Animais selvagens podem começar a sair do circo já em 2021

Partidos aprovaram financiamento de 375 mil euros proposto pelo PAN. Inês Sousa Real diz ao PÚBLICO que dificuldades atravessadas pelos circos tornam fundamental antecipar entrega voluntária destes animais.

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Tigres do Circo Mundial Daniel Rocha /Arquivo

O Estado vai transferir 375 mil euros em 2021 para o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) de modo a assegurar o funcionamento do programa de entrega dos animais selvagens de circo. A proposta de lei que inclui este financiamento foi apresentada ao Parlamento pelo partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) e aprovada na terça-feira, com votos favoráveis de Bloco de Esquerda, Partido Socialista, PAN e Chega.

“A ideia era garantir uma verba para o programa de entrega voluntária destes animais e permitir que, já em 2021, os circos possam ter condições para que isso aconteça. Não podemos esquecer o contexto socioeconómico que vivemos: os circos passam por inúmeras dificuldades e imaginamos que possam existir proprietários que queiram antecipar esta entrega de animais”, explica Inês Sousa Real, líder parlamentar do PAN, em declarações ao PÚBLICO.

A mesma proposta apresentada pelo PAN  tinha ainda duas outras alíneas, uma sobre a reconversão dos profissionais do sector e outra sobre a criação do portal nacional de animais utilizados em circo, que ao contrário do financiamento ao ICNF, não foram aprovadas pelos partidos, confirma Inês Sousa Real. 

A lei de protecção aos animais de circo, aprovada pelo Parlamento em Outubro de 2018 e promulgada em Fevereiro de 2019, garante que daqui a seis anos nenhum animal selvagem possa ser utilizado em espectáculos circenses. Os circos portugueses já estão, desde 2009, impossibilitados de adquirirem novos animais e reproduzirem os que possuem, mas ficam agora obrigados a “reformarem” os animais, entregando-os ao Estado. É responsabilidade do Estado transferir estes animais para santuários de vida selvagem ou outras instituições capacitadas para receber os animais.

Após anos de luta e troca de acusações, a grande maioria dos circos deu a luta por perdida, vendendo alguns destes espécimes a circos estrangeiros ou doando-os a parques. A lei de protecção não proibiu a venda destes animais a circos no estrangeiro, tendo sido vários os proprietários que escolheram esta via para não perderem por completo o dinheiro investido nos animais. De acordo com os dados recolhidos pelo PÚBLICO junto do ICNF em Março, são ainda utilizados em espectáculos 22 animais selvagens em Portugal: seis tigres, três leões, dois elefantes, três crocodilos e oito cobras.

A líder parlamentar do PAN não esconde que a verba de 375 mil euros será manifestamente insuficiente para garantir a transferência de todos os animais, mas considera que os animais em situação mais precária possam ser já transferidos pelos proprietários de circo no próximo ano. “Propusemos uma verba de 750 mil euros, apenas conseguimos acordo nos 375 mil euros. Esta verba já consegue pelo menos assegurar a transferência dos animais de um lado para o outro. Não é suficiente, mas é uma grande vitória, porque abrimos finalmente a porta para que os animais de circo tenham um fim de vida mais digno e mais próximo daquilo que é o seu verdadeiro habitat natural”, considera.

A questão da recolocação destes animais – especialmente os felinos e elefantes – não é simples. Não há santuários em Portugal apropriados para os receber, sendo que no caso dos elefantes apenas o Jardim Zoológico de Lisboa tem autorização da Direcção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) para tratar desta espécie. O zoológico já tinha dito ao PÚBLICO que não estaria disponível a receber os elefantes de circo, pelo facto de o espaço reservado a estes animais estar ocupado por um grupo social estável.

Inês Sousa Real considera que esta é uma excelente oportunidade para o país criar projectos-piloto que permitam a edificação de santuários aptos a receber estes animais, pedindo atenção na colocação dos animais. “Temos de olhar para santuários que acolham os animais e não os sujeitem a caça. Muitos dos animais que vão para outros países acabam por ser mortos em contexto de caça. É com muita preocupação que olhamos para isso”, finaliza.

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