Tirar bancos, aumentar velocidade. Como responderam as operadoras ao aumento da procura?

Os passes mais baratos fizeram disparar a procura nos transportes públicos e obrigaram as empresas a procurar estratégias para dar resposta: da retirada de bancos das carruagens ao reforço de horários.

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Getty/Stephen Schildbach

Com a introdução dos novos passes, as transportadoras da área metropolitana de Lisboa e do Porto registaram um aumento do número de passageiros – e das queixas. Para fazer face ao aumento da procura, tiveram de procurar estratégias, como a retirada de bancos para aumentar o espaço para receber mais passageiros em pé ou o reforço de horários.

Mas primeiro, os números. A procura aumentou assim tanto? De acordo com os dados fornecidos pela Fertagus à agência Lusa, “o número de passageiros transportados, medidos através de uma contagem a um dia útil de Maio, cresceu 19,2% face às contagens realizadas em 2018, sendo que os períodos de ponta cresceram 16% e fora das pontas 26%”. “A taxa de ocupação global do comboio cresceu de 22% para 26% e, no período de ponta da manhã, a taxa de ocupação subiu de 56% para 63%”, acrescentou.

Ainda a Sul, os Transportes Sul do Tejo (TST) não avançam com números, mas admitem que se tem “verificado um aumento de procura com especial incidência em algumas linhas específicas, suscitando por parte da TST em articulação com a AML, adaptações de oferta com o objectivo de dar resposta”, refere a administração da empresa em resposta ao PÚBLICO.

Segundo dados da Transtejo/Soflusa, as duas empresas que garantem a ligação fluvial entre as duas margens do Tejo, em Abril de 2019 foi registado um aumento de 8,3% na procura, face ao mês homólogo do ano de 2018,

Em Lisboa, também o Metro destaca que este ano tem verificado um aumento de passageiros face aos mesmos períodos do ano passado: comparando o mês de Abril de 2019 com o de 2018, a procura cresceu 4,4%, de mais de 13,3 para 13,9 milhões de passageiros transportados. “Este aumento é significativo, tendo em conta que, em 2019, as férias da Páscoa abrangeram 2 semanas e 1 dia de Abril (8 a 22 de Abril), enquanto em 2018, as férias da Páscoa apenas abrangeram 1 semana de Abril (26 de Março a 6 de Abril)”, avalia a empresa em reposta ao PÚBLICO.

Com a diminuição do preço dos passes aumentou a procura em todas as linhas e na maioria das estações: “Os aumentos identificados estão directamente relacionados com os novos passes sociais. A linha onde se verificou o maior acréscimo na procura foi na linha azul com um acréscimo de 9,6%”, revelou a empresa ao PÚBLICO.

Na Carris, os resultados ainda provisórios dos primeiros quatro meses deste ano revelam um aumento global de passageiros com títulos válidos de 5,6%, de 41,5 milhões para 43,8 milhões. “No corrente ano, o número de passageiros da Carris subiu, tendo no primeiro trimestre de 2019 alcançado um crescimento acumulado de 5%. A alteração tarifária veio também contribuir nos últimos dois meses para um crescimento mais acelerado da procura, registando-se assim no final de Maio uma variação positiva acumulada (Janeiro a Maio) na ordem dos 7%”, respondeu a administração da Carris, ao PÚBLICO. 

Metro de Lisboa retira bancos e aumenta a velocidade de circulação

O Metropolitano de Lisboa já tinha algumas carruagens a circular com menos bancos – eram duas unidades triplas – mas agora quer alargar esse número para as dez unidades triplas (ou 30 carruagens), para aumentar o espaço para passageiros em pé.

“Presentemente, encontram-se em serviço de exploração duas Unidades Triplas (3 + 3 carruagens) em que foram retirados alguns bancos para criação de um espaço multiusos. Este espaço pode ser utilizado para transporte de crianças em cadeirinhas de bebé e/ou transporte de volumes, situação cada vez mais habitual. Está previsto criar esse espaço multiúsos em mais 10 Unidades Triplas (30 carruagens)”, avançou a transportadora ao jornal económico Eco.

“Actualmente, o aumento de oferta tem-se verificado suficiente face ao aumento de procura que se tem registado”, acrescenta a administração do Metropolitano de Lisboa em resposta ao PÚBLICO. Salientando “a implementação dos novos horários de comboios, que ocorreu em meados de Abril nas linhas Amarela, Vermelha e Azul, às horas de ponta da manhã e da tarde”, e “o aumento da velocidade para 60 km/h”, a empresa admite que "sempre que se verificarem variações significativas na procura, mesmo que pontuais, a oferta será adaptada”, como em eventos culturais e desportivos.

Esta oferta será reduzida no período de Verão nas linhas Azul e Amarela, mantendo-se nas linhas Verde e Vermelha, que dão acesso ao Aeroporto. Em meados de Setembro, o Metro prevê “um aumento de oferta nas linhas Amarela e Azul na hora de ponta da manhã aos dias úteis”.

Metro do Porto reforça oferta

A Norte do país, também a Metro do Porto registou uma subida da procura. O crescimento acumulado em 2019 (até ao final de Maio) é de 8%, com uma acentuação após a entrada em vigor do Programa de Apoio à Redução do Tarifário dos Transportes Públicos (PART).

Para fazer face a esta procura, a Metro do Porto diz ao PÚBLICO que tem vindo a efectuar alguns reforços pontuais da oferta, “sobretudo com um aumento da capacidade de transporte”. A utilização de veículos duplos é uma das medidas adoptadas pela empresa para impulsionar o número de passageiros transportados.

A Metro do Porto confirmou ao PÚBLICO a intenção de adquirir mais 18 veículos, que irão circular nas novas rotas da empresa. A linha rosa [entre a estação de S. Bento e a Casa da Música] e o prolongamento da linha amarela [Santo Ovídio até à urbanização de Vila d’Este, em Gaia] vai servir 50 mil novos passageiros por dia.

Por outro lado, a Metro do Porto tem disponibilizado maior número de lugares em pé nos veículos. Ao retirar os assentos junto das portas, a empresa admite aumentar a capacidade das composições, mas garante que as modificações pretendem, também, facilitar os movimentos de entrada e saída dos passageiros. Apesar de não estar directamente relacionada com o aumento da procura promovida pelos passes sociais — visto ter sido inicialmente adoptada em 2005 —, a verdade é que a Metro do Porto planeia fazer estas alterações a mais 20 veículos da frota, perfazendo, no total, 60 veículos com esta disposição.

Mais recentemente, a Metro do Porto estreou um veículo experimental (o MP 001), com os assentos dispostos em posição longitudinal. O feedback dos clientes não foi inteiramente positivo, com muitos passageiros a pedirem à empresa para acrescentarem mais pontos de apoio para os passageiros. O design será repensado e um novo protótipo construído. A empresa tenciona colocar o novo veículo em circulação no último trimestre de 2019.

Fertagus também diminui número de bancos

A Fertagus alterou igualmente algumas carruagens para diminuir o número de bancos e aumentar o espaço para passageiros em pé. Nas carruagens alteradas, há menos lugares sentados e, para os substituir, foram instalados varões e barras horizontais para os passageiros se apoiarem. O objectivo é criar bolsas de descompressão junto à entrada dos veículos para que as pessoas não se acumulem ali e se espalhem mais pelo interior da composição.

Cristina Dourado, administradora da Fertagus, disse ao PÚBLICO, no final de Maio que cada composição terá menos 112 lugares sentados e mais 160 de pé, ganhando assim 48 lugares no total.

A Fertagus está ainda a adaptar um novo horário para os comboios e a estudar a possibilidade técnica de utilizar comboios com uma quinta carruagem — uma medida que “implicará alterações no tamanho das plataformas de algumas estações e que nunca poderá ser operacionalizada em menos de dois anos”, sublinha a administração da empresa em resposta à agência Lusa.

Em entrevista ao Jornal de Negócios, na sexta-feira, o secretário de Estado Adjunto e da Mobilidade, José Mendes, relativizou o impacto das mudanças. “Aumentam um pouco a oferta e os comboios aguentam perfeitamente. A viagem é curta. Já experimentou fazer uma viagem de metro em Londres? O tempo que demora e vai tudo em sardinha em lata... Não se vai pôr pessoas em cima dos comboios. As pessoas não andam de pé no autocarro? São viagens curtas, com durações até meia hora. As pessoas vão apertadas nos metros em todo o mundo”, disse José Mendes.

TST e Carris reforçam carreiras

Questionada pelo PÚBLICO, a administração da TST afirma que o aumento da procura ainda está a ser monitorizado e confirma que “as carreiras que têm como destino Lisboa” são cada vez mais procuradas.

Para fazer face a esta situação, a empresa “procedeu ao reforço de oferta nalgumas carreiras, com particular expressão em carreiras que asseguram a ligação da zona da Moita a Lisboa”, que têm sido as mais procuradas com a introdução dos novos passes.

“Desde o passado dia 27 de Maio, foram acrescentadas 17 novas circulações diárias em hora de ponta, com cadências de 10 em 10 minutos, por forma a satisfazer o aumento da procura verificado”, termina a empresa.

Já a Carris realçou, em resposta ao PÚBLICO, que já se verificou um aumento “da frequência de passagem dos equipamentos, do prolongamentos das carreiras a zonas com um potencial de procura mais elevado, quer ainda pela extensão do serviço de algumas carreiras aos fins-de-semana e feriados”. Exemplos disso foram as carreiras 728, 15E, 732, 736, 748, 750, 753, 778 e 716.

A Área Metropolitana de Lisboa, que pensou e implementou as novas modalidades de passes Navegante, “está a desenvolver (em fase adiantada) o desenho da futura rede de transportes rodoviários em toda a AML, prevendo-se um aumento muito significativo da actual oferta”.

No entanto, esta mudança não será para breve: neste momento, estão a ser preparadas as “peças formais para promover o concurso público internacional que permitirá a futura concretização desta ambição”, diz fonte da AML, em resposta ao PÚBLICO. Mas alerta que “um concurso desta natureza e amplitude impõe não só estudos e trabalhos demorados mas também, tem procedimentos que obrigam a prazos demorados e impedem a sua concretização no imediato”.

Transtejo, Soflusa e CP falam em “constrangimentos” operacionais e de recursos humanos

Em resposta à Lusa, a Transtejo/Soflusa admite um aumento da procura, no entanto a administração sublinha que “os actuais constrangimentos operacionais e de recursos humanos inviabilizam o reforço da oferta do serviço público de transporte fluvial, em especial nos horários de ponta”.

Da parte da CP, ainda não há dados disponíveis relativamente ao impacto do Programa de Apoio à Redução Tarifária, trabalho a ser desenvolvido na área metropolitana de Lisboa “entre os vários operadores”.

A empresa ferroviária diz ao PÚBLICO acompanhar a “evolução da procura dos seus serviços, no sentido de efectuar eventuais ajustamentos da oferta”, mas refere que a resposta está sempre condicionada aos “recursos humanos e materiais disponíveis”.

A CP prepara-se para reduzir o número de comboios a circular na Linha de Sintra, entre 23 de Junho e 7 de Setembro. “No período de Verão são, habitualmente, implementadas alterações à oferta na Linha de Sintra, que decorrem das alterações de procura, que se reduz em alguns percursos, no período de férias escolares”, justifica a empresa. Durante esse período, os comboios “circularão com uma frequência de dois comboios por hora, mas mantém-se o número de lugares oferecidos, uma vez que esta família de comboios circulará em dupla”.

“Estão identificados alguns problemas que não foi ainda possível resolver, em particular, nos serviços de transporte de elevada capacidade (ferrovia e fluvial)”, admite fonte da Área Metropolitana de Lisboa, questionada pelo PÚBLICO. Os problemas destes operadores “são estruturais e não têm uma possibilidade de resolução total de forma imediata (aumento da frota de comboios e barcos, entre outros)”, admite a mesma fonte. Apesar disso, “todos os intervenientes têm estado empenhados em encontrar soluções”.

Notícia actualizada às 15h20 de quinta-feira com declarações do Metropolitano de Lisboa.

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