A formiguinha Marques e o Marques parlapatão

É um sinal dos tempos – e dos estilos políticos em voga – que António Costa tenha preferido o perfil de Pedro Marques ao de Maria Manuel Leitão Marques para encabeçar a lista das europeias.

Paulo Rangel, Nuno Melo, João Ferreira e, pela primeira vez, Pedro Marques: os principais cabeças de lista portugueses às próximas eleições europeias – respectivamente pelo PSD, CDS, PCP e PS – não representam partidos ou movimentos populistas e propõem-se ser mesmo o seu contrário, mas um idêntico e belicoso estilo retórico a puxar para a propaganda, a demagogia ou a crispação ideológica parece decalcado das cartilhas do populismo onde a agressividade verbal tende a impor-se à substância e racionalidade do debate político. Pretendem encarnar posições antagónicas ou em disputa acesa umas com as outras (sobretudo no combate entre as direitas e as esquerdas), mas, no fundo, há neles um gosto comum pelas guerras politiqueiras do alecrim e da manjerona.

Foi a esse estilo que se rendeu António Costa quando se tratou de escolher o novo cabeça de lista do PS às eleições que irão decorrer sob o signo de um populismo em crescendo ameaçador através da União Europeia. Com efeito, Pedro Marques distinguiu-se como o ministro mais palavroso e propagandístico do Governo socialista, registando o contraste mais espectacular entre a obra anunciada e a obra efectivamente realizada – entre o anúncio de empreendimentos miríficos de modernização do país e o triste saldo de projectos ciclicamente adiados ou só levados a cabo de forma minimalista, à imagem e semelhança de uma ferrovia e uns comboios em avançado estado de degradação.

É de facto um sinal dos tempos – e dos estilos políticos em voga – que António Costa tenha preferido o perfil de Pedro Marques ao de Maria Manuel Leitão Marques para encabeçar a lista das europeias. Curiosamente, ou talvez não, fora Maria Manuel e não Pedro Marques quem Costa presenteou com a já célebre “vaca que voa”. Aquilo que foi um gesto de reconhecimento bem-humorado – dirigido a uma ministra tão discreta quanto empreendedora e eficaz nas tarefas de simplificação e modernização administrativa do país – poderia ser interpretado como um prémio de humor negro e ironia cruel se o seu destinatário fosse um ministro conhecido pela profusão de palavras e a escassez de obras como é o caso de Pedro Marques. Mas o facto de Costa ter acabado por preferir, na hierarquia da lista europeia, o ministro parlapatão à ministra com obra feita é a indicação mais expressiva da forma como o chefe do Governo interpreta as prioridades da nossa relação com a Europa: mais ruído e espectáculo do que trabalho perseverante mas porventura menos exposto à agitação mediática. Veremos, porém, na hora da verdade da atribuição dos fundos europeus quem será capaz de apresentar os dossiers mais sólidos – se a formiguinha Marques se o Marques parlapatão.

Na quinta-feira passada, dia em que era divulgada uma espalhafatosa entrevista de Pedro Marques ao PÚBLICO e à RR, este jornal publicava um artigo de opinião de Teresa Sá e Melo (“A despromoção de uma óptima ministra”) em que a autora desabafava, a propósito de Maria Manuel Leitão Marques, ser “irritante vê-la substituída por um ministro com menos peso político e que ficou conhecido pelas acções de marketing aplicadas ao investimento público. Dá vontade de não votar em tal lista!”. Não é preciso ser feminista como a autora do artigo para partilhar da sua irritação. Para além da prevalência suspeita dos critérios machistas – que o PS supostamente quer combater –, é a natureza dos critérios políticos que está em causa, sobretudo quando em Portugal e na Europa urge dar novos sinais de revitalização desses critérios – e dos valores de civilização que lhe devem estar associados.

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