Governo garante que não tem capacidade para ir mais longe nas negociações com os enfermeiros

Em entrevista à RTP3, Marta Temido falou sobre o impacto da greve dos enfermeiros marcada para esta quinta-feira, a mortalidade infantil e a aprovação da nova Lei de Bases da Saúde.

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Nuno Ferreira Santos

Depois de cerca de cinco horas de reunião, esta quarta-feira, entre a ministra da Saúde e representantes do Ministério das Finanças, onde as negociações não chegaram a bom termo, Marta Temido garantiu que o Governo não tem capacidade para ir mais longe para chegar a um entendimento com os enfermeiros. A afirmação foi feita esta noite durante uma entrevista à RTP3.

Questionada sobre a sua reacção ao avanço da greve marcada para esta quinta-feira, Marta Temido garantiu que o governo tem feito ao longo dos últimos meses um esforço de aproximação às reivindicações dos enfermeiros, tal como a redução do horário para as 35 horas e o aumento do salário (entre 2011 e 2015 passaram dos 1020 para os 1200 euros, salário mínimo da carreira de enfermagem).

A ministra da Saúde afirmou que não é possível fazer alterações na grelha salarial (os enfermeiros reivindicam um aumento para os 1600€) uma vez que foram contratados novos profissionais e “foi mais além com os descongelamentos, para transitar profissionais que não estavam posicionados”. 

Marta Temido garante que a prioridade é reforçar o número de efectivos no sistema e aumentar a qualidade, o que também “eliminará o burnout de que muitos profissionais se queixam”, disse. “Não é possível fazer um reposicionamento que implique um aumento de 400 euros para um grupo de 42 mil indivíduos”, rematou.

Questionada sobre o encerramento das negociações com os enfermeiros, Marta Temido garantiu que “não há margem para conseguir mais aproximação” neste tema em concreto, uma vez que é “o futuro do SNS que está em causa para cumprir as exigências de alguns”. Contudo, sublinhou que “isso não quer dizer que não haja um conjunto de outros temas que teremos de discutir”.

Sobre os efeitos da adesão à greve desta quinta-feira, a responsável pela pasta da saúde apelou aos enfermeiros para que não se esqueçam "do caminho que foi percorrido e para terem esperança que o futuro não acaba hoje”. Marta Temido garantiu que não desvaloriza o impacto da greve ou o problema que tem em mãos, mas incumbe ao Governo responder a dois problemas: os utentes e a sustentabilidade dos serviços públicos e diz que “não pode fazer escolhas que ponham em causa estes aspectos”.

A ministra da Saúde avançou que até ao momento foram canceladas cerca de 7500 cirurgias, mas 45% destas já foram realizadas e outras tantas estão agendadas para Março, o que, diz Marta Temido, mostra que o SNS "tem capacidade de responder a este problema". 

No entanto, a ministra afirma que uma nova greve trará ainda mais dificuldades aos hospitais e pondera pôr em prática tentativas de resposta com meios de reacção jurídicos. "Convoco a uma reflexão séria sobre questões éticas e deontológicas. Não está em causa o direito à reivindicação, mas o Estado não pode ficar capturado pelo exercício de um direito", disse. 

Aprovação da Lei de Bases da Saúde

Sobre as negociações para a aprovação da nova Lei de Bases da Saúde e o veto de Marcelo caso esta seja aprovada apenas pela esquerda, a Ministra da Saúde afirmou que “não tem nenhum estigma com nenhum partido político, logo não faz diferença por quem seja aprovada”. No entanto, afirma que não gostava que se mantivesse na lei o apoio do estado ao sector privado em concorrência com o público porque não acredita que é o melhor para os portugueses, apesar de garantir que o sector privado tem um papel importantíssimo. 

Marta Temido garantiu ainda que "não será por causa da lei de bases da saúde que todos os problemas se vão resolver" e que a capacidade de atracção dos médicos para o serviço público terá de aumentar. Uma das hipóteses seria regular a permanência dos médicos após a sua formação. "Os médicos não deviam poder sair dos hospitais públicos durante algum tempo, mas não é nada que se possa fazer sem uma avaliação, é uma hipótese. Proibir nunca é o melhor caminho e uma coisa é a permanência após a formação, outra coisa é a dedicação exclusiva”, disse.

Sobre a corrida às urgências das últimas semanas, a ministra da Saúde afirmou que 45% a 50% dos portugueses que recorrem às urgências recebem uma pulseira de prioridade baixa, o que quer dizer que “poderiam ser atendidos noutro sítio e com menos riscos, mas é difícil fazer essa transição de um modelo cultural”.

Marta Temido garante que todos os anos são feitos planos de contingência com o apoio da DGS e redigidos um conjunto de orientações envolvendo hospitais e centros de saúde, mas o problema persiste porque os cidadãos continuam a acorrer às urgências em número excessivo, quando poderiam ser tratados noutro local ou recorrer à linha Saúde 24. “Não podemos considerar que um pico de afluência é um pico de rotina ou de ruptura. As emergências têm linhas de entrada próprias, não deixam de ser atendidas”. 

A ministra da Saúde afirma que está “não está tudo bem no SNS e há um caminho a fazer”, mas o objectivo passa por fazer cada plano de contingência melhor que o outro para que os próximos governantes não tenham os mesmos problemas. 

"Causas multifactoriais e demográficas"

Sobre a mortalidade infantil, a Ministra afirmou que o Governo ainda não recebeu a validação dos números por parte do Instituto Nacional de Estatística e que a questão está a ser estudada. Marta Temido avançou que existiram mais 60 óbitos que em 2017, um total de 289 no ano passado. “A DGS está a fazer essa pesquisa, mas provavelmente serão causas multifactoriais e demográficas. Também é preciso perceber onde ocorreram estes nascimentos e em que tipo de estabelecimento, porque podemos estar a falar de mães imigrantes, por exemplo, que não foram acompanhadas”.

Hospital de Braga deverá ficar nas mãos do SNS

Marta Temido falou ainda sobre as dívidas total em atraso dos hospitais aos fornecedores que se situam nos 486 milhões de euros e sobre o retorno do Hospital de Braga à gestão pública.

A ministra afirmou que foi o parceiro privado a dizer que o negócio não era “rentável" e que, como tal, “não podem pedir ao governo que cometa uma ilegalidade que é não submeter a concorrência o contrato e alterá-lo. O que temos em cima da mesa é que o parceiro privado em Braga entendeu que nas actuais condições não lhe era possível continuar a explorar o hospital. A ministra não pode fechar o hospital e por a chave atrás da porta”, salientou. 

A ministra salientou ainda que o Governo tentou ir ao encontro do parceiro privado “o máximo possível, dentro dos condicionalismos legais”.

Questionada sobre se ficou surpreendida pelo convite de António Costa para a pasta da saúde, Marta Temido afirmou que “para alguém que nunca foi político profissional ou ligada a partidos é uma coisa imprevista, mas fui chamada para cumprir o programa do governo e assegurar que o que foi feito anteriormente continua a ser feito e entregue no final com os melhores resultados possíveis”, disse.

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