O milagre grego e o doce amargo de Eros

Duas antologias que se unem num mesmo propósito: de trazer até nós alguns dos exemplos mais claros de um milagre, o da poesia grega dos períodos arcaico, clássico e helenístico.

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Eugénio de Andrade, um dos mais notáveis autores da poesia portuguesa, traduz como se escrevesse poesia — a sua com a de outros Fernando Veludo/NFactos

Um pouco à imagem do trono de Afrodite, que brilha na primeira das composições de Safo (na edição de referência), o quadro que a posteridade compôs para Safo foi “variegado” (Poesia Grega, p.77). Vem da própria Antiguidade um notório embaraço para lidar com as diferentes facetas da vida de Safo — que apenas se pode tentar reconstituir e imaginar por trás dos sublimes versos preservados pela tradição. Seu contemporâneo, e também originário de Lesbos, Alceu chamou-lhe “divina Safo” (O Essencial de Alceu e Safo, INCM, 1986, trad. Albano Martins). Quase meio milénio depois dela, era este o louvor de Antípatro de Sídon: “entre as Musas/ imortais como Musa imortal é celebrada a cantar,/ a que Cípris e Eros criaram juntos” (Antologia Grega. Epitáfios. Livro VII, trad. Carlos A. Martins de Jesus, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2019). Mais tarde, Horácio viria a descrevê-la de uma forma que, porventura, traduzirá tanto uma apreciação técnica (versificatória), quanto um preconceito que nos deve lembrar como é antigo aquilo que tantas vezes nos parece um exclusivo dos nossos dias — “viril compõe Safo seus versos” (Horácio, Epístolas, trad. Pedro Braga Falcão, Cotovia, 2017). Não muito depois, Ovídio ficcionava, numa das Epístolas de Heróides as palavras de Safo, onde seguia, implícito, o mais alto elogio: “nem Alceu, meu companheiro na pátria e na lira,/ possui maior glória, por mais grandioso que seja o seu canto” (trad. Carlos Ascenso André, Cotovia, 2016).

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