PSD-Madeira e Marcelo estão de costas voltadas, por causa de Costa

Funchal exige uma intervenção de Belém no contencioso da região com a República, e já não poupam nas críticas ao chefe de Estado.

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Marcelo com Albuquerque em Porto Santo, numa visita do Presidente ao arquipélago da Madeira em Novembro de 2018 Homem de Gouveia/Lusa

Os dedos de uma mão já não chegam para contar as vezes que Marcelo Rebelo de Sousa já visitou a Madeira desde que chegou a Belém. Três vezes em 2016. Duas no ano seguinte. Outras três em 2018. Em todas, a cumplicidade com o governo madeirense foi notória, extravasando mesmo a mera cordialidade institucional. Mas esse estado de graça de Marcelo no arquipélago, pelo menos no que toca ao PSD e ao executivo regional, parece ter chegado ao fim.

O primeiro sinal de descontentamento foi dado numa entrevista de Miguel Albuquerque ao PÚBLICO, no final de Janeiro. Perante as queixas, insistentes, de que o primeiro-ministro estaria utilizar o aparelho de Estado para se intrometer-se na política do arquipélago em benefício do PS local, a pergunta foi no sentido de saber se estas preocupações teriam sido levadas a Belém.

A resposta do chefe do executivo madeirense, e presidente do PSD-Madeira, foi curta e directa. “O Presidente da República não chegou à política anteontem. É um político experiente que sabe exactamente o que se passa.” No dia seguinte, no encerramento do XVII Congresso Regional social-democrata, Albuquerque voltou a verbalizar o desencanto do partido para com Marcelo Rebelo de Sousa. Agora, mais incisivo.

É tempo, disse então o líder do PSD-Madeira, de o Presidente da República tomar uma posição sobre "esta pouca vergonha". “Nós votamos para o Presidente da República, não para tirar selfies, mas para salvaguardar as instituições democráticas”, afirmou, pedindo a Marcelo para fazer cumprir a Constituição da República. “Os madeirenses merecem ser considerados e tratados como portugueses de corpo inteiro”, insistiu, repetindo a narrativa que tem habitado nos últimos meses o discurso dos social-democratas regionais sempre que falam para Lisboa.

“É intolerável e é inaceitável que, por razões de ordem política, este Governo das esquerdas continue a discriminar os madeirenses. É inaceitável e é eticamente reprovável que este Governo, por razões partidárias, continue a confundir as suas funções institucionais com funções partidárias”, criticou Albuquerque.

O PSD madeirense esperava uma intervenção de Belém que ajudasse a encerrar os vários dossiers que, argumentam, dependem da República. O financiamento do novo hospital; a revisão do subsidio social de mobilidade; os juros da dívida contraída pela região junto do Estado; a continuidade territorial por via marítima: tudo temas que governo regional e PSD acusam António Costa de estar a bloquear em Lisboa, para fragilizar Albuquerque em ano de eleições regionais. Tudo temas que têm acompanhado a dialéctica política entre Funchal e Lisboa, e a que se juntou um episódio recente.

A comemorar os 600 anos da descoberta do arquipélago, a Madeira tinha a expectativa de que as comemorações do 10 de Junho decorressem na região, até porque no ano passado a data foi celebrada nos Açores. A Assembleia Legislativa da Madeira formalizou mesmo o pedido a Marcelo no início de Janeiro, mas Belém quis falar primeiro com Costa antes de decidir.

A decisão, sabe-se, foi de dividir as comemorações entre Portalegre e Cabo Verde, o que não agradou ao Funchal que viu nesta opção mais uma interferência do primeiro-ministro e uma concessão de Belém a António Costa.

“O Presidente da República, uma vez por outra, pense que a Madeira também faz parte de Portugal”, reagiu uns dias depois José Prada, secretário-geral do PSD-M, numa intervenção no parlamento madeirense em que não poupou Marcelo. “Quanto ao Presidente da República já nada me espanta”, afirmou o deputado, acusando Marcelo de estar mais preocupado em “passear de camião” e andar em “jogos de bastidores” a pensar na reeleição, do que com a Madeira. Era bom, pediu, que o Presidente visitasse a região autónoma para “comemorações”, em vez de só nas “desgraças”. Uma referencia às várias visitas que o Presidente da República efectuou à região autónoma na sequência dos incêndios de 2016 e da queda da árvore no Monte, no ano seguinte.

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