Os consensos como vacina contra as crises

O Presidente da República iniciou esta semana uma série de contactos para chegar a uma meta tão difícil como necessária: a de garantir que o combate à actual fase da pandemia se vai fazer com “medidas de consenso”.

O Presidente da República iniciou esta semana uma série de contactos para chegar a uma meta tão difícil como necessária: a de garantir que o combate à actual fase da pandemia se vai fazer com “medidas de consenso” capazes de anular o debate cada vez mais ruidoso entre “sanitaristas” e “desconfinadores radicais”. Avaliando a resposta colectiva que o país deu no primeiro surto da pandemia, em Março, é fácil constatar que a existência desse consenso é fundamental para se atravessar esta etapa que se antevê duríssima. Olhando para o que se passa em Espanha, percebemos que tudo será mais difícil, se os poderes públicos não forem capazes de passar uma mensagem aos cidadãos com o mínimo de coerência e de preocupação com o bem comum. Ainda assim, a tarefa do Presidente vai ser difícil.

E vai sê-lo, porque, em primeiro lugar, num cenário de crises como o que vivemos, é natural que as opiniões, as expectativas, as manifestações de fadiga e ansiedade de cada um se extremem e exaltem. Não se pode pedir uma completa unidade de pensamento e acção para responder à pandemia, quando tantos cidadãos perderam o emprego ou rendimentos, quando se pressente que o Serviço Nacional de Saúde começa a sofrer a preocupante pressão de um aumento da procura, quando se nota que a crise não toca a todos da mesma forma, quando os trabalhadores menos qualificados, de sectores da economia privada mais vulneráveis, são particularmente atingidos. É por isso fundamental procurar uma série de compromissos entre agentes da saúde, partidos e organismos públicos para, ao menos, se traçar uma linha de rumo. As pessoas precisam de um sentimento de solidariedade, confiança e esperança.

Nem sempre vemos isso, infelizmente. O episódio da obrigatoriedade da StayAway Covid, o retrato do Presidente em tronco nu ou as intransigências do Bloco sobre o Orçamento geram mais do que ruído: alimentam a sensação de desnorte, causam perplexidade e dúvidas. Mas não é caso para deprimirmos. Não é caso para sentirmos que vivemos num país sem rei nem roque – basta ver o que se passa na Europa. O Estado funciona, as instituições também, uma parte da economia resiste e os protagonistas políticos não ultrapassaram o limiar da decência no debate democrático. Com o evoluir da crise, porém, a situação vai piorar e as válvulas de descompressão do sistema vão chegar ao limite. Com um pouco de consenso e compromisso, será mais fácil evitar a tribalização sectária na política que as grandes crises sempre proporcionam. É como lutar contra a corrente, mas não há melhor alternativa para resistir ao que aí vem.

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