UGT critica ministra da Saúde por pôr em causa o direito à greve

Carlos Silva, da UGT, diz que Marta Temido fez “um desabafo irresponsável” e acusa o Governo de estar a bloquear as negociações com os sindicatos, não só na Saúde, mas também na educação.

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ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

O secretário-geral da UGT, Carlos Silva, considera que a ministra da Saúde fez “um desabafo irresponsável” quando falou da possibilidade de existir um “abuso” de direito na greve cirúrgica. “Era o que faltava! Eu até tenho afinidades com o partido do poder, mas isso não me inibe de combater, de forma incontornável, a posição que a ministra revelou e que é inaceitável do ponto de vista da democracia”, disse Carlos Silva, à saída de uma audiência com o Presidente da República.

Carlos Silva referia-se às declarações de Marta Temido na entrevista à RTP na noite de terça-feira, na qual admitiu, sem detalhes, “equacionar outras alternativas de resposta e, eventualmente, meios de reacção jurídicos” em relação à nova greve cirúrgica marcada para todo o mês de Fevereiro. “Em última instância, esta greve, que já enfrentámos antes e que nos preparamos para enfrentar outra vez, convoca para uma reflexão sobre questões éticas, deontológicas e sobre o exercício do direito à greve”, observou, ressalvando que não está em causa a legitimidade das reivindicações.

“Não é por causa da greve cirúrgica dos enfermeiros que há centenas de camas de doentes nos corredores dos hospitais”, retorquiu Carlos Silva, rejeitando que o ónus da responsabilidade de qualquer greve recaia sobre os trabalhadores ou os sindicatos. “Lamento muito que atinja os mais frágeis, mas a culpa não é dos sindicatos nem dos trabalhadores. A culpa é de quem é um mau patrão. Se é preciso uma greve cirúrgica para dizer ao Governo que nós não abdicamos de lutar, então que se faça a greve”, afirmou.

Para a UGT, o grande problema do país hoje é a conjugação da degradação dos serviços públicos com “alguma inabilidade – ou habilidade determinada – da parte do Governo em cortar todas as vias de diálogo social”. O Governo, acusa Carlos Silva, “não quer sentar-se à mesa das negociações” – em particular no caso dos professores – e parece querer “levar este desgaste até às eleições e depois das eleições também”.

“Não é a atitude que esperamos de um Governo de esquerda, apoiado pela esquerda no Parlamento”, lamentou o sindicalista. Que questiona a intenção do Governo: “Quer afrontar o movimento sindical todo porquê? Manter o clima de conflitualidade social? Desgastar os sindicatos? E depois vai negociar com quem? Os coletes amarelos, as redes sociais, os movimentos inorgânicos? O Governo tem de decidir o que quer fazer”, rematou.

CGTP: “Governo não está a resolver o problema”

O líder da CGTP alinha pelo mesmo diapasão. “Quando se obriga um sindicato a ir para a greve, é porque a outra parte – a patronal – não está a resolver o problema”, afirma Arménio Carlos. Na sua opinião, a questão que se deve colocar é por que razão existem neste momento tantas greves: “É que durante dois, três anos, os nossos sindicatos da Administração Pública andaram a apresentar propostas, a disponibilizar-se para programar no tempo resposta a essas propostas, e até hoje, na maioria dos casos, isso não aconteceu."

Referindo-se em concreto aos professores, o sindicalista sublinha que há abertura para fasear a contabilização integral do tempo de serviço e nem se está a pedir retroactivos: “É apenas a partir de 2025, ou 2026, tudo bem, mas é preciso que o Governo se sente e mostra abertura, porque este braço de ferro não nos leva a lado nenhum."

Questionado sobre a ameaça do Governo perante a greve dos enfermeiros, Arménio Carlos afirmou que “não tem que se rever a lei da greve, o que tem de se rever é a forma do Governo se relacionar com os sindicatos para resolver os problemas”. Mas, tal como Carlos Silva, não se quis pronunciar sobre a forma de financiamento desta greve, que é posta em causa pela tutela.

CIP: “Uma sociedade crispada não evolui”

O Presidente da República recebeu esta quinta-feira os parceiros sociais em mais uma ronda de audiências regulares e um dos temas em cima da mesa foi a conflitualidade social crescente. Um assunto que também preocupa a Confederação Empresarial de Portugal (CIP), como reconheceu António Saraiva após a audiência em Belém. “Uma sociedade crispada não evolui”, afirmou o presidente da CIP, apontando responsabilidades ao Governo por ter elevado demasiado as expectativas e não ter capacidade de dar resposta: “Só podemos prometer tudo a todos se tivermos condições de cumprir essas promessas, e o país não tem."

António Saraiva recomendou, por isso, “sensatez” ao Governo, para “não prometer o que não pode cumprir”, mas também aos trabalhadores, para “não exigirem aquilo que é impossível alcançar”. Para encontrar essa sensatez e razoabilidade, o remédio é “diálogo e concertação social”.

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