isso porque depois, se for preciso, demoram um mês para reactivar o subsídio.”

Outro ponto focado pela dirigente na carta aberta é a alteração do diploma por outra portaria. “Nessa altura, foi criado um incentivo de emergência à substituição de trabalhadores ausentes ou temporariamente impedidos de trabalhar, para todos os sectores, que só pode ser accionado no momento e pelo período que se verifica a ausência de trabalhadores (com candidatura e tempos de resposta associados) e cujo apoio quase não tem expressão (110,80 euros por cada mês de execução do contrato), não respondendo atempadamente nem financeiramente à emergência de cada dia, que só se resolve com um reforço preventivo dos recursos humanos”, conforme se lê no documento.

Para Susana Baptista, isso provoca um outro entrave: além das dificuldades na contratação, “o timing não funciona”. A presidente da ACPEEP pede que este incentivo possa ser activado antes de se verificarem as baixas, uma vez que, diz, “quando as pessoas faltam já se têm de ter outras destacadas para a substituição”. “Não é quando estamos sem educadores e auxiliares que temos de remeter uma candidatura, que pode ainda demorar uns dias, e depois de aprovada quem vem substituir já não é preciso.”

“Esta medida de reforço é muito importante porque permitiria ter cá pessoas de reforço, no período de pico desta vaga, durante um período que pode ir um mês até um máximo de três meses”, sustenta. Para Susana Baptista, esse reforço seria suficiente com uma ou duas pessoas, “três no máximo”, nas instituições, variando as necessidades consoante a dimensão de cada uma.

A presidente da ACPEEP não precisa o número de crianças, educadores e auxiliares que estão neste momento infectados e em isolamento (porque não tem acesso a esses dados), mas dos testemunhos que lhe chegam nota que, “pelo menos, em cinco” estabelecimentos já tiveram de se fechar salas. E nota uma diferença nos contágios: está a haver um aumento notável na faixa etária dos zero aos cinco anos.

“Inicialmente até pensava que as coisas não estavam tão mal porque tinha uma informação aqui e outra ali. De repente comecei a receber uma chuva de informações de pessoas a dizer que já tinham de fechar salas”, assegura.

A maioria dos casos confirmados de infecção, garante, provém de “situações de contacto”. “Ou seja, os pais estão infectados e a criança acaba por ficar em isolamento e quando vai fazer o teste também está infectada, e com os auxiliares é a mesma coisa, têm familiares que ficam infectados e depois o vírus propaga-se de uns para os outros aqui dentro”, explana.

E acrescenta ainda que “estão a aparecer muitos mais casos de infecções em crianças pequenas”, até aos cinco anos. “No ano passado, era mais a nível das crianças mais velhas, na primária, e na creche era quase inexistente. O que notamos agora é que realmente está a haver um número bastante mais significativo de crianças pequenas infectadas, até mesmo no berçário.”

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