Irão volta a condenar britânica por “propaganda contra o regime”

Marido de Nazanin Zaghari-Ratcliffe acusa Teerão de deter cidadãos como táctica de negociação e acusa Governo do Reino Unido de inércia.

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Richard Ratcliffe tem-se manifestado em protestos e nas redes sociais contra a detenção da esposa, que está detida no Irão desde 2016 ANDY RAIN/LUSA

Um tribunal iraniano anunciou esta segunda-feira a nova sentença da britânica com dupla nacionalidade iraniana, Nazanin Zaghari-Ratcliffe, por “propaganda contra o regime” iraniano, depois de já ter cumprido cinco anos de prisão. A nova acusação contempla mais um ano de prisão e a proibição de sair do país no ano seguinte, avançou o seu advogado à Associated Press.

Quando foi libertada em Março da prisão domiciliária, devido à pandemia – no último ano da pena -, surgiu uma réstia de esperança. Mas foi por pouco tempo: as autoridades iranianas já preparavam novas acusações por Zaghari-Ratcliffe ter participado num protesto junto à Embaixada iraniana em Londres, em 2009, e por falar com uma jornalista da BBC no mesmo encontro.

O advogado de Zaghari-Ratcliffe foi convocado ao tribunal nesta segunda-feira e o marido, Richard Ratcliffe, irá recorrer da sentença nos próximos 20 dias. Não foi claro se Nazanin terá de cumprir a pena na prisão ou em prisão domiciliária, mas não está, ainda, detida, adiantou o marido, citado pela BBC.

Nazanin Zaghari-Ratcliffe trabalhava na Fundação Thomson Reuters, uma divisão da agência noticiosa dedicada a questões humanitárias, quando foi detida em Teerão, numa viagem de férias para apresentar a filha de 22 meses aos pais. Tanto a fundação como Zaghari-Ratcliffe negaram as acusações.

O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, denunciou a nova sentença de prisão, acreditando que Nazanin não deveria “estar lá em primeiro lugar”. Mais: demonstrou o apoio do Governo e anunciou estar a trabalhar com as autoridades norte-americanas, “tal como fazemos com todos os casos de dupla nacionalidade no Irão”, lê-se no Guardian.

Na mesma linha, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Dominic Raab, partilhou no Twitter que a nova pena de prisão é “cruel, inumana e completamente injustificada” e, por isso “deve ser autorizada a voltar para a sua família no Reino Unido”.

“Táctica de negociação”?

O caso ganhou relevância por ter acontecido num período de grande tensão entre o Irão e o Reino Unido. E o novo desenvolvimento do caso acontece noutro contexto relevante: as negociações de Viena para reatar o acordo nuclear de 2015, a que se junta uma dívida britânica por pagar ao Irão.

Devido a uma venda de armas em meados dos anos 1970, Londres deve a Teerão cerca de 460 milhões de euros. Esta dívida é geralmente aceite como o motivo por trás das detenções arbitrárias. Aliás, segundo Richard Ratcliffe, as autoridades iranianas já tinham afirmado à esposa que seria libertada quando o Reino Unido pagasse o que deve. 

A dívida foi confirmada à BBC por um ex-responsável do Foreign Office, Lord McDonald, que afirmou acreditar que Nazanin poderia voltar em breve. Ainda assim, rejeitou a relação entre a dívida e a detenção de cidadãos no Irão.

O Irão voltou também a sentar-se à mesa das negociações de Viena, em que o Reino Unido também participa. Segundo o diário britânico, o Governo de Boris Johnson tem-se mostrado relutante em levantar questões dos direitos humanos no contexto das negociações de Viena, tratando-as como negociações autónomas.

Richard Ratcliffe considera a sentença como um mau sinal, reflexo da inércia do Governo, sendo ao mesmo tempo “uma táctica de negociação” por parte das autoridades iranianas, envolvidas nas negociações nucleares de Viena, disse a BBC.

Segundo o New York Times, várias organizações pelos direitos humanos, incluindo a ONU, e responsáveis ocidentais, acusam o Irão de deter cidadãos com dupla nacionalidade com acusações sem provas. E questionam se as detenções servem de moeda de troca para obter dinheiro ou influência em negociações com países ocidentais - ideia negada por Teerão e Londres.

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