Os carros eléctricos históricos da Linha 22 do Porto fizeram nesta terça-feira a sua última viagem e a maioria dos passageiros está triste e surpreendida, sendo desejo da administração que regresse em 2024 e seja prolongada até Matosinhos e Gaia.

“É o último dia da operação da Linha 22 que vai ficar suspensa durante cerca três anos, enquanto decorrerem as obras da Linha Rosa da Metro do Porto, que vai fazer a ligação entre São Bento e a Casa da Música e, portanto, obriga à interrupção na zona dos Clérigos, não permitindo que haja a ligação desde a Praça dos Leões até à Batalha e Guindais”, anunciou Rui Saraiva, administrador da Sociedade de Transportes Colectivos do Porto, S.A (STCP), durante uma das últimas viagens que o carro eléctrico ainda ia fazer nesta terça-feira. A suspensão “entristece os portuenses, entristece quem quer visitar o Porto”.

Maria Alice Reis, 60 anos, natural de Bragança (Trás-os-Montes) e há 47 anos a viver no Porto, lamenta que a Linha 22 do eléctrico vá ser suspensa durante os próximos três anos. “Eles só desistem de coisas que nos fazem falta a nós. Porque é que hão-de desistir desta linha?”, questiona Maria Alice, resignando-se com a novidade das obras para aumentar a linha do metro do Porto. “O que é que havemos de fazer. Não podemos passar por cima das obras”.

Maria Alice diz que é “giro” andar de eléctrico e que não se anda “em cima uns dos outros”, factor essencial em tempos de pandemia. “Faz parte da cidade e de nós. É agradável. Há ventilação. Eu gosto, se não, não me tinha metido nele”, conta, referindo que prefere o eléctrico a qualquer outro meio de transporte público.

Todavia, a empresa STCP sublinha que vai manter as Linhas 1 e 18, para permitir a quem visita a cidade do Porto poder desfrutar de outros carros eléctricos, que transportam os passageiros numa espécie de viagem ao passado, em que o caminho é feito em ritmo lento e aos solavancos pelas ruas tortuosas e íngremes do Porto, como que a embalar os sonhos dos amantes de transportes típicos e antigos.

João Barbosa, 77 anos, recordou à Lusa que andava de eléctrico no seu tempo da mocidade, “quando ainda não havia autocarros”, exclama. Foi apanhado de surpresa ao ter conhecimento que a Linha 22 do eléctrico ia ser suspensa durante os três próximos anos. Para o passageiro septuagenário, o eléctrico é um meio de transporte mais “aconchegado” e “mais lento”.

No interior do carro eléctrico, uma família francesa da cidade de Nantes, acomodada nos fofos bancos de cor carmim, conta que andar de eléctrico é como fazer uma “viagem ao passado”. Thierry revela que está a visitar o Porto pela segunda vez, mas a descobrir a Linha 22 pela primeira vez e descreve que através do carro eléctrico prevê redescobrir a cidade através num “universo antigo” e “magnífico”. “Quisemos vir ver como tudo acontece no interior de um eléctrico. Viajar num outro mundo. Entrámos numa outra época”, conta o turista francês, revelando que em Nantes os meios de transporte são “muito mais modernos” e já não se consegue fazer uma viagem num meio de transporte tão antigo como no Porto.

Marie e a sua família francesa também estão a passar uns dias de férias no Porto. Chegaram do sul de França, de perto da cidade de Montpellier, e escolheram passear no Porto no eléctrico, por ser um meio de transporte “tradicional” e “autóctone” portuense, que faz parte da cidade. “É lindo ver autênticos eléctricos que continuam em actividade. É impressionante ver material que foi feito há tanto tempo e que ainda funciona nos dias de hoje. Porque actualmente, na nossa sociedade de consumo, as coisas são feitas com prazos de validade curtos. Por isso, estamos perante um trabalho artesanal. É óptimo”.

Charlotte, de nove anos, filha de Marie, acrescenta que adorou conhecer a cidade do Porto de carro eléctrico. “Eu amei muito conhecer a cidade que não conhecia através das janelas do eléctrico e ver os espaços, que são muito lindos”.

Daqui a cerca de três anos, em 2024, a STCP tem o sonho de fazer regressar a Linha 22 do eléctrico com um percurso prolongado até Matosinhos e até à ribeira de Vila Nova de Gaia, dois concelhos limítrofes do município do Porto.

“A STCP tem sonhos. O Porto e os municípios que agora são os accionistas da STCP - que agora passou a ser uma empresa intermunicipal -, temos sonhos de estender a rede de carro eléctrico histórico e turístico no território. Estendê-lo dentro da cidade do Porto, provavelmente prolongá-lo para Matosinhos, provavelmente também poder sonhar prolongá-lo para a Ribeira de Vila Nova de Gaia”.

Em 2019, o número de utilizadores das Linhas de carro eléctrico 1, 18 e 22 foi “superior a 700 mil passageiros”, revelou Rui Saraiva.