Sócrates preso no seu labirinto

É no PS e no PSD que a partir do poder germinam fulanas e fulanos que se aproveitam dos cargos para atentar contra os interesses da comunidade e agirem criminalmente. E que fazem estes partidos? Calam-se, enredam-se, assobiam para o lado, esperam que pela maré baixa.

Sócrates criou um labirinto do qual parece não saber sair. Em novembro de 2014 foi preso e transferido para a prisão de Évora. A diferença entre aquela prisão e este labirinto é muito grande, pois naquela o seu espaço de vida foi-lhe imposto, era diminuto e controlado; neste, está em liberdade, mas o seu espírito enreda-se, preso em si mesmo, atira-se contra as grades do bom senso e do que é razoável. Vive num mundo onde só lhe chega o eco das suas palavras

Sócrates parece acreditar que, se repetir vezes sem conta que é vítima de uma conjura para o afastar da vida política e que o MP é o braço armado dessa conspiração, poderá fazer reverter a situação jurídica em que se encontra ou justificar as razões dos crimes pelos quais foi pronunciado

Sócrates está de tal forma ensimesmado que já não há fio que o leve ao mundo dos comuns mortais. Eventualmente poderá convencer alguns fiéis. Fará lembrar, no tempo em que havia incorporação militar obrigatória, um juramento de bandeira em que o oficial ordenou aos soldados que virassem à direita e todos viraram, menos um. O pai e a mãe do desalinhado comentaram um para o outro – Que filho, o nosso, é o único que virou certinho.

Os tempos atuais são difíceis para os regimes democráticos, entre outras razões está o descrédito que os governantes criam nas opiniões públicas e que os extremistas aproveitam para medrar. A corrupção é um mal que vai matando a seiva das instruções democráticas. Se um primeiro-ministro aproveita o seu cargo para corromper ou ser corrompido, para falsificar documentos e para branquear capitais suscita na população crítica, desprezo e até ódio. Mas se o visado contra todas as evidências clama no seu labirinto que tudo não passa de um plano para o impedir de se candidatar a Presidente da República, então responsabiliza-se por fazer acrescentar ao desprezo novo desprezo; ninguém gosta de passar por parvo e ser enganado contra todas as evidências.

Sócrates em termos de processo penal é inocente até haver uma condenação com trânsito em julgado. Porém, pronunciado por crimes gravíssimos e despronunciado de crimes de corrupção por prescrição não constituem factos para cantar vitória, nem de molde a exibir uma sobranceria que gera espanto e repulsa nos cidadãos que cumprem as suas obrigações.

Cabe perguntar - Como foi possível que José Sócrates chegasse a secretário-geral do PS? Como pôde suceder que a um partido da importância do PS tenha chegado um homem com este perfil cuja vida esteve associada justa ou injustamente a atividades altamente duvidosas, desde o modo como obteve o seu curso, passando pelo Freeport até à Operação Marquês?

É no PS e no PSD que a partir do poder germinam fulanas e fulanos que se aproveitam dos cargos para atentar contra os interesses da comunidade e agirem criminalmente. E que fazem estes partidos? Calam-se, enredam-se, assobiam para o lado, esperam que pela maré baixa. Os outros pouco fazem. Parece que não se pode mexer na Justiça. Tem de ser assim? Os populistas esfregam as mãos para poderem ser eles os donos da corrupção.

Pena é que a República Portuguesa se mostre incapaz de alterar o que quer que seja para que a Justiça não caia no descrédito sem retorno. A ideia da Justiça é profundamente política, diz respeito ao funcionamento da comunidade, não vive fora da sociedade. É vital para a comunidade. É a garantia da paz social. O Presidente da República, o Ministério da Justiça, os juízes, os procuradores, os advogados, os funcionários judiciais não podem continuar de braços cruzados. Têm de impedir que o processo que envolve um primeiro-ministro e uma mão cheia de expoentes da vida económica dure mais não se sabe quantos anos. Quando é preciso agir para defender um bem essencial da República os que cruzam os braços são responsáveis pelo destino das instituições democráticas.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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