Luís Peixoto ensaia um regresso às origens folk com Geodesia

Ligado durante anos aos Dazkarieh, o cordofonista e compositor Luís Peixoto lança esta sexta-feira o seu segundo álbum a solo, Geodesia, com um lote de ilustres convidados.

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Luís Peixoto com o seu bandolim LUIS ANDREAFONT

Depois da aventura semi-electrónica de Assimétrico (2017), o cordofonista e compositor Luís Peixoto volta aos sons acústicos e ao confronto com as raízes em Geodesia, álbum que a partir desta sexta-feira está disponível nas plataformas digitais e em CD.

“Pode ser visto com um regresso às minhas origens, porque eu comecei a ser conhecido com esta música folk, mais acústica e tradicional”, diz Luís Peixoto ao PÚBLICO. Nascido em Coimbra, em 11 de Abril de 1980, cresceu no Algarve e passou três anos e meio na Galiza, depois de tocar seis anos com os Dazkarieh, um dos grupos de que fez parte (outro foi o Stockholm Lisboa Project), antes de lançar Assimétrico, o seu primeiro disco a solo, com a participação de músicos como Quiné Teles, Miguel Quitério ou os Galandum Galundaina.

De toda essa experiência, e também de ter acompanhado músicos como Júlio Pereira, Sebastião Antunes ou Ana Bacalhau, Luís Peixoto foi amadurecendo o caminho que o conduziu a Geodesia, onde, a par de composições próprias como Resiliência, Siga a rusga, Calçadas, Bom descanso, Going over distance, Olost (esta em parceria) ou o tema que dá título ao disco, existem temas tradicionais, por vezes cruzados com outros ou até com originais de sua autoria. “Tenho, em casa, um banco de músicas de recolha de que gosto e a que vou buscar ideias. Neste disco, tentei fazer uma coisa que ainda não tinha feito: juntar várias melodias numa mesma música. Nos grupos de música folk isso é comum, mas ainda é pouco usado nos grupos portugueses. E eu fiz aqui essa experiência. Tenho, por exemplo, uma música minha [Murinheira de Coimbra] que juntei com dois temas tradicionais.”

Ibéria, Finlândia, Cabo Verde

O trabalho deste álbum, embora tenha vários convidados, assenta num trio: Luís Peixoto (bandolim, bouzouki, braguesa, cavaquinho), Ciscu Cardona (guitarra) e Rubén Bada (violino). “Há um ano, eu já tinha tudo pronto para chamar os convidados. Tinha falado com eles um ano antes e comecei a marcar residências artísticas. A primeira foi em Olost, na Catalunha, e por isso é que há um tema com esse nome. Eu já conhecia o Ciscu Cardona do grupo que ele tinha, os Riu, e chamei-o para fazer parte deste projecto porque gosto muito da forma como ele toca guitarra e das ideias que tem. Foi ele que compôs esse tema comigo, na residência. E já conhecia também o Rubén Blada, das tournées há vários anos, na Galiza.”

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A capa do disco

Ao trio juntaram-se, depois, mais três músicos portugueses (Celina da Piedade, acordeão; José Peixoto, guitarra eléctrica; e Catarina Moura, voz) e três galegos (Ricardo Mouriño, tin whistle; Pablo Vergara, bodhrán; e Pedro Fariñas, gaita galega), vindo os restantes de várias regiões de Espanha; além de Cardona e Bada, respectivamente da Catalunha e das Astúrias, participaram Ricard Ros, flautas (Catalunha); Jose Robles, octavilla e alaúde espanhol (Múrcia); e Germán López, timple (Ilhas Canárias). Fora deste universo ibérico, há dois nomes: Esko Järvelä, violino (Finlândia) e Hernani Almeida, guitarra nylon (Cabo Verde).

“A ideia dos convidados surgiu já depois de ter as músicas mais ou menos estruturadas e prontas”, diz Luís Peixoto. “Comecei a pensar no título do disco, Geodesia, na ligação entre pontos terrestres, e achei que fazia sentido convidar outras pessoas.”

O universo ibérico surgiu naturalmente, surgindo o convite a Esko e Hernani de encontros internacionais: “A história do Esko está ligada um pouco aos Dazkarieh, às primeiras tournées que fiz com eles quando fomos a um festival na Estónia. A banda dele, os Frigg, estava a tocar num jardim, e eu gostei logo muito da maneira como tocavam. Depois, voltei a vê-los outra vez na Finlândia, quando fui lá com a banda a que estava ligado na altura, os Stockholm Lisboa Project, e ficámos muito amigos. Há um ano, ele convidou-me para tocar cavaquinho num disco dos Frigg.” Esko disse-lhe que aquela participação não tinha de ser grátis, mas Luis Peixoto preferiu sugerir-lhe uma troca: a possibilidade de Esko gravar num disco seu, o que aconteceu agora.

Quanto a Hernani Almeida, conheceu-o nas residências do Sete Sóis Sete Luas. “Nas residências desse festival, como ele é também produtor e gosta de gravar, além de tocar com muita gente, ganhámos ali uma certa cumplicidade e decidi convidá-lo.”

Atenção aos instrumentais

Geodesia é um disco quase totalmente instrumental, Exceptuando uma faixa, Chula do salto, que conta com a voz de Catarina Moura: “A primeira vez que trabalhei com ela foi nos Realejo, de Coimbra. Mas mais recentemente trabalhámos no espectáculo Fica no Singelo, da Clara Andermatt, eu, o Quiné Teles e ela. E foi aí que a conheci musicalmente mais de perto. A Catarina, tal com a Celina [da Piedade], foram convidadas que eu não tive dúvidas nenhumas que eram perfeitas para estas músicas.” Apesar dos muitos convidados, o disco abre e fecha com temas tocados apenas pelo trio: Volta a trás e Bom descanso, este último “dedicado à Lia e ao Max”, que são os filhos do compositor: “Este tema foi composto a observá-los a dormir, quando eles eram mais pequenos, com o desejo de que eles descansem bem. A minha filha acabou de fazer seis anos e o meu filho tem três anos e meio, mas a música foi escrita há dois anos e meio, quando eles eram mais pequenos ainda.”

Quanto à possibilidade de o disco, por ser quase totalmente instrumental, poder ter uma aceitação no mercado inferior à dos discos com vocalistas, Luís Peixoto não desarma: “Não tenho dúvidas de que um disco instrumental tem muito menos aceitação para o público em geral, talvez porque a voz é mais identificável por qualquer pessoa que não esteja ligada à música. Mas é preciso forçar um bocado, porque temos de contrariar essa tendência.”

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