Lagarde avisa: vacina não chega para garantir retoma rápida
Presidente do BCE avisa para perspectiva de retoma cheia de paragens e arranques e deixa sinais claros de que se prepara para anunciar um prolongamento das medidas de estímulo monetário, principalmente com mais compras de dívida
As notícias de avanços no lançamento de uma vacina até são “encorajantes”, mas, para Christine Lagarde, não deverão ser suficientes para a zona euro evitar um processo de retoma lento e com muitos sobressaltos, forçando o BCE a prolongar as suas medidas de apoio à economia.
No discurso de abertura da edição deste ano do Fórum do BCE (que em 2020 se realiza através de videoconferência, em vez do habitual encontro na Penha Longa, em Sintra), a presidente do BCE aproveitou para reforçar os sinais que já tinha deixado no final da reunião do conselho de governadores realizada há um mês: o banco central prepara-se para, perante a dificuldade da economia em voltar rapidamente aos níveis anteriores à crise e a persistência de uma inflação muito baixa, repetir em 2021 a maior parte das medidas de estímulo monetárias aplicadas em 2020.
Numa semana em que os mercados reagiram com euforia às notícias de avanços no lançamento de vacinas contra o novo coronavírus, Christine Lagarde começou logo por mostrar que tanto optimismo em relação ao impacto positivo na economia pode não ser justificado. “Embora as últimas notícias sobre a vacina sejam encorajantes, ainda podemos ter de vir a enfrentar ciclos recorrentes de aceleração do contágio e de imposições de restrições à actividade antes duma imunidade generalizada poder ser atingida”, avisou.
A presidente do BCE diz que aquilo que se pode esperar da economia é ainda uma “retoma atribulada”, repleta de avanços e recuos, até porque as características da presente crise, como a penalização sentida pelo sector dos serviços, fazem com que a recuperação possa ser desta vez mais lenta do que em anteriores recessões.
Para além disso, Lagarde disse também que a inflação na zona euro deverá ficar mais tempo em terreno negativo do que aquilo que era esperado, continuando a colocar em causa o cumprimento do mandato do banco central de assegurar uma variação de preços no médio prazo “abaixo, mas próxima, de 2%”.
Neste cenário, não resta ao BCE, sinalizou a sua presidente, outra possibilidade que não seja prolongar em 2021 a política monetária expansionista que tem vindo a aplicar nos últimos anos e, em particular, a partir do momento em que a zona euro foi atingida pela pandemia.
Há um mês, Christine Lagarde tinha afirmado que o banco central iria, na reunião do conselho de governadores agendada para Dezembro, “recalibrar” a sua política de forma a conter os efeitos económicos negativos da segunda vaga da pandemia. Agora, deixou claro que aquilo que deverá vir a acontecer é um prolongamento do programa de compras de activos (principalmente títulos de dívida pública) e a manutenção de condições muito favoráveis na concessão de empréstimos aos bancos comerciais da zona euro.
“Embora todas as opções estejam em cima da mesa, [o programa de compra de activos da pandemia e o programa de empréstimos de longo prazo aos bancos] têm provado ser eficazes na actual conjuntura e podem ser ajustados de forma dinâmica para reagir à evolução da pandemia. Portanto, é provável que estes continuem a ser os principais instrumentos para ajustar a nossa política monetária”, afirmou a presidente do BCE, assinalando ainda que “tão importante como o volume de compras de dívida é a sua duração”, uma declaração que parece apontar para um prolongamento desta medida já na reunião de Dezembro.
Christine Lagarde assumiu que a tarefa da política monetária terá de continuar a ser a de “criar condições de financiamento favoráveis” quer para as famílias e empresas, quer para os Estados. E repetiu os apelos para que estes prolonguem também uma política orçamental expansionista para prolongarem os seus apoios à economia.
“Ao contrário da política monetária, a política orçamental pode responder directamente onde é mais necessário”, disse, num convite aos governos para continuaram a suportar os rendimentos das pessoas e das empresas a operar nos sectores mais afectados.