Soldado Milhões: o herói de Valongo chega à televisão

O filme de Jorge Paixão da Costa e Gonçalo Galvão Teles que recuperou uma figura mítica da Batalha de La Lys passou nas salas portuguesas em Abril. Este sábado, às 21h, estreia-se como minissérie de três episódios na RTP1.

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Miguel Borges e João Arrais, os dois actores que fazem de Aníbal Augusto Milhais na minissérie, em frente ao busto do soldado em Murça DR
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Busto de Aníbal Augusto Milhais na Praceta Herói Milhões, a quem deu o nome DR
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Os actores Miguel Borges, Isac Graça, Tiago Castro e Carminho Coelho nas ruas de Valongo de Milhais DR
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O argumentista Mário Botequilha fotografa a placa da Rua Herói Milhões, em Valongo de Milhais DR
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A casa de Aníbal Augusto Milhais em Valongo de Milhais DR

Final de Outubro, Murça. A equipa de Soldado Milhões sobe à região do Douro para visitar parte da família de Aníbal Augusto Milhais, bem como a casa de Valongo onde viveu o soldado que, em 1918, na Batalha de La Lys, em plena Primeira Guerra Mundial, foi condecorado ainda no campo de batalha com a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito. Para assinalar a apresentação da série, a Câmara Municipal oferece um almoço volante, de rancho, a realizadores, argumentista, produtores, actores, imprensa, familiares do soldado, representantes da RTP, membros da universidade sénior local e pelo menos um tenente-coronel do regimento 19 de infantaria de Chaves, ao qual Milhais pertenceu.

Só depois seriam mostrados, no Auditório Municipal mesmo ali ao lado, excertos dos três episódios da minissérie que a RTP1 estreia este sábado às 21h e que tem mais 65 minutos do que a versão cinematográfica que esteve nas salas portuguesas em Abril. É transmitida no mês em que se celebra o centenário do Armistício de Compiègne, que pôs fim à guerra. Paralelamente, na RTP3 e no RTP Play, de 5 a 16 de Novembro, haverá dez episódios de A Vida nas Trincheiras, uma série de curtos documentários realizados por Cláudia Alves e conduzidos pela historiadora Isabel Pestana Marques, a aprofundar o contexto histórico desta obra de ficção.

Tal como tantos outros jovens do país, Aníbal Augusto Milhais (1895-1970) foi enviado para a Flandres integrando o muito mal preparado Corpo Expedicionário Português, cuja participação na Primeira Guerra Mundial seria desastrosa (o saldo, penoso, foram milhares de mortes). Apenas com a ajuda da sua metralhadora Lewis, terá enfrentado as tropas alemãs, garantindo a retirada do seu pelotão, o que levou à sua condecoração e o tornou um ícone, com direito a uma alcunha, a de Soldado Milhões, por "valer milhões".

Jorge Paixão da Costa, co-realizador e co-argumentista que pegou nesta história, já tinha ido à vila na fase de pesquisa, para conhecer os sítios por onde Aníbal Augusto Milhais passou e falar com a família que resta. O filme não foi rodado ali, mas sim no Campo de Tiro de Alcochete: "Não há condições. Demos umas voltas para ver se havia alguma hipótese de rodar aqui e chegámos à conclusão de que estava tudo poluído", justifica ao PÚBLICO. É por isso que muitas das pessoas da produção estão a ver a zona pela primeira vez.

Depois de uma passagem pela Praceta Herói Milhões, onde há um busto do soldado, a neta Leonida Milhões (parte da família mudou o apelido para acomodar a alcunha Milhões), que tinha 18 anos quando o avô morreu, fala do seu papel quase como interlocutora entre a produção e a família. "Tive o prazer de acompanhar o Paixão da Costa e o Pablo [Iraola, produtor] nas primeiras visitas e entrevistas a familiares, nomeadamente ao meu tio e a uma tia minha que já faleceu. De vez em quando calha fazer a ponte nesse aspecto", conta, adicionando que também já tinha auxiliado o jornalista Francisco Galope quando este escreveu O Herói Português da I Guerra Mundial, um livro que, aliás, serviu de pesquisa para Soldado Milhões.

Entre esses primeiros contactos e a experiência de ver o filme que daí resultou "passaram muitos anos", partilha. "Na altura faz-se uma ideia do que se pensa que poderá acontecer, mas depois já não fazemos ideia nenhuma. Foi uma agradável surpresa, sobretudo por ter encontrado na figura do meu avô uma pessoa humana, que foi aquilo que eu sempre vi nele como familiar. A série vai ser uma nova experiência", continua.

Tal como o filme, a série divide-se em duas linhas temporais, cruzando os acontecimentos que Aníbal Augusto Milhais e os seus colegas viveram em 1918 nas trincheiras de La Lys e o ano de 1943, quando este é homenageado (e o apelido "de Milhais" é adicionado ao nome da sua terra natal) e conta com relutância à filha Adelaide, durante uma caçada, como foi a guerra. Mas tem mais cenas, e personagens novas. "Há uma miúda francesa e um soldado alemão, um rio com uma série de mortos, a deambulação numa quinta que está completamente abandonada", enumera Paixão da Costa. Mário Botequilha, co-argumentista, acrescenta: "Em 1943 há várias coisas que se passam aqui que não estão no filme."

Essa triagem, dizem os dois, foi feita a posteriori. À saída da casa hoje delapidada do soldado (existem planos para ser transformada num museu) em Valongo de Milhais, onde não há rede de telemóvel, os actores explicam que quando filmaram não sabiam que cenas se destinavam ao filme e quais entrariam apenas na série. "Não sei qual é a diferença. Era um filme, nem sequer pensei em série", afirma Miguel Borges, que faz de Aníbal Augusto Milhais em 1943. "Eram três guiões", partilha Raimundo Cosme, o intérprete de Mata Vacas, um colega de pelotão do soldado, enquanto João Arrais, que encarna o Soldado Milhões de 1918, menciona que "sempre se soube que estava em cima da mesa ser ou filme ou série".

Notícia corrigida às 11h01 de 4 de Novembro: Foi alterada a informação que dava conta de "centenas de milhares" de mortos. 

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