Nova Zelândia lança plano arriscado para resgatar desaparecidos no vulcão Whakaari
Suspeita-se que os desaparecidos estejam mortos. As autoridades vão tentar recuperá-los, numa operação precipitada pelo “desespero” das famílias. “Muita coisa tem de dar certo para que isto funcione.”
As autoridades neozelandesas vão voltar ao local da erupção do vulcão Whakaari na manhã de sexta-feira para devolver os corpos das vítimas às suas famílias “desesperadas” – apesar do risco de uma nova erupção. O plano para a “recuperação de alta velocidade” das vítimas da erupção vulcânica desta sexta-feira está traçado e foi anunciado esta quinta-feira.
Este regresso à ilha Branca constitui uma mudança de planos: há menos de 24 horas, o aumento da actividade sísmica da ilha ditou o adiamento das operações de recolha dos oito turistas desaparecidos. A recuperação destas pessoas – que a polícia presume estarem mortas, juntando-se aos oito mortos já confirmados – foi dada como “uma prioridade”, mas “para enviar as equipas” é necessário “ter a certeza absoluta de que é seguro”, sublinhou Bruce Bird, comissário da polícia, numa conferência de imprensa em Whakatane, na última quarta-feira.
No entanto, o “desespero” das famílias das vítimas fez com que as autoridades repensassem o arriscado plano, revelou a presidente da câmara de Whakatane, Judy Turner, citada pela BBC e pela Reuters. “A frustração daquelas famílias é completamente compreensível. A ausência de notícias não são boas notícias para estas pessoas.”
Qual é o plano?
Oito especialistas das Forças Armadas neozelandesas vão descer à ilha na sexta-feira de manhã (noite de quinta-feira em Portugal) para tentar recuperar os oito corpos dos turistas ainda desaparecidos. Em Whakatane, a cerca de 50 quilómetros do local do desastre, vão estar vários vulcanólogos a dar indicações em tempo real aos militares que estarão na ilha, detalha o The Guardian.
As autoridades já sobrevoaram a ilha várias vezes e conseguiram identificar o paradeiro de seis corpos – a localização dos outros dois ainda não é conhecida e vai haver “oportunidades limitadas para os encontrar”, declarou Mike Clement, vice-comissário da polícia, aos jornalistas. Os militares vão entrar e sair da ilha tão depressa quanto possível devido ao alto risco que correm. E, no entanto, vão ter de arranjar tempo para recolher o maior número de provas das identidades dos corpos.
O vulcão da ilha Branca mantém-se “altamente volátil”, descreve Clement. As condições meteorológicas, a direcção do vento e o estado do mar também vão ter de colaborar para que o plano chegue a bom porto. “O risco de que vos falei esta manhã [quarta-feira] ainda não passou. Não esperamos que nada mude durante a noite ou amanhã no que diz respeito ao perigo”, disse Clement. “Muita coisa tem de dar certo amanhã para que isto funcione.”
A pressão das famílias falou mais alto, admitiu o vice-comissário. O risco de uma nova erupção pode significar que os corpos fiquem perdidos para sempre. Por isso, Clement diz que o resgate é prioridade absoluta, mesmo que isso implique a destruição de provas.
“Não há ninguém nesta sala com mais vontade de ir para aquela ilha do que a polícia – é este o nosso compromisso com esta comunidade, com estas famílias, eu sei que toda a gente está de olhos postos em nós.”
O que dizem os cientistas?
Graham Leonard, cientista nos serviços geológicos neozelandeses, disse que o equipamento de monitorização vulcânica da ilha ainda está activo — apesar da erupção — e que, nesta quarta-feira, a probabilidade de uma nova erupção se situava entre 40% a 60%. “Hoje ainda é menos seguro do que ontem e o dia anterior.”
O perigo está constantemente a ser avaliado. “Este nível de actividade vulcânica é o mais alto que já observámos desde a erupção de 2016.”
No caso de uma nova erupção, todas as pessoas que estiverem na ilha podem acabar “esmagadas” por rochas projectadas ou apanhadas por gases e fumos cujas temperaturas podem ascender às centenas de graus Celsius, explicou o vulcanólogo Nico Fournier, ouvido pela Reuters.
Na quinta-feira, os gases representavam também um dos maiores perigos para as equipas de resgate.
Maori abrem excepção para resgate
Vários grupos maori, povo nativo na Nova Zelândia, decretaram que o acesso às águas ao largo do vulcão está proibida a visitantes e pescadores desde o desastre. Este tipo de declarações está longe de ser uma proibição formal, mas o seu carácter simbólico faz com que sejam normalmente respeitadas pelos neozelandeses. Os maori abriram uma excepção para as equipas de resgate.
Este tipo de interdições é normalmente aplicada a algumas áreas depois de mortes, acidentes, ou para proteger os recursos naturais de uma área específica.
A primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern, disse que iria lançar uma investigação à tragédia e que iria rever os acessos a locais vulcânicos na Nova Zelândia.
Como estão os feridos?
Estavam 47 pessoas na ilha no momento da erupção, com idades compreendidas entre 13 e 72 anos — 24 eram originárias da Austrália, nove dos Estados Unidos, cinco da Nova Zelândia, quatro da Alemanha, dois da China, dois do Reino Unido e uma da Malásia.
Oficialmente, morreram oito pessoas. Muitos sobreviventes ainda estão nos cuidados intensivos, a maioria com queimaduras em mais de 70% do corpo. As unidades de queimados de diversos hospitais no país estão no limite das suas capacidades (ou perto dele).
De acordo com o jornal neozelandês New Zealand Herald, as autoridades já decretaram a importação de 120 metros quadrados de pele humana dos Estados Unidos e da Austrália de modo a tratar os sobreviventes. A quantidade de pele necessária equivale à que resultaria de 60 doadores. Na Nova Zelândia, apenas cinco a dez pessoas doam pele a cada ano (após a morte).
A erupção vulcânica ocorreu às 14h11 de segunda-feira (mais 13 horas do que em Portugal) e expeliu detritos rochosos, cinzas e uma densa coluna de fumo a 3600 metros de altura. O Whakaari – o seu nome na língua do povo maori – é o vulcão mais activo da Nova Zelândia e quase 70% está debaixo de água (ou seja, apenas 30% se encontra visível), o que faz com que seja uma das maiores estruturas vulcânicas do país. Era um destino concorrido para viagens de um dia — este tipo de passeios trazem mais de 10 mil visitantes por ano à ilha Branca (que é propriedade privada), publicitada como “um dos vulcões marinhos mais acessíveis do mundo”.