Fim das moratórias: não adiar o papel do advogado

Quando o fim das moratórias se torna uma realidade e quando a evolução da situação de saúde pública, de que depende a desejada recuperação económica, ainda não é clara, poderão vir a verificar-se situações complicadas para quem terá de retomar algum destes tipos de pagamento de créditos.

Em março de 2020, o Governo anunciou a possibilidade - mediante a verificação de determinados requisitos - de adesão a moratórias quanto aos créditos bancários, para permitir às famílias e às empresas afetadas pela pandemia suspender o pagamento dos seus créditos.

Os particulares abrangidos por este regime beneficiaram ou continuam ainda a beneficiar do “alívio” do pagamento das prestações até ao final do próximo mês de setembro no que respeita às moratórias públicas. Quanto às empresas, as de setores afetados pela pandemia continuarão a beneficiar da suspensão do pagamento de juros ou capital até setembro, enquanto as demais manterão a suspensão do pagamento de capital que se encontra em dívida, pois iniciaram já o pagamento no que toca aos juros no passado mês de abril.

Entretanto, por iniciativa de vários bancos, foi lançada uma medida idêntica (as chamadas moratórias privadas), mais abrangente do que a moratória pública (que apenas contemplou o crédito à habitação e crédito pessoal para fins de educação), permitindo diferir também o pagamento dos juros/capital de créditos pessoais e automóvel, até 75 mil euros. Nestes casos, os pagamentos do crédito hipotecário foram retomados em abril, os dos restantes créditos sê-lo-ão a partir de julho.

Assim, quando o fim das moratórias se torna uma realidade e quando a evolução da situação de saúde pública, de que depende a desejada recuperação económica, ainda não é clara, poderão vir a verificar-se situações complicadas para quem, apesar de continuar com dificuldades financeiras, terá de retomar algum destes tipos de pagamento de créditos.

É neste quadro que, apesar da boa vontade manifestada por partidos políticos e por instituições financeiras, o acompanhamento destes processos por um advogado pode ser imprescindível para evitar situações de abuso e intimidação que, por vezes, surgem, fruto da complexidade das situações e/ou da linguagem usada.

Quer se trate de empresas ou de particulares, este papel quase “social” do advogado pode prevenir muitas dificuldades e custos complementares, permitindo desbloquear, traduzir e antecipar processos que, se não devidamente interpretados e tratados a tempo, podem representar um agravar da situação inicial.

Existe a ideia de que contar com o apoio de um advogado nesta situação será incomportável, mas, dependendo do tipo de situação, esse custo não é necessariamente elevado.

No caso dos particulares, a maioria das pessoas esquece que tem o direito, legalmente consagrado, à proteção jurídica gratuita. Este direito salvaguarda o acesso aos tribunais a todos os cidadãos que provem ter dificuldades financeiras que os impeçam de suportar os custos de processos judiciais ou de processos de resolução alternativa de litígios, bem como de consultar um advogado para orientação legal.

Esse acompanhamento pode materializar-se de duas formas:

(i) Consulta jurídica, isto é, a possibilidade de reunir com um advogado para ter um enquadramento legal de determinada situação, esclarecendo dúvidas. Neste âmbito, poderá ainda solicitar a realização de medidas necessárias para solucionar determinada situação, desde que a sua resolução não implique a necessidade de recurso aos tribunais;

(ii) Apoio judiciário, ou seja, o acesso aos serviços de um advogado, advogado estagiário, solicitador ou agente de execução, com isenção do pagamento dos honorários do mesmo, e o acesso aos tribunais através da dispensa total/parcial do pagamento das custas judiciais (ou o seu pagamento em prestações, caso não haja direito a isenção).

Numa altura em que o fim das moratórias poderá ou não vir a ser adiado, o meu conselho é de que o acompanhamento destas situações por um advogado não o seja, evitando que um processo, que até pode ser de solução simples, se torne numa situação complicada e prolongada.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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