O processo Marquês e a estabilidade das leis

Afasto com convicção a precipitação de uma nova, mais uma, alteração legislativa por causa da dimensão ou demora na conclusão deste processo – importante, obviamente, mas apenas mais um entre outros tantos.

O Código de Processo Penal português dividiu o processo-crime em três fases. A da investigação, obrigatória, dirigida pelo Ministério Público (MP), que, no caso, deduziu acusação. Seguiu-se a fase de instrução, facultativa e dirigida por um juiz, que pode ser o que interveio em actos concretos da sua competência no inquérito, e pedida por arguidos, com o objectivo de evitar o julgamento, solicitando novas diligências de prova que contradigam e “anulem” o conteúdo da acusação. Segue-se o despacho final daquele magistrado, sufragando, ou não, a acusação. A decisão de hoje. Se acompanhar na íntegra a acusação, o processo segue de imediato para julgamento. Caso contrário, é possível o recurso.

Após trânsito da decisão e remessa do processo para julgamento tem início a fase fundamental e de excelência do processo, o julgamento, balizado pelo despacho de pronúncia ou pela eventual decisão da Relação. Nesta fase, acusação e defesas apresentarão todas as provas recolhidas, que serão discutidas e sujeitas ao contraditório pleno. O tribunal será composto por três juízes e a produção gravada para que, em caso de recurso da decisão final, o Tribunal da Relação possa decidir de facto e de direito. Se a pena aplicada for superior a oito anos ou os recorrentes quiserem discutir apenas matéria de direito, haverá ainda recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

Afasto também, com a mesma convicção, a precipitação de uma nova, mais uma, alteração legislativa por causa da dimensão ou demora na conclusão deste processo – importante, obviamente, mas é um mais entre outros tantos.

Nenhuma reforma ou alteração induzida por um processo concreto resulta a final e num próximo amanhã será necessária nova intervenção legislativa. As leis precisam de estabilidade, de provar a sua eficiência e eficácia, e só então serem objecto de eventual intervenção cirúrgica. Sem dados que sustentem esta minha ideia, Portugal será, dos países europeus, o que mais frequentemente altera, sem a devida ponderação, as leis em vigor.

Em minha opinião, para minorar a demora na aplicação da Justiça haverá, sim, que investir na célere disponibilização, pelo Estado, dos peritos e perícias vitais à investigação e apoio técnico aos magistrados que dirigem a respectiva fase processual; formação específica e aprofundada dos magistrados que optem pela investigação ou pelo julgamento deste tipo de crime; multiplicar o número de juízes no Tribunal Central de Instrução, para garantir a transparência e a independência das distribuições; e ser criado um Tribunal Central de Julgamento preenchido por magistrados voluntários e com formação específica. O juiz que intervier no inquérito, em actos da sua exclusiva competência, não deve poder presidir à instrução do mesmo.

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