Investimento directo estrangeiro resiste à pandemia e aposta na indústria

Portugal fechou mais 23 contratos desde Janeiro, 20 dos quais em plena pandemia, e entra no radar dos industriais que estão a repensar a produção pós-covid.

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Um dos contratos de 2020 é uma unidade industrial de canábis para fins medicinais Sergio Azenha (arquivo)

Desde Janeiro, Portugal garantiu 23 projectos de investimento estrangeiro, 20 dos quais já depois da chegada da pandemia. Dois terços estão na região Norte e 40% são projectos industriais novos, o chamado greenfield industrial.

São 445 milhões de euros, mais de 1900 postos de trabalho, em 13 concelhos de Portugal e que sugerem que o Investimento Directo Estrangeiro (IDE) em Portugal ainda não apresenta sintomas da pandemia. Dois desses 23 contratos fechados este ano têm na génese investidores da diáspora portuguesa.

A aposta foi feita em sectores tão distintos como o agro-alimentar, indústria farmacêutica, infra-estruturas e componentes, ou indústrias de mobiliário, madeira e cortiça. Inclui-se aqui calçado, equipamento, uma unidade industrial no sector da saúde (canábis para fins medicinais) e, além dos projectos industriais, houve IDE em serviços na área das TIC, na área financeira, de recursos humanos e procurement.

Na óptica do Governo, Portugal tem “talento”, infra-estruturas e, “desde há alguns anos”, uma imagem de país seguro. São trunfos que, diz o executivo, ajudaram a conquistar industriais que, sobretudo nestes tempos de pandemia, estão a repensar a produção, construindo de raiz em Portugal unidades industriais para darem alternativa ou redundância à cadeia de abastecimento.

Desde 2018, o IDE com apoio público ascende a 3000 milhões de IDE. Em troca, os investidores receberam 500 milhões de euros de apoio público, segundo dados pedidos pelo PÚBLICO. Mas nem todos os investimentos foram apoiados. Metade dos postos de trabalho criados acabou por surgir sem intervenção do Estado. E o impacto total deste esforço de IDE nas exportações é de quase 2700 milhões, isto é, mais de cinco vezes superior aos 500 milhões em contrapartidas públicas.

Alemanha e França no topo

Nestes últimos três anos, França foi o país com mais investimento e criação de emprego em Portugal, seguida da Alemanha e dos EUA.

Em termos de valor, houve 1159 milhões de IDE com apoio público em 2018, 1172 milhões em 2019 e, se se confirmarem as expectativas actuais, ficará pelos 1100 milhões em 2o2o.

Face a anos anteriores, em 2020 regista-se por seu lado uma maior diversidade na origem geográfica dos investimentos. A Alemanha lidera a tabela, quer em número de projectos (quatro) quer em postos de trabalho criados (384), seguida da França e dos EUA. Japão e Canadá têm agora presença mais visível, quiçá por causa dos acordos que a UE assinou com estes países e que facilitam comércio e investimento internacional.

Estes dados do Governo deverão ser analisados hoje na conferência anual da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), dedicada às exportações e ao investimento. Será também um momento de balanço de uma administração cujo mandato terminou no início do ano e que espera que o Governo decida se mantém ou muda a direcção.

A aposta reforçada na indústria ajuda a compreender a apetência de investidores internacionais pela região Norte. Tem maior densidade demográfica na população activa, acesso às rotas de comércio e cooperação com o meio académico. Além disso tudo, ainda pode dar maiores incentivos estatais, quando comparado por exemplo com Lisboa e Vale do Tejo.

“No essencial, é a disponibilidade de mão-de-obra, a ligação aos centros de saber, e as infra-estruturas logísticas que são boas, porque quer o porto de Aveiro quer o de Leixões são boas soluções que se têm vindo a afirmar e com grande ligação e pêndulo com o porto de Sines”, considera Eurico Brilhante Dias, secretário de Estado da Internacionalização, defendendo, em declarações ao PÚBLICO, que perante este quadro a conclusão é a de que “este ano, os resultados aguentam bem o embate da pandemia”.

Trinta concelhos em mira

A comparação com 2019 mostra que, nesse ano, se fizeram 33 contratos de investimento em 12 meses, com investidores de nove países diferentes e que, em nove meses de 2020, estão assegurados 23 contratos com investidores de 12 países.

Tendo em conta que há em carteira mais 89 intenções de investimento (com Portugal na short list em 32 projectos e 25 deles já na fase última de decisão), aquele governante acredita que o IDE em 2020 poderá ficar ao mesmo nível de 2019, eventualmente com uma quebra ligeira de 50 a 100 milhões de euros.

“Temos o pipeline cheio, tivemos muitas decisões durante a pandemia, para ser mais exacto 20 decisões em 23 foram depois de 1 de Março, o que significa que poderemos ainda esperar por mais decisões finais”, estima o secretário de Estado.

Olhando para a carteira de 89 intenções de investimento, há 41 greenfields industriais, 26 centros de serviços e 22 centros de competência/engenharia. São projectos que estão a avaliar localizações espalhadas por cerca de 30 concelhos portugueses e que, se se confirmassem, representariam um investimento estrangeiro de quase 1900 milhões de euros (cerca de 1% do Produto Interno Bruto de Portugal) e quase 11.400 postos de trabalho.

Isso elevaria para 30 mil o número de postos de trabalho criados desde 2018 com base em IDE acompanhado pelo Estado.

Embora admita que “há muita coisa a melhorar” nos custos de contexto e no apoio à economia, o governante acredita que a aposta na transição energética e na transição digital será instrumental para os próximos meses. “A incerteza mantém-se, estima-se uma quebra de 50% do IDE em termos mundiais, a quebra não foi homogénea, mas todos sentiremos o impacto. O que temos de ver é como vamos dar um quadro de maior certeza aos investidores.”

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