OCDE: segunda vaga da pandemia pode trazer quebra de 11,3% na economia em Portugal

Com ou sem segunda vaga da pandemia, a OCDE antecipa uma recessão mais forte do que o Governo. Caso haja uma segunda onda de contágios pelo novo coronavírus e necessidade de implementar novas medidas de confinamento, OCDE prevê queda de 11,3% e aumento do desemprego para 13%.

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Nuno Ferreira Santos

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) admite que a economia portuguesa possa cair 11,3% em 2020 e que o desemprego aumente para 13%, se houver uma segunda onda de contágios, antecipando uma retoma lenta da economia e a possibilidade de serem necessárias medidas de apoio adicionais.

No relatório com as previsões económicas mundiais divulgado esta quarta-feira (Economic Outlook), a OCDE considera dois cenários para evolução da economia portuguesa em 2020 e 2021, consoante o país enfrente ou não uma segunda onda de contágios pelo novo coronavírus, sendo que em ambos os casos antecipa uma recessão mais forte do que o Governo.

Num cenário em que considera apenas a onda de contágios verificada na fase inicial da pandemia de covid-19 e as medidas de confinamento então tomadas, a OCDE projecta uma recessão de 9,4% este ano e um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 6,3% no próximo ano.

No cenário macroeconómico que acompanha a proposta de Orçamento Suplementar para 2020, o Governo aponta para uma contracção do PIB de 6,9% em 2020 devido aos efeitos da pandemia.

Assumindo uma segunda vaga da doença e novas medidas de confinamento, a OCDE vê o PIB a registar uma quebra de 11,3% em 2020, seguida de um crescimento de 4,8% em 2021. Neste caso, assinala a OCDE, “a recuperação será mais lenta”, devido ao impacto negativo mais prolongado nas exportações, à maior incerteza, aumento de falências e maior dificuldade de os desempregados saírem desta situação.

Relativamente ao desemprego, a OCDE antecipa que a taxa suba para 13,0% em 2020, registando uma descida para 11,8% no próximo ano tendo em conta o cenário de uma segunda vaga de infecções.

O efeito da pandemia nas exportações será também significativo, com a OCDE a projectar uma queda de 18,5% nas vendas ao exterior, ainda que antecipe que este indicador regresse a terreno positivo no ano seguinte, aumentando 3,5%.

Assinalando que o período de confinamento de cerca de dois meses levou a uma quebra homóloga de 20% da actividade económica, a OCDE sublinha que, apesar de o processo de fim do confinamento ter começado em Maio, a recuperação vai ser lenta e que poderão ser necessárias medidas adicionais, para além das já tomadas pelo Governo e do novo pacote de medidas para a segunda metade do ano, contemplado no Programa de Estabilização Económica e Financeira (PEES).

“Poderão ser necessárias medidas adicionais” sobretudo se houver uma nova vaga de infecções e necessidade de novo confinamento, refere a OCDE, assinalando que a subida do valor pago aos trabalhadores colocados em lay-off permitirá dar maior suporte ao rendimento familiar e substituir outras medidas de apoio, como a dos empréstimos para o pagamento de rendas.

A OCDE defende também medidas que garantam a viabilidade económica das empresas a longo prazo, nomeadamente a concessão de garantias públicas para evitar uma escalada do incumprimento de crédito e a redução de impostos em substituição da actual medida que permite o pagamento faseado de alguns impostos.

A organização avisa ainda que esta crise pode trazer novos riscos para a estabilidade do sistema financeiro. “Uma recuperação lenta poderá desencadear uma onda de falências sobretudo nos sectores mais afectados, com efeitos no sector financeiro, através de uma significativa subida dos rácios de incumprimento, que ainda permanecem elevados”, refere o documento.

Após o excedente orçamental registado em 2019, a OCDE estima agora que Portugal tenha pela frente dois anos consecutivos de forte desequilíbrio, apontando para um défice de 9,5% em 2020 e de 7,4% em 2021 no cenário de uma segunda vaga de contágios e necessidade de novo confinamento. Na ausência de nova vaga da doença, o défice deverá ser de 7,9% este ano e de 4,7% em 2021. Também aqui as previsões da OCDE são mais pessimistas do que as do Governo português que espera um défice das contas públicas de 6,3% do PIB em 2020.

Relativamente à trajectória da dívida pública na óptica de Maastricht (a que conta para Bruxelas), a OCDE espera uma subida do rácio para 139,9% do PIB em 2020 e 137,9% em 2021 (assumindo nova vaga de infecções) ou para 135,9% do PIB em 2020 e 131,4% em 2021 (sem segunda vaga).

Contracção de 11,5% na zona euro em 2020

Quanto à economia da zona euro, a OCDE estima uma contracção recorde que pode chegar a 11,5% do PIB, projectando uma acentuada subida da taxa de desemprego na casa dos dois dígitos e uma subida do rácio da dívida pública acima dos 100% do PIB.

Assumindo que não haverá nova vaga de contágios e necessidade de novo confinamento, a economia da zona euro conhecerá este ano uma recessão de 9,5%, arrastada pela quebra de 9,9% do consumo privado, de 11,6% do investimento e 8,0% da procura interna. É esperado que estes indicadores entrem em terreno positivo em 2021 e que o conjunto das economias que integram a moeda única avance 6,5%.

Segundo a OCDE, a taxa de desemprego aumentará para 9,8% este ano, registando um ligeiro decréscimo para 9,5%, em 2021.

Todos estes indicadores serão ainda mais negativos caso volte a registar-se uma segunda vaga de contágios. Neste cenário, as projecções da OCDE apontam para uma contracção do PIB de 11,5% este ano, seguida de um crescimento de 3,5% em 2021.

Relativamente ao desemprego, a organização liderada por Angel Gurría, projecta uma subida da taxa para 10,3% este ano e novo agravamento em 2021, atingindo 11,0%.

A OCDE acentua que até 2021 os níveis de produção e de emprego se vão manter abaixo dos registados na era “pré-pandemia”, situação que será especialmente agravada em caso de novo foco de contágios e que contribuirá para evidenciar as divergências entre os vários países da zona euro.

Assim, considera que os países devem manter os apoios financeiros e orçamentais até pelo menos 2021, sendo que uma retirada prematura destas medidas terá efeitos negativos nos processos de recuperação.

A OCDE considera positivos e bem-vindos os pacotes de medidas aprovados no âmbito do Eurogrupo e o Fundo de Recuperação de 750 mil milhões de euros proposto pela Comissão Europeia, mas assinala que a ausência de uma resposta efectiva a nível europeu tem feito com que a crise esteja a ser suportada “quase exclusivamente” pelos orçamentos nacionais.

“Uma resposta orçamental conjunta é essencial para apoiar a recuperação”, refere o documento, notando que os países mais atingidos pela crise pandémica são os mesmos que têm menos margem orçamental para lhe fazer frente.

“Subvenções financiadas por emissão de dívida comum aliviariam a pressão sobre os orçamentos nacionais” e contribuiriam para uma “recuperação mais dinâmica”, aponta ainda a OCDE, considerando que seria positiva uma rápida aprovação do programa delineado pela CE.

As projecções da OCDE são mais pessimistas do que as do Banco Mundial, que prevê uma queda de 9,1% da economia da zona euro em 2020 e do que as do Fundo Monetário Internacional (FMI), que aponta para uma quebra de 7,5% em 2020.

Junto das instituições europeias, a Comissão Europeia antecipa uma recessão 7,7% do PIB para a zona euro, e o Banco Central Europeu (BCE) prevê uma queda de 8,7%.

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