Propostas contra especulação imobiliária ficam pelo caminho

Propostas do BE e PSD para travar especulação imobiliária foram chumbadas. Só avança proposta do PS para isentar mais-valias da venda da casa dos reformados que invistam em contratos de seguros.

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Teresa Leal Coelho, do PSD, gere as votações LUSA/MÁRIO CRUZ

Foi o voto de um chumbo anunciado. Depois de muita controvérsia inicial, as propostas do Bloco de Esquerda e do PSD para mudar a forma como são tributadas no IRS as mais-valias imobiliárias foram rejeitadas no Parlamento, na votação do Orçamento do Estado (OE) na especialidade.

Com o chumbo, fica para já tudo como até aqui – o que significa que o IRS vai continuar a incidir sobre metade do valor das mais-valias (já deduzido das despesas e encargos), sem haver taxas diferenciadas em função do tempo em que os contribuintes retêm um imóvel.

A proposta do PSD foi desenhada depois de o líder dos sociais-democratas, Rui Rio, afirmar ainda em Setembro que a ideia do BE de combater a especulação imobiliária não era uma iniciativa “assim tão disparatada”. Já aí o PS – e António Costa – tinham enjeitado a iniciativa dos bloquistas e até esta terça-feira nada mudou. E tanto a proposta do BE como a do PSD ficaram pelo caminho.

O que passou, no IRS das mais-valias, foi uma iniciativa do PS para que os pensionistas ou os cidadãos com mais de 65 anos fiquem isentos de IRS sobre as mais-valias, caso invistam o ganho com a venda da casa num contrato de seguro ou adiram a um fundo de pensões aberto.

O que defendia PSD e BE

O PSD propunha escalonar a percentagem das mais-valias sujeitas a IRS, para beneficiar quem detém os imóveis por mais tempo, passando, por exemplo, a exigir IRS sobre 75% do ganho para quem revendesse a casa entre um e dois primeiros anos; para quem detivesse o imóvel entre dois e 15 anos não haveria qualquer alteração, mas para quem o mantivesse entre 15 e menos de 30 anos haveria uma redução do imposto para metade (o IRS iria aplicar-se a 25% da mais-valia).

Já a proposta do BE também definia o valor do IRS em função do tempo durante o qual uma pessoa detém o imóvel, mas com vários escalões ao longo dos primeiros 12 anos. Por exemplo, quem só detivesse até um ano pagaria IRS sobre 75% do ganho; de um a dois anos, a percentagem considerada era de 74%; de dois a três anos, baixava para 73%, recuando até estabilizar nos 50% se a pessoa ficasse com o imóvel durante mais de 12 anos.

Escalões sem mudanças

Outra proposta na área fiscal que ficou pelo caminho foi a actualização dos limites dos escalões do IRS à taxa de inflação esperada para o próximo ano, em 1,3%. A iniciativa do PCP foi chumbada na votação na especialidade com os votos do PS e a abstenção do PSD. A proposta da bancada comunista contou com os votos a favor do BE e do CDS, partido que também tinha uma proposta para ajustar os escalões.

O Governo já tinha fechado a porta a uma medida que, pelas contas do executivo, implicaria para o Orçamento do Estado uma perda de receita de 63 milhões de euros. Os contribuintes com rendimentos que estão no limite de um escalão para outro podem ficar a perder poder de compra, pelo facto de os valores não acompanharem a subida da inflação.

Quando o assunto foi discutido na especialidade, a 16 de Novembro, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, defendeu que a proposta teria “efeitos marginais” e que a actualização teria mais impacto nos contribuintes de rendimentos mais altos, sem mudar “substancialmente a vida de ninguém”.

Aprovada por unanimidade foi uma iniciativa da bancada do PS para que os pais separados possam ter acesso, em igualdade de circunstâncias, à senha dos filhos no Portal das Finanças, para efeitos do IRS.

Uma boa parte das votações desta terça-feira tinha a ver com propostas na área fiscal. As propostas do CDS e PSD para acabar com o aumento do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos foram rejeitadas pela esquerda. Só os centristas e os sociais-democratas votaram a favor das iniciativas – idênticas e votadas em conjunto – que os dois partidos propunham. O PS, o PCP e o BE votaram contra.

Chumbadas foram também as propostas do PSD e CDS para acabar com o adicional do IMI. PS, BE e PCP votaram contra.

Ainda a tourada

De manhã, a discussão sobre o IVA das touradas (cuja redução para 6% acabaria por ser aprovada, já durante a noite) teve palco em plenário. Quando se adivinhava um bloco contra o Governo – que incluiria o PS – na redução da taxa do IVA para as touradas, o CDS fez questão de evidenciar as divergências entre os socialistas, desafiando o “partido da mãozinha” a definir-se: está ao lado da igualdade de acesso a todos os espectáculos ou de quem acha que a tauromaquia não é civilização?

A pergunta foi lançada pela centrista Vânia Dias da Silva, que exortou o PS a rejeitar a discriminação das taxas para todos os espectáculos “no litoral e no interior”. O próprio PS, pela voz de Luís Testa, defendeu que o partido “não afasta a tauromaquia da realidade cultural de um país, das suas regiões, que a ouvem, vêem ou lêem como o seu património cultural declarado”.

Para Luís Testa, a discussão à volta de sete pontos percentuais na taxa de IVA “não pode encerrar a natureza de um espectáculo, a moral ou a ética”, numa alusão implícita à frase da ministra da Cultura, Graça Fonseca, que justificou a manutenção de 13% para as touradas por uma questão de civilização.

Como assinalou o social-democrata José Carlos Barros, chegou-se à “singularidade de o PS estar contra o OE”, Essa divergência, contudo, não transpareceu no debate. Depois da intervenção de Luís Testa, que subscreveu a proposta do PS para eliminar as diferenças nas taxas de IVA nos bilhetes dos espectáculos, o secretário de Estado do Orçamento António Mendonça Mendes limitou-se a reafirmar a proposta do Governo, alertando para que a descida do IVA no cinema torna-se num caso complexo por causa das pequenas salas. Mas não falou das touradas.

Neste ponto, o primeiro a congratular-se com o fim da isenção de IVA para os toureiros foi o deputado do PAN. “Os fatos vistosos e cornetadas não conseguem transformar o que é evidente: tourada é violência”, afirmou. Pelo BE, Jorge Campos justificou a proposta bloquista de subir para 23% o IVA para as touradas por considerar que é um espectáculo de “absoluto anacronismo”.

O PCP e o CDS conseguiram, contra a vontade do PS, eliminar os aumentos na taxa de tributação autónoma sobre as viaturas. Os dois partidos tinham propostas que iam no mesmo sentido e as duas foram votadas em conjunto.

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