Fundação Champalimaud em quarta posição em ranking mundial de inteligência artificial

Na Fundação Champalimaud, a inteligência artificial tem sido muito usada na investigação em neurociências.

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Daniel Rocha

A Fundação Champalimaud ficou em quarta posição no ranking mundial em inteligência artificial das instituições sem fins lucrativos do Nature Index de 2020, anuncia esta sexta-feira a fundação. Num ranking mais geral em que constam todas as instituições ficou em 69.º lugar. Num outro top do Nature Index ao nível da inteligência artificial, a Universidade de Lisboa ficou em 99.º lugar.

O Nature Index mede a produção da investigação científica das instituições em áreas específicas das ciências naturais. Para isso, baseia-se em publicações de 82 revistas científicas de ciências naturais. Os dados são compilados pela Nature Research, que tem como principal publicação a revista científica Nature. Nestes rankings em particular baseou-se nas publicações relacionadas com a inteligência artificial ou com machine learning (aprendizagem automática). 

Concretamente no ranking do Nature Index onde estão as instituições consideradas organizações não-governamentais e organizações sem fins lucrativos ao nível da inteligência artificial, a Fundação Champalimaud ficou na quarta posição. Para isso, teve-se em conta a partilha total de artigos científicos entre 2015 e 2019 (o valor alcançado pela fundação foi 28,07), o número de artigos científicos (52) e a percentagem de artigos com colaborações internacionais (69,2%). À frente da Fundação Champalimaud ficou, por ordem decrescente, a Sociedade Max Planck (na Alemanha), a Associação Helmholtz de Centros de Investigação Alemães e o Campus de Investigação Janelia Farm do Instituto Médico Howard Hughes (nos Estados Unidos). Os resultados deste ranking já tinham sido divulgados no final de 2020, mas apenas agora foram anunciados pela Fundação Champalimaud.

Joe Paton, investigador principal e director do Programa de Neurociência​ da Fundação Champalimaud, explica-nos as razões por detrás da quarta posição no ranking. Primeiro, indica que os algoritmos da inteligência artificial e machine learning têm muitas aplicações. “Estes métodos estão a ser utilizados pelos nossos investigadores com uma frequência cada vez maior”, conta. E exemplifica que têm sido usados desde algoritmos de visão computacional para se caracterizar comportamentos, passando pela análise de grandes quantidades de dados até à bioinformática. “Os nossos investigadores estão a adoptar naturalmente e a desenvolver estes métodos poderosos para aprender mais sobre biologia e como o cérebro funciona.”

Além disso, destaca que as neurociências têm por si só uma ligação crucial com a inteligência artificial. “Os grupos de investigação de neurociência da Champalimaud procuram compreender circuitos neuronais e as bases fisiológicas do comportamento”, sintetiza Joe Paton. “Resumindo, [querem saber] como o cérebro produz inteligência natural. Geralmente, isto envolve a construção de modelos computacionais para descrever quais as operações que o cérebro está a realizar para atingir um certo desempenho comportamental: para apoiar a percepção, para tomar decisões ou para controlar movimentos.”

E que artigos científicos contribuíram para a posição alcançada pela Fundação Champalimaud? O cientista dá alguns exemplos. Um dos estudos foi realizado no grupo de Marta Moita e focou-se na forma como os animais usam pistas sociais para orientar as decisões na resposta a uma ameaça. O trabalho foi publicado na revista Nature Communications e usado um algoritmo para monitorizar o comportamento de drosófilas num grupo.

Já um outro estudo publicado na revista Neuron foi feito no grupo de Zachary Mainen e procurou saber-se como o cérebro infere o estado subjacente do meio envolvente – ou seja, ler nas entrelinhas – com base em informação incompleta. “Tal como nós, os algoritmos de inteligência artificial têm muitas vezes de tomar decisões com base em quantidades limitadas de dados”, frisa Joe Paton. Neste estudo, a equipa mostrou que tanto as pessoas como os ratinhos parecem executar algum tipo de computação para avaliar o estado subjacente do meio que os envolve e que isso está relacionado com o quão gratificante for a recompensa.

Ainda num artigo na revista Cell, que teve a participação das equipas de Bruno Costa Silva e Fátima Cardoso, usou-se machine learning para se classificar perfis de expressão de proteínas de indivíduos com cancro em comparação com pessoas saudáveis. “Este trabalho poderá ajudar-nos a fornecer biomarcadores para o cancro em amostras relativamente fáceis de recolher”, indica Joe Paton. E muitos mais artigos houve, como um sobre como o microbioma dos intestinos interage com necessidades nutricionais para afectar a escolha de alimentos ou como diferentes moléculas e circuitos contribuem para a aprendizagem.

A única portuguesa em top 100 das instituições

num ranking mais geral, concretamente o top 100 das instituições na área da inteligência artificial, a Fundação Champalimaud ficou em 69.º lugar e é a única instituição portuguesa. No top 10, do primeiro para o décimo, estão: a Universidade de Harvard (EUA); a Universidade de Stanford (EUA); o Instituto de Tecnologia do Massachusetts (EUA); a Sociedade Max Planck; a Universidade de Oxford (Reino Unido); a Universidade de Cambridge (Reino Unido); a Academia Chinesa de Ciências; a University College de Londres; a Universidade de Columbia em Nova Iorque; e os Instituto Nacionais de Saúde (EUA).

Joe Paton reforça que a maioria dos artigos que levaram a Fundação Champalimaud a estar neste ranking é na área das neurociências. “A Investigação da Champalimaud tem a concentração mais elevada de grupos a trabalhar em sistemas e neurociências computacionais em Portugal e provavelmente é um dos grandes factores que contribuíram para este ranking”, nota.

O investigador é um dos organizadores de um simpósio sobre inteligência artificial, que se realizará entre 13 e 15 de Outubro, no Centro Champalimaud, em Lisboa. “Este simpósio pretende reunir investigadores de várias áreas da inteligência artificial com cientistas que procuram desbloquear mecanismos subjacentes à função cerebral”, esclarece Joe Paton. O objectivo é então pôr as pessoas a dialogar sobre as sinergias entre as neurociências e a inteligência artificial.

O encontro terá cientistas de instituições académicas e investigadores da DeepMind do Google, dos laboratórios da Intel ou da investigação da Microsoft. Estarão presentes nomes como Manuela Veloso (presidente da secção de inteligência artificial da J.P. Morgan), Jim DiCarlo (que lidera um grupo de investigação no Instituto McGovern do Instituto de Tecnologia do Massachusetts) e Anthony Zador (líder de um grupo no Laboratório Cold Spring Harbor, nos EUA). As pré-inscrições já estão abertas.

Ainda num outro top do Nature Index de 2020 – o top 100 de organizações de investigação em inteligência artificial – a Universidade de Lisboa ficou em 99.º lugar. Neste ranking mediu-se apenas o número total de publicações na área entre 2015 e 2019. A Universidade de Lisboa fez 2870 publicações.

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