Júlia recusava morar com a família. O fogo encontrou-a sozinha em casa

Filha, netos e bisnetos eram presentes na vida da centenária. Mas Maria Júlia fazia questão de ficar na sua casa. Um incêndio roubou-lhe a vida.

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Nelson Garrido
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André Rodrigues
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Em Outubro de 2018, Maria Júlia Casanova, já viúva, completava 100 anos rodeada pela família – uma filha, netos e bisnetos. Há muito que os familiares insistiam para que ela se mudasse para casa da filha mas, independente que era, Maria Júlia fazia finca-pé. Nunca aceitou sair. Na manhã desta sexta-feira um incêndio que começou no seu quarto tirou-lhe a vida. 

A centenária vivia há mais de 60 anos num prédio da Rua da Alegria, em frente à entrada do Centro Comercial La Vie, onde funciona o Mercado Temporário do Bolhão. Era ali que queria morrer, comentava uma vizinha e amiga. Maria Júlia ainda mantinha uma vida autónoma e todos as manhãs, com a ajuda da muleta, fazia o caminho até à Capela das Almas para rezar. 

A afeição à casa onde passou boa parte da vida era grande. Há pouco tempo, Maria Júlia até tinha pintado o rés-do-chão da já antiga e degradada habitação. Era sobretudo no primeiro andar, onde tinha o seu quarto, que passava os dias. Ali teria um braseiro e um cobertor eléctrico. A vizinhança desconfia que um dos dois possa ter originado o incêndio. Porém, a investigação, que foi entregue à Polícia de Segurança Pública (PSP) depois da Polícia Judiciária (PJ) se ter dirigido ao local e afastar a possibilidade de um crime, ainda não era conclusiva.

A vítima era a única no prédio quando o incêndio – que não alastrou nem aos restantes pisos da habitação nem aos edifícios contíguos – deflagrou no seu quarto, no primeiro piso. 

Carlos Amaral estava no Centro Comercial La Vie, em frente à habitação, quando sentiu o cheiro a queimado e se dirigiu, imediatamente, ao exterior. Ao perceber o que acontecia alertou o Batalhão de Sapadores Bombeiros do Porto que não tardaram em chegar, “cerca de 10 minutos depois”, garante. Segundo a testemunha, um homem terá dado “um pontapé na porta de baixo, mas já não conseguiu entrar porque o fumo era muito e os vidros das janelas ainda partiram com a força do calor”.

Era Óscar Silva, trabalhador naquele espaço comercial, que também passava no local e se apercebeu do fumo que saía da janela do primeiro piso. "Fui buscar uma mangueira aqui em frente, arrombei a porta e ainda tentei subir, mas não consegui por causa do fumo. As labaredas propagaram-se muito rapidamente." 

Dominado em 20 minutos, o fogo envolveu nos trabalhos 13 operacionais e três viaturas dos bombeiros, uma delas com grua. O corpo de Maria Júlia foi encontrado carbonizado junto à janela do seu quarto, onde ainda terá tentado pedir ajuda. O comandante Carlos Marques garantiu que o prédio ficou “sem condições de habitabilidade” depois do incêndio, embora a estrutura não tenha sido afectada. 

O trânsito ficou condicionado na Rua da Alegria durante toda a manhã. Perto das 12h45 o corpo foi removido do prédio para a delegação do Porto do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses.

Texto editado por Ana Fernandes

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