Como vão os partidos captar votos nas europeias?

As ideias com que os partidos com assento no Parlamento Europeu vão convencer os eleitores a dar-lhe o voto. Da proposta de uma Universidade da União à repetida ideia de sair do euro e rasgar tratados.

Pedro Marques (PS)
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Pedro Marques (PS) LUSA/MIGUEL A. LOPES
Paulo Rangel (PSD)
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Paulo Rangel (PSD) Rui Gaudencio
Nuno Melo (CDS)
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Nuno Melo (CDS) Nuno Ferreira Santos
João Ferreira (CDU)
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João Ferreira (CDU) Nuno Ferreira Santos
José Inácio Faria (MPT)
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José Inácio Faria (MPT)
Marisa Matias (BE)
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Marisa Matias (BE) LUSA/PAULO CUNHA

Há seis partidos portugueses com mandato no Parlamento Europeu - PS, PSD, CDS, CDU, MPT e Bloco de Esquerda - e já todos delinearam as estratégias para captar votos durante a campanha eleitoral. O PS quer ir a Bruxelas vender a receita que o Governo aplicou em Portugal. O PSD e o CDS, a duas vozes, vão insistir que o executivo desperdiçou fundos europeus e que foi um "mau negociador". A CDU não abdicará de defender o corte na dívida e a saída do euro. O MPT repesca a ideia do Livre de uma Universidade da União. E o Bloco vai bater-se por uma Europa que imponha mínimos regulatórios na protecção aos direitos laborais. Afinal, o que querem os partidos?

PS leva novo contrato social à Europa

Na grande convenção nacional do PS sobre as europeias não foi só anunciado que Pedro Marques seria o cabeça de lista do partido às eleições de 26 de Maio. Também se ensaiou o discurso e a mensagem que o partido vai valorizar durante o período da campanha eleitoral. “A campanha do Partido Socialista às eleições europeias terá um eixo essencial: propor um Novo Contrato Social para a Europa”, repete agora, ao PÚBLICO, o ex-ministro Pedro Marques.

A intenção dos socialistas é levar para Bruxelas e para Estrasburgo a ideia de que havia, afinal, uma alternativa à austeridade. “Podemos pois dizer à Europa que as políticas que foram implementadas em Portugal deram resultados”, defende Pedro Marques. E acrescenta: “Temos de partilhar com todos os resultados desta boa esta experiência, para que fique ainda mais evidente que o caminho é romper com a perspectiva neoliberal que nos últimos anos prevaleceu nas instituições europeias”.

Emprego e combate à precariedade, igualdade de género, serviços públicos de qualidade e protecção ambiental são alguns dos temas concretos que se incluem nessa nova agenda que os socialistas querem ver discutida na sequência das eleições europeias.

“Em toda a Europa, e também em Portugal, são necessárias políticas de criação de emprego, de combate à precariedade e de reforço da igualdade, incluindo a de género. É preciso assegurar serviços públicos de qualidade e uma protecção ambiental efectiva”, assume o número um da lista do PS.

Para Pedro Marques, a “implementação destas políticas vai depender da opção por uma Europa mais solidária, que só o será se afastarmos definitivamente a política de austeridade das instituições europeias”.

O ex-ministro do Planeamento sublinha ainda que “quando nem a Europa acreditava que era possível, o Governo português implementou um contrato de confiança com os portugueses que acabou com as políticas de austeridade, ao mesmo tempo que gerava mais emprego e diminuía as desigualdades”. E, sem esquecer as metas e a credibilidade do país, conclui: “Com contas certas, ano após ano”.

PSD quer combater o desperdício dos fundos europeus 

Pela terceira vez cabeça de lista às europeias pelo PSD, Paulo Rangel vai incidir no desperdício dos fundos europeus – tal como o CDS-PP – até porque o candidato do PS é o ex-ministro Pedro Marques que tinha a tutela desta pasta. Essa foi a farpa lançada assim que Marques foi apresentado como o número um do PS às europeias. O ex-ministro de António Costa foi também governante de José Sócrates e isso não deverá ser esquecido pelo PSD nem pelo CDS. O fantasma do ex-primeiro-ministro poderá estar de volta à campanha da direita, tal como aconteceu em 2014, quando PSD e CDS se apresentaram juntos às europeias.

Para já, Paulo Rangel colou a Pedro Marques o rótulo de “mau negociador” por causa do próximo quadro comunitário e isso deverá repetir-se nos próximos meses. É que, segundo o PSD, Portugal arrisca a perder 7% dos fundos de coesão enquanto noutros países do Sul da Europa, como Espanha ou Itália, verifica-se um crescimento desses apoios. Rangel não deixará de apontar as duas caras ao PS, uma que fala grosso em Bruxelas e outra que não consegue manter os fundos de coesão para Portugal. Se o CDS lançou na pré-campanha o tema dos impostos europeus para reiterar ser totalmente contra, Rangel aproveitou, assim que foi apresentado como cabeça de lista, para mostrar que o PSD sempre se opôs a essa ideia. O tema deverá rondar a campanha.

Com ou sem Rui Rio por perto – ainda não se sabe qual a participação do líder na campanha – Paulo Rangel enfrenta um teste à sua popularidade e à do partido, tendo como pano de fundo o cenário do pós-legislativas de Outubro.

CDS critica desaproveitamento dos fundos

O CDS-PP vai insistir na crítica ao “desaproveitamento” dos fundos comunitários, apontando como exemplo o do Mar 2020 (com uma execução de 17%), o da ferrovia (9%) e os do segundo pilar na PAC (perto de 30%). “É uma vergonha para Portugal”, critica o cabeça de lista do CDS. Os impostos europeus, que o CDS lançou na pré-campanha das europeias e contra os quais se tem batido, não sairá da agenda. Até porque os centristas vêem uma divergência face ao PS e também ao PSD. O partido liderado por Assunção Cristas assume ser europeísta e não federalista – demarcando-se de PSD e PS. “Os dois partidos estão juntos no federalismo e querem impor medidas como o fim da unanimidade em política fiscal”, sustenta o vice-presidente do partido liderado por Assunção Cristas. Nuno Melo quer mesmo colocar o CDS como o “único” partido “europeísta e não federalista”. 

Na campanha, Nuno Melo promete trazer a lume a questão do princípio da subsidiariedade, que estabelece a intervenção da União Europeia em domínios dos Estados-membros quando os objectivos sejam melhor alcançados. Para o eurodeputado essa intervenção deve acontecer em áreas como a PAC e a protecção civil, “no respeito pelo mosaico que é a União Europeia”.

Nuno Melo, que também é candidato às europeias pela terceira vez consecutiva, elege a questão das listas transnacionais como um tema de campanha, uma solução que chegou a ser defendida pelo PS, e que implicava que as candidaturas de cada país incluíssem políticos de várias nacionalidades da mesma família política.

CDU insiste em cortar a dívida, sair do euro e rasgar tratados

A CDU vai repetir a receita de 2014, com João Ferreira à cabeça da lista, para tentar repetir – e de preferência melhorar – a eleição de três eurodeputados. Os temas fundamentais que os comunistas e os ecologistas levam para a campanha eleitoral também não são muito diferentes – sobretudo porque o cenário não mudou nestes cinco anos. Renegociar a dívida, estudar uma eventual saída do euro e acabar com o Tratado Orçamental são algumas das propostas que se vão ouvir com insistência.

Apesar de o discurso crítico do euro ter sido uma constante a longo dos anos na CDU, só nas legislativas de 2015 é que o tema da saída de Portugal do euro chegou ao programa eleitoral da coligação. Em Dezembro passado, João Ferreira afirmava ao PÚBLICO que este é um assunto que deve ser debatido e referendado em Portugal. A ideia é preparar cuidadosamente o processo, com um estudo sobre as medidas que visem a transição para uma nova moeda, a estabilidade do comércio externo e da banca, assim como o funcionamento da economia. Depois de desenhados os vários cenários, os portugueses seriam chamados a votar sobre a saída ou permanência na moeda única.

Depois de em Novembro do ano passado a dívida pública ter atingido um novo recorde de 251,48 milhões de euros (antes do pagamento antecipado de uma nova tranche ao FMI), os comunistas ficaram com argumentos acrescidos para insistir na renegociação da dívida. Só de juros, Portugal paga anualmente tanto quanto custa o SNS – 9000 milhões de euros – não se cansa de dizer Jerónimo de Sousa. Por isso, a CDU quer um corte de 50% no valor nominal da dívida, o alargamento dos prazos, a redução das taxas de juros e a redução em pelo menos 75% dos encargos anuais.

Para os comunistas, os diversos tratados que foram construindo a União Económica e Monetária apertaram sucessivamente o garrote à soberania dos Estados-membros e o Tratado Orçamental é a cereja no topo do amargo bolo europeu que não permite a cada país investir onde e quanto entende. Por isso, defendem a revogação dos tratados, de forma a que cada país volte a ser soberano sobre as suas políticas económicas e financeiras – incluindo as relativas aos níveis de investimento, de produção nacional e controlo dos sectores estratégicos.

MPT defende a criação de Universidades da União

O Movimento Partido da Terra (MPT) elegeu dois deputados nas últimas europeias, tendo ficado à frente do Bloco de Esquerda e perdido um dos mandatos desde então –​ Marinho e Pinto desvinculou-se do MPT e passou a ocupar o cargo como não inscrito. 

Como partido que defende o aprofundamento da integração de Portugal na Europa, o MPT apresentou algumas das suas ideias concretas para a União Europeia no XI Congresso Extraordinário de 30 de Junho. No âmbito cultural, científico e tecnológico, uma das propostas é a "fundação de Universidades da União", uma ideia defendida pelo Livre e aqui repescada pelo MPT. Outra é a criação de "um tribunal internacional de trabalho e comércio que se imponha aos actuais limitados mecanismos arbitrais".

Expressões como solidariedade activa, equidade e igualdade de oportunidades, paz ou cooperação entre os povos farão parte do discurso do MPT. "O MPT considera que, a nível europeu, estes são objectivos fulcrais se se pretender, de facto, reaver recursos suficientes para assegurar um futuro estável a todos os cidadãos europeus e novas possibilidades de futuro para as próximas gerações", assume no programa o partido que ainda não tem, porém, um candidato.

Ao PÚBLICO, o presidente da Comissão Política Nacional do MPT esclareceu que o partido chegou a indicar como cabeça de lista às próximas eleições para o Parlamento Europeu o actual eurodeputado José Inácio Faria. Seguiu-se, contudo, uma “retirada da confiança política pela Comissão Política Nacional do MPT”, “pelas posições políticas individualistas, nalguns casos até opostas às dos órgãos competentes para as emitir, e sempre à revelia da vontade relevante e democraticamente formada do partido”. Luís Vicente explicou ainda que “compete à Comissão Política Nacional do MPT iniciar o processo de apresentação de listas, coisa que ainda não aconteceu”.

BE: trabalho, serviços públicos e ambiente

Não são apenas estas, mas as prioridades que ocupam o topo das preocupações dos bloquistas são os direitos laborais, o investimento nos serviços públicos e o ambiente. Insistem em políticas laborais que promovam, no espaço europeu, o crescimento dos salários e a contratação colectiva e querem investimento nas energias renováveis.

José Gusmão, número dois da lista, explica ao PÚBLICO que o programa do BE foi construído “em torno da ideia de que a União Europeia (UE) não se coordena nas áreas mais importantes em que devia ter políticas integradas”.

O trabalho é uma delas. Para Gusmão, “a zona euro, por causa da forma como foi construída, limita” alguns “instrumentos de política económica” e fomenta a “competitividade entre Estados-membros”, provocando uma “corrida para o fundo em termos de salários e legislação de trabalho”. Para combater estas políticas o Bloco defende a necessidade de se “acordar mínimos regulatórios na protecção aos direitos laborais”, contrariando, por exemplo, o recurso ao outsourcing, ao falso trabalho independente e ao trabalho informal. “A UE deve impedir que os Estados-membros concorram uns com os outros através de modalidades cada vez mais selvagens de exploração no trabalho”, diz Gusmão.

Outra prioridade diz respeito aos serviços públicos. José Gusmão considera que a UE “tem exercido pressões” no sentido do seu “desmantelamento” e que as “as restrições ao investimento público" e “à contratação de funcionários públicos” têm acontecido “mesmo quando não estão em causa ajustamentos” do défice. “Essas pressões devem deixar de existir”, diz, lembrando que o BE insiste na revogação do Tratado Orçamental e do Pacto de Estabilidade e Crescimento.

O ambiente é outro tema que não será esquecido. A prioridade é a descarbonização da economia e a transição energética. O que o BE defende é que se “mude a agulha” no que toca ao investimento energético, ou seja, que se acabe com os apoios a projectos na área das energias fósseis e se aposte nas renováveis, apoiando projectos e investigação na área.

Notícia alterada, com declarações de Luís Vicente nas quais se esclarece o processo de retirada da confiança política a José Inácio Faria que deixa, por isso, de ser o candidato às europeias do partido.

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