Contentores dificultam regresso às aulas na EB Teixeira de Pascoaes

A escola abrirá em Setembro num sistema de rotatividade devido às recomendações sanitárias da DGS. As aulas serão no edifício original e os contentores serão usados para as actividades da Componente de Apoio à Família.

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daniel rocha

Os problemas não são de hoje e a revolta também não. Mas com as restrições que a pandemia vai impor no regresso às aulas, as preocupações aumentam. Numa escola que tem funcionado em contentores, como vai ser a partir de Setembro? “O que mais me revolta é a inacção dos órgãos competentes para resolver problemas, no fundo, de salubridade. Debatemo-nos com problemas básicos, de higiene”, diz Catarina Mateus, vice-presidente da Associação de Pais e mãe de dois alunos da escola básica Teixeira de Pascoaes, em Alvalade, Lisboa

Basta andar pelas instalações para perceber a que se refere: o recreio está ocupado por monoblocos com uma cobertura de metal. É aqui que se situam as salas de aula e as casas de banho (apenas duas, para uma escola de 330 alunos). A cobertura foi colocada depois porque os contentores não estavam preparados para o exterior e o calor em excesso ou a chuva a entrar nas salas motivaram a medida. 

O espaço é apertado e cinzento. O que não facilita o cumprimento das recomendações sanitárias da Direcção-Geral de Saúde para o regresso às aulas. A entidade recomendou o distanciamento físico de um metro entre alunos, “sempre que possível”. O problema é esse: há casos em que isso é impossível e muitas escolas vão ter de manter a disposição de dois alunos por carteira. “Não são instruções nem são regras sanitárias, são recomendações sanitárias. O agrupamento, zeloso por isso, tentou implementá-las e percebeu que não há condições aqui para ter as aulas. É preciso aumentar a volumetria, mudar o mobiliário ou encontrar uma solução alternativa. Neste momento, a escola está a decidir-se por um plano B, através de um funcionamento em espelho”, diz Pedro Aparício, que tem uma filha na escola.

O espelho está no edifício original que se mantém de pé uma vez que as obras de modernização foram interrompidas. É aqui que se realizarão as aulas em Setembro, num sistema de rotatividade de turmas. Os monoblocos servirão para as actividades da Componente de Apoio à Família (CAF), que, no caso da Teixeira de Pascoaes, são asseguradas pela própria associação de pais. Enquanto uns terão aulas, outros estarão no CAF, trocando no turno seguinte. Mas o edifício principal também tem vários problemas, visto que não tem casas de banho nem lavatórios.

Em comunicado, a Câmara Municipal de Lisboa (CML) referiu que efectuou vistorias a todas as escolas do município com jardim-de-infância e primeiro ciclo, admitindo que “várias adaptações para garantia de planos de contingência foram realizadas de forma a assegurar a segurança das actividades extracurriculares que lá tiveram lugar.”

CML visitou escola

A escola teve uma visita no dia 28, na qual se levantaram “todas as necessidades urgentes de manutenção, de modo a cumprir todos os requisitos de saúde pública para o início das aulas.” A Câmara assegurou que as intervenções “estarão prontas antes do início do ano lectivo [em Setembro]”.

Na reunião de câmara desta quarta-feira, o vereador da Educação, Manuel Grilo, afirmou que tem estado em “diálogo contínuo” com a associação de pais da Escola Teixeira de Pascoaes e que está marcada para a próxima sexta-feira uma reunião para discutir “in loco o que é possível melhorar e resolver”.​

Nesta quarta-feira ainda há várias crianças a correr pelo recreio. Muitas já se habituaram à situação, e algumas nem conhecem uma escola diferente. A Escola Básica Teixeira de Pascoaes já tem monoblocos desde 2016 mas as obras só começaram no ano seguinte. Iniciaram-se para reabilitar a escola no âmbito do programa Escola Nova, sem descurar o desenho original do arquitecto Ruy Athougia. Num pára e arranca constante, foram interrompidas em Março de 2018, já depois de terem sido feitas algumas demolições, uma vez que a CML entendeu que o empreiteiro estaria a mexer onde não devia, comprometendo a segurança do edifício, e o contrato foi rescindido. Lançou-se outro concurso público após revisão do projecto, que se concluiu com a assinatura de contrato com outra empresa, em Abril de 2020. As obras recomeçaram no dia 13. A empreitada custará 4,1 milhões de euros mais IVA, e a CML prevê a sua conclusão para o último trimestre de 2021.

Já houve quem retirasse os filhos da escola por causas das condições em que se encontra, embora elogiando a parte pedagógica. “Acho que é reconhecido por todos que o ensino nesta escola é de excelência, e o trabalho que tem sido feito pelos docentes acaba por ser a ‘desculpa’ para mantermos os nossos filhos nesta situação. Este agrupamento de escolas é pioneiro no modelo da flexibilização curricular”, conta Aparício. Refere-se a iniciativas da escola, como visitas ao lar de idosos do bairro de Alvalade ou manutenção da horta, que pretendem conferir um sentido de comunidade e de autonomia às crianças.

A palavra de ordem é a resiliência, dos pais e docentes que continuam a insistir na retirada dos monoblocos e na melhoria das condições sanitárias junto da CML e da Junta de Freguesia de Alvalade. Até porque até final de 2021, os filhos continuaram a ter de usar instalações sanitárias deficientes e a brincar num espaço onde as coberturas de plástico se encontram despedaçadas ou em risco de cair e os postes que as seguram estão cobertos de ferrugem. O único bebedouro operacional, de momento interdito devido às restrições motivadas pela pandemia de covid-19, funciona através de um garrafão de plástico prestes a desmanchar-se, suspenso por um cabo. 

Pedro Aparício conta que houve um dia em que um quadro eléctrico explodiu a meio de uma aula. “A sala não tem detectores de incêndio e o quadro eléctrico está ao lado da porta. Se isto tivesse sido um foco de incêndio ninguém saía desta sala, até porque as janelas estão todas com grades”, desabafa. 

Texto editado por Ana Fernandes

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