Mário Centeno: “Portugal tem hoje as contas equilibradas. Não hipotecamos as futuras gerações”

O Orçamento do Estado para 2020 foi apresentado esta terça-feira de manhã. Portugal terá, pela primeira vez, em 45 anos de democracia, um excedente orçamental, prolongando a tendência positiva a que se tem assistido nas contas públicas durante os últimos anos.

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Entrega da proposta do Orçamento do Estado para 2020 pelo ministro de Estado e das Finanças, Mário Centeno, ao presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues Nuno Ferreira Santos

O investimento no Sistema Nacional de Saúde, o apoio à natalidade e aos jovens que entram no mercado de trabalho e a protecção social de idosos são as prioridades do Orçamento do Estado para 2020, garantiu esta terça-feira à noite o ministro das Finanças em entrevista ao Jornal das 8 da TVI. Quanto às conversações que serão necessárias para conseguir aprovar este orçamento, Mário Centeno disse estar de “espírito aberto” para negociar, mas sem pôr em risco as contas públicas.

“Os efeitos das medidas que temos no Orçamento do Estado geram uma redução dos impostos directos pagos pelos portugueses. Estamos convictos que dirigindo a política fiscal para incentivos à natalidade e à inserção dos jovens no mercado de trabalho, assim como para a valorização das suas qualificações, é a estratégia adequada para promover o crescimento económico português”, começou por referir Mário Centeno, na defesa do documento que hoje apresentou aos portugueses.

O segredo está em criar uma estratégia orçamental adequada e que não seja demasiado ambiciosa, para não correr o risco de incumprimento das metas orçamentais. Mas também é preciso cautela: embora saliente que “o emprego e os salários continuam a subir acima do PIB”, o ministro das Finanças diz manter “uma perspectiva de cautela sobre a dinâmica do PIB”,

Quanto à inflação, Centeno afirma que esta está “ancorada numa lógica de previsão e resposta face ao que é conhecido” e que a taxa de inflação de 1% tem por base o valor da inflação conhecido para 2019. “Quando a inflação for conhecida com novo valor para 2020, utilizaremos esse valor para as actualizações seguintes”, disse, reforçando a “necessidade de as actualizações orçamentais e fiscais utilizarem valores que são conhecidos”.

“É preciso perceber porque é que a inflação é baixa este ano”, afirmou Mário Centeno, lembrando algumas medidas de natureza política e orçamental tomadas em 2019, como a redução do preço dos passes sociais, a gratuidade dos manuais escolares e a redução dos tarifários da electricidade, um “esforço orçamental da administração pública que permitiu a redução da dinâmica de preços em Portugal”, sublinhou.

O ministro das Finanças garantiu ainda que “Portugal tem hoje as contas equilibradas, o que significa que não estamos a hipotecar, em termos de dívida, as futuras gerações”. “Temos um equilíbrio nas contas públicas que nos permite olhar para o futuro”, afirmou.

Quanto a uma possível descida do IVA, o ministro das Finanças não teve dúvidas: “Se esse [800 milhões de euros] fosse o impacto líquido, seguramente” que seria irresponsável. “O país iria pagar esse preço em impostos amanhã e numa penalização das taxas de juro”, afirmou.

Negociações já começaram com “espírito aberto"

Durante a entrevista, o ministro das Finanças garantiu ainda que não ouviu qualquer “repreensão” de António Costa (depois de este ter reprovado o orçamento da zona euro) e destacou a “solidariedade” existente entre os membros do Governo.

Quanto à negociação do OE 2020, disse estar de “espírito aberto” para negociar com a esquerda, não tendo descartado, no entanto, “negociações à la carte” — mas apenas se tais negociações não prejudicarem as contas públicas e as prioridades do Governo. “Num Governo todos somos co-responsáveis pelas decisões. Quando estabelecemos prioridades temos de ser consequentes com isso (…) Só esta noção de solidariedade permitiu aprovar este Orçamento no conselho de ministros em tempo recorde”, afirmou.

Mário Centeno revelou que o processo negocial com os outros partidos já começou e “vai continuar seguramente até à votação final global”. Quanto às pensões, o ministro salientou a existência de “medidas muito claras sobre a redução da pobreza associada aos mais idosos”, nomeadamente o Complemento Solidário Para Idosos (CSI) — instrumento ao qual “o Governo dá prioridade”. O objectivo é, até ao fim da legislatura, reverter a situação de pobreza que atinge, neste momento, cerca de 400 mil idosos em Portugal. No entanto, o ministro não afasta uma possível negociação sobre a troca do aumento do CSI por um extraordinário das pensões. “O CSI é o melhor indicador para o fazer. Mas uma negociação não tem tabus, além da responsabilidade. Com as nossas preferências, mas com o espírito aberto para que encontremos outras soluções”, afirmou.

O essencial será manter as contas públicas. “Da minha experiência, não vejo que desta negociação resulte um risco ou algo que possa alterar a trajectória de consolidação das contas públicas que temos. E também não vejo ninguém com vontade de o fazer”, acrescentou. No entanto, o ministro das Finanças escusa-se a detalhar qual a margem orçamental disponível para uma negociação.

“A construção do OE tem uma lógica que define linhas de acção que devem ser claras e mantidas. Este ano já foram definidas: o Sistema Nacional de Saúde, dimensões de apoio à natalidade e jovens na política fiscal, a protecção social de idosos. Esta é a lógica com que o OE foi apresentado. Para uma negociação à la carte, que não signifique uma alteração desta visão para 2020, estamos obviamente disponíveis, o primeiro-ministro já o disse e, aliás, essa negociação já começou”, destacou Centeno.

A dívida pública, diz, “é o que está por detrás de tudo isto”. Comparando a dívida pública à subida de uma montanha, Centeno afirma que “começamos uma descida controlada”. “Há quem ache que a descida deveria ser maior ou que devíamos parar um pouco para descansar. Mas esta descida alimenta-se a ela própria porque pagamos menos juros e há um ciclo virtuoso que Portugal não pode perder”.

Dirigindo-se a “quem, nesta fase seguinte, tem de fazer aprovar o Orçamento”, Centeno lembrou que “aprendemos a duras penas o que é o preço da irresponsabilidade orçamental e de colocar metas orçamentais que não são alcançáveis”.

Questionado sobre se este seria o seu último Orçamento, Mário Centeno respondeu que “a capacidade de resiliência de um ministro das Finanças não serve só para negociar [um Orçamento] com cada um dos seus pares”: serve também “para executá-lo e agora fazê-lo ser aprovado na Assembleia da República”.

O Orçamento do Estado para 2020 foi apresentado esta terça-feira de manhã. “O orçamento mais rápido da democracia portuguesa” e um “indicador da coesão do Governo”, foi como o ministro de Estado e das Finanças, Mário Centeno, classificou a proposta.

Portugal terá, pela primeira vez, em 45 anos de democracia, um excedente orçamental, prolongando a tendência positiva a que se tem assistido nas contas públicas durante os últimos anos. Além do reforço de 800 milhões de euros na Saúde, há várias medidas contempladas no OE 2020 que vão ao encontro de reivindicações à esquerda e à direita.

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