Música com hashtag no festival de barroco da Casa da Música

O compositor residente Gonçalo Gato estreia nova peça com o Remix Ensemble, num programa que inclui obras de Carlos Seixas e Domenico Scarlatti.

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Gonçalo Gato DR

#where_we’re_going, que é como quem pergunta: “Para onde vamos?”. É este o título da peça que Gonçalo Gato (Lisboa, 1979), o compositor português em residência na Casa da Música em 2018, estreia este domingo (Sala Suggia, 18h) no segundo concerto do calendário deste ano do festival À Volta do Barroco.

“O título desta peça convoca à reflexão sobre o status quo daquilo que constitui uma existência e socialização digital”, escreve o compositor na nota do programa do espectáculo, cuja primeira parte estará a cargo do Remix Ensemble, com direcção de Peter Rundel, estando a segunda por conta da Orquestra Barroca Casa da Música, dirigida pelo cravista alemão Andreas Staier, que é nesta edição o convidado especial do ciclo.

Carlos Seixas e o italiano Domenico Scarlatti, compositores e teclistas associados à Capela Real de Lisboa no século XVIII, são os nomes celebrados no alinhamento dos cinco concertos do festival, que decorre até 11 de Novembro.

E como é que um compositor contemporâneo convive com a atmosfera e com esses nomes maiores da música barroca? Gonçalo Gato responde ao PÚBLICO que é “uma relação pacífica”. “Gosto bastante da música do passado, e a minha música tem muitos traços de várias épocas, não especificamente da barroca”, diz o compositor, confessando a sua admiração por Vivaldi, por Bach, “que é obrigatório”, mas também pelo seu filho Johann Christian Bach, “que influenciou muito o Mozart”, e porque lhe interessa especialmente “a transição do barroco para o período clássico”. “Mas a minha música não exclui nenhuma época e, nela, algumas passagens são mesmo barrocas”, acrescenta.

#where_we’re_going é a segunda das três peças que a Casa da Música encomendou ao compositor residente: a primeira, Elementos, foi já estreada em Outubro pelo Trio Adamastor; a terceira, Ex machina colores, abordará “as cores que vêm da máquina”, explica Gato, e será interpretada em Dezembro pela Orquestra Sinfónica do Porto.

Em todas elas, a música de Gonçalo Gato anda em volta do tema do algoritmo, que foi, de resto, o tema do seu doutoramento na Guildhall School of Music and Drama, em Londres.

O compositor explica que o seu trabalho tem vindo a incidir sobre “a música e aquilo que ela nos dá, e que só ela nos pode dar – que é algo sempre misterioso –, e que afecta várias dimensões da existência”. E diz que utiliza o computador “como uma ferramenta de exploração”, e que o entende mais como “uma forma de inteligência aumentada do que de inteligência artificial”.

Com uma década de uma carreira já consolidada como compositor – em 2008, arrecadou o primeiro de dois primeiros prémios no Concurso de Música da Póvoa de Varzim –, Gonçalo Gato vê a sua escolha pela Casa da Música como algo “muito bem-vindo”, e que chegou numa altura em que se sente já “muito confiante” com aquilo que já criou. E realça a importância do trabalho da instituição portuense, e em particular do Remix Ensemble, numa altura em que, no  país, “a situação está muito complicada para a música contemporânea”. O compositor lamenta, de resto, o facto de em Lisboa não existir actualmente nenhuma formação institucional para a execução da música do nosso tempo.

Com as atenções especialmente viradas para Seixas e Scarlatti, o festival À Volta do Barroco deste ano destaca a influência do Barroco em diferentes períodos da história da música. Do lado da música contemporânea, destaca-se também outra estreia mundial, no dia 6 de Novembro, com o Remix a interpretar a peça im Schatten der Harfe, do austríaco Georg Friedrich Haas, o outro compositor em residência, este ano, no Porto.

Notícia corrigida: a segunda parte do concerto do dia 4 de Novembro será com a Orquestra Barroca e não com a Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música.

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