Parem de desvalorizar os problemas dos outros

Num mundo tão vertiginoso, tão atormentado, tão inquieto e inseguro, a quantidade de pessoas que desenvolve depressões, ansiedades e se isola porque receia o olhar crítico de quem, assertivamente, lhes diz “isso não é um problema sério” é cada vez maior.

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Numa época de tanta inquietação, perturbação, incerteza e insegurança, aumentam os problemas de ordem psicológica, mental, psiquiátrica. Porém, por se tratar de uma área não visível, no sentido mais materialista e concreto do termo, a saúde mental e a ajuda psicológica nem sempre são bem vistas aos olhos dos mais cépticos. A procura de um psicólogo, de um psiquiatra, de um técnico de saúde mental estigmatiza, discrimina, julga e leva cépticos e críticos a desvalorizar as dores, as ansiedades, o mal-estar de quem sofre, muitas vezes, em silêncio. Porque tem medo, vergonha, incapacidade de exteriorizar as suas fragilidades emocionais, pois, ao fazê-lo, não tolera ouvir aquelas doutas máximas “deixa lá, isso passa”, ou “há pessoas com problemas tão graves e tu a queixares te de coisas tão pequenas”.

Percebemos que se trata de uma problemática que afecta os mais velhos, mas também os mais novos. São cada vez mais os jovens que, na espuma dos dias, têm dificuldade em gerir as suas inquietações e inseguranças, elevando o seu nível de frustração. A facilidade com que se é muitas vezes acusado de ingratidão, de não ter noção do que se passa à sua volta só porque se exterioriza mal-estar, inquietações ou debilidade emocional é inibidora para quem sofre, porque quem julga. Sente-se na posse do conhecimento de si e do outro e, do alto desse conhecimento absoluto, numa atitude, algumas vezes, de sobranceria e arrogância, despreza e menospreza, pondo quase sempre em equação a fragilidade de alguém com os problemas do mundo, da guerra, da fome, da falta de água, dos problemas ambientais. Como se de uma lógica matemática se tratasse ou uma qualquer equação de primeiro ou segundo grau fosse suficiente para aniquilar uma fragilidade, insegurança ou mal-estar mental de um indivíduo.

Para além de estas comparações serem despropositadas e não tranquilizarem alguém em sofrimento interior, podem conduzir a um processo de autodestruição, de falta de auto-estima, aumentando inseguranças e debilidades psicológicas e não ajudam quem sofre. Obviamente, que todos os problemas são importantes, que nem sempre os nossos problemas são tão graves como pensamos, mas, quando a saúde mental está fragilizada, a percepção da gravidade dos problemas agrava-se e é nesses momentos que é preciso saber ouvir, perceber, ajudar, apoiar o outro e não o desvalorizar - ao fazê-lo estamos a contribuir para a sua destruição, desalento e frustração.

Não ajuda lembrar que há fome no mundo, problemas económicos, falta de água ou pessoas com doenças terminais, pois todos estes problemas, num momento da fragilidade mental de alguém, tornam-se egoisticamente irrelevantes; é importante perceber esse tipo de egoísmo, porque, na verdade, não o é. Ajuda relativizar os problemas, mas quando percebemos que alguém não está mentalmente forte impõe-se o respeito por essa dor e esse mal-estar e o não julgar, pois todos os problemas contam para quem está frágil e é válido e legítimo que contem.

Por vezes, a bolha em que vivemos torna-nos demasiado egocêntricos, olhamos com sobranceria para os outros e nem sempre temos a humildade de perscrutar o outro: falta-nos isso, saber perscrutar. Num mundo tão vertiginoso, tão atormentado, tão inquieto e inseguro, a quantidade de pessoas que desenvolve depressões, ansiedades e se isola porque receia o olhar crítico de quem, assertivamente, lhes diz “isso não é um problema sério” é cada vez maior. Acredito que todos os problemas são sérios e devem ser ouvidos e discutidos, independentemente da sua origem e do grau de importância para os demais, em particular, numa altura como esta, em que as nossas circunstâncias são difíceis, as nossas incertezas são muitas, o apoio e ajuda são mandatórios.

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