Bactéria que destrói oliveiras chegou a Portugal através de plantas ornamentais

Apesar de Portugal manter desde 2014 um programa nacional de prospecção da bactéria, ela surge ano e meio depois de ter aparecido num olival na província espanhola de Alicante.

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Nuno Ferreira Santos

A bactéria Xylella fastidiosa, que ataca oliveiras e amendoeiras, era há muito temida. Já rondava Portugal há algum tempo, mas agora chegou, concretamente a Vila Nova de Gaia, “à boleia” de plantas do género Lavandula, planta ornamental vulgarmente conhecida por “lavanda”, mas que não apresentam sintomatologia da doença. Porém, a sua presença em território nacional é o suficiente para deixar muitos produtores assustados.

Desde que a bactéria foi detectada pela primeira vez na Europa, na região da Apúlia (Itália), província de Lecce, afectando uma vasta área de olival, que a sua presença nos olivais portugueses era esperada com grande apreensão.

A sua chegada a Portugal foi detectada pelos serviços da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), que identificaram na cidade nortenha “plantas portadoras da bactéria Xylella fastidiosa”. A amostra foi colhida pelos serviços da Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Norte no âmbito do Programa Nacional de Prospecção de X. fastidiosa, referem aqueles serviços através de comunicado.

A análise positiva foi obtida pelo Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) e confirmada pelo Laboratório Europeu de Referência (ANSES), aguardando-se informação relativamente à estirpe da bactéria. A DG Sante (Direcção-Geral da Saúde e Segurança Alimentar da Comissão Europeia) foi já informada da situação e a DGAV está a preparar a respectiva notificação fitossanitária Europhyt. As autoridades nacionais desencadearam já todas as acções recomendadas, tendo em vista a identificação e contenção da situação, asseguram em comunicado.

O local de colheita da amostra foi já inspeccionado por uma brigada mista de técnicos da Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Norte e da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária, que “procederam ao levantamento da situação e à colheita de amostras, tendo sido determinada a destruição das plantas”.

O comunicado publicado na página da DGAV salienta que os trabalhos de levantamento de plantas sensíveis num raio de 100 metros (denominada “zona infectada”) e a respectiva colheita de amostras “vão prosseguir ao longo dos próximos dias”. Em paralelo com esta operação vai ter início o processo de identificação da flora sensível ao agente bacteriano num raio de cinco quilómetros (considerada “a zona tampão”), que será levado a cabo em colaboração com o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) e com as câmaras municipais de Vila Nova de Gaia e de Gondomar. Será também divulgado um edital referente à zona demarcada, constituída pela zona infectada e pela zona tampão, identificando a área em causa.

Face à evolução da situação, foi entretanto aprovada e publicada a Decisão de Execução (EU) 2015/2417 da Comissão Europeia que lista géneros e espécies hospedeiras identificadas como susceptíveis às subespécies da bactéria detectada no território da União Europeia. Estas espécies “só podem circular na União Europeia desde que acompanhadas de passaporte fitossanitário, quer tenham sido ou não provenientes de zonas demarcadas”.

Resta agora apurar se as plantas de lavanda, portadoras da bactéria Xylella fastidiosa, entraram em Portugal com ou sem passaporte fitossanitário.

Alentejo apreensivo

As consequências mais dramáticas da chegada da bactéria Xylella fastidiosa a Portugal podem surgir sobretudo no Alentejo, onde estão concentradas dezenas de milhões de oliveiras, amendoeiras e outras árvores de fruto que são o habitat ideal para a propagação de uma praga que já preocupa os olivicultores alentejanos, sobretudo os que exploram grandes áreas de olival intensivo e superintensivo.

Portugal tem levado a cabo, desde 2014, um programa nacional de prospecção anual desta bactéria, que até há poucos dias não tinha sido assinalada em território nacional.

O género Xylella, identificado por Wells et al. (1987), é composto por uma única espécie, a Xylella fastidiosa. A espécie inclui várias estirpes e caracteriza-se por um crescimento lento em meios de cultura.

As colónias crescem em meios artificiais, a 26-28°C, a pH entre 6, 5-6, 9, podem ser lisas ou rugosas, opalescentes e circulares. É uma bactéria vascular que vive no xilema das plantas, sendo transmitida por insectos.

De acordo com trabalhos de sorologia e tipagem genética, as suas estirpes foram divididas em cinco subespécies: Xylella fastidiosa subsp. piercei (que escolhe estirpes de videira), Xylella fastidiosa subsp. sandyi (loendro), Xylella fastidiosa subsp. multiplex (vários hospedeiros), Xylella fastidiosa subsp. pauca (que inclui ameixeira, cafeeiro e citrinos) e a Xylella fastidiosa subsp. tashke, que foi identificada na chitalpa (Chitalpa tashkentensis) uma árvore ornamental.

Os deputados do CDS emitiram um comunicado em que questionam o ministro da Agricultura, Capoulas Santos, sobre a informação que já foi recolhida sobre a estirpe da bactéria encontrada em Vila Nova de Gaia e qual o plano de contenção da doença previsto pelo Ministério da Agricultura face à situação.

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Os centristas recordam, através de comunicado, que “a 6 de Julho de 2017 o partido já tinha questionado o ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural a propósito de um primeiro surto de Xylella fastidiosa numa plantação de amendoeiras, em Guadalest. Este foi o primeiro foco da bactéria detectado na Península Ibérica, depois de a sua presença ter sido registada nas ilhas Baleares, em 2016”.

Em resposta às questões então colocadas pelos deputados do CDS-PP, o gabinete do ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural deu então conta das medidas tomadas para a identificação da perigosa bactéria e fez referência à elaboração e publicação do Plano de Contingência da Xylella fastidiosa e Seus Vectores. O processo foi iniciado em Junho de 2016 e para 2017 foram programadas 625 inspecções e a colheita de 500 amostras, frisando que o programa das acções de monitorização “poderia vir a sofrer alterações em função de eventuais desenvolvimentos que entretanto ocorressem”.

Contactada pelo PÚBLICO, a porta-voz do Ministério da Agricultora confirmou a presença de “plantas portadoras da bactéria Xylella fastidiosa” em Vila Nova de Gaia, “mas sem sintomatologia da doença”, acrescentando que Portugal iniciou em 2014 um “programa nacional de prospecção anual” desta bactéria.

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