Como é difícil passar para a outra margem em Constância e na Chamusca

PCP foi espreitar os problemas das acessibilidades do distrito de Santarém, atravessado pelo Tejo. Nem sempre as pontes são uma passagem rápida para a outra margem e as populações pedem novas há décadas.

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Ponte João Joaquim Isidro dos Reis, construída entre 1908 e 1910. DR
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A ponte liga a Chamusca, na margem sul do Tejo, e a Golegã, na margem norte. DR

O Tejo é uma bênção e ao mesmo tempo uma dificuldade acrescida. Mas o grande problema para os concelhos de Constância e da Chamusca não é o rio Tejo, é o esquecimento de Lisboa sobre as dificuldades para o atravessar, num distrito rural, com vilas e aldeias dispersas, de onde as empresas querem fugir por falta de acessibilidades.

As duas pontes sobre o Tejo no distrito de Santarém que o PCP escolheu para mostrar nestas jornadas parlamentares são o exemplo de investimentos que têm sido atirados sucessivamente para o futuro e que deveriam ser incluídos num planeamento estratégico de investimentos em acessibilidades rodo-ferroviárias (com o respectivo envelope financeiro) que os comunistas defendem ser imprescindível fazer.

Quem precisa atravessar de Constância, na margem norte, para Santa Margarida ou Tramagal, a sul, tem que usar a centenária Ponte da Praia do Ribatejo, que só permite o trânsito alternado. Não é grande problema a meio da manhã, mas pode tornar-se uma dor de cabeça ao fim da tarde, quando ali se junta quem vai às escolas buscar as crianças, quem vem do trabalho (incluindo os militares que saem do campo militar de Santa Margarida (a sul) ou de Tancos (a norte). E a sorte para estes condutores é que são só veículos ligeiros, porque a estrutura com largas dezenas de anos só tem 2,4 metros de largura e 2,1 metros de altura (por causa dos pórticos) e não aguenta veículos pesados.

Socorro atempado às populações em causa

Mas se estes condutores podem esperar, o mesmo não acontece com os bombeiros e a protecção civil. O presidente dos Bombeiros de Constância, Adelino Gomes, conta que em caso de acidente ou incêndio em que se precise de atravessar a ponte, “perdem-se minutos cruciais”. Até já houve um acidente com feridos na própria ponte onde as ambulâncias não puderam chegar. Os bombeiros já abriram uma secção a sul, em Santa Margarida, mas não conseguem fazer face às despesas. Adelino Gomes queixa-se das dificuldades financeiras por causa de uma longa lista de dívidas do Ministério da Saúde à corporação, que já passa dos 800 mil euros.

Pior mesmo só quando esteve fechada durante nove meses em 2011, em que era preciso fazer uma volta de quase 100 quilómetros entre as duas margens consoante o destino. Alice Campos, que para ali foi morar em 2008 quando o marido, militar, foi integrado em Santa Margarida, descreve as dificuldades dos filhos para chegarem à escola e que num percurso de oito quilómetros e quase uma hora apanhavam dois autocarros e o comboio. E Júlia Amorim, que vive do lado norte mostra-se preocupada com a falta de coesão territorial do concelho, que tem que duplicar serviços nas duas margens.

Já para não falar de 2007, quando estiveram fechadas a veículos pesados a de Constância, a de Chamusca sul e a D. Luís em Santarém. Foi uma altura em que as grandes empresas se questionaram se verdadeiramente valia a pena continuar na região. As suas alternativas eram Abrantes e a Salgueiro Maia (Santarém). “É claro que os produtos têm que sair daqui mais caros”, aponta Rui Ferreira, falando da fábrica da Caima, mesmo ao lado da ponte que não pode usar, ou da Mitsubishi, no Tramagal, a poucos quilómetros para nascente, que exportam praticamente toda a sua produção mas estão longe de Sines em termos rodoviários. E citou também pequenos empresários como um fabricante de cozinhas que não consegue que lhe entreguem matéria-prima.

A PPP na Chamusca com mais de cem anos

Se a solução para Constância é uma ponte nova, para ligar a Chamusca à Golegã bastaria construir um novo tabuleiro mesmo ao lado para ser usado como o sentido contrário. A proposta é de Sérgio Carrinho, que não esconde a frustração de não o ter conseguido nos 33 anos em que presidiu à Câmara da Chamusca. “O grande problema da ponte é o excesso de trânsito.” Ali passam 1800 veículos por dia, na sua maioria camiões – hoje iam carregados de uva, milho, tomate, pimento – e tractores porque a região é essencialmente agrícola.

Os automóveis conseguem cruzar-se na ponte, mas os camiões não – só cabe um. Há semáforos intermitentes, que são ligados em dias de nevoeiro – e isso é algo normal na lezíria do Tejo – e os camionistas costumam gerir a passagem nos 800 metros de tabuleiro da ponte na base da cordialidade. Ora agora passas tu, ora agora passo eu. Nos casos de teimosia, já foi preciso desengatar camiões a meio do tabuleiro.

Até há 20 anos, “com jeitinho”, cabia um camião em cada sentido. Mas houve um acidente em que um pesado partiu umas traves de aço laterais que sustentam os tramos da ponte (o tabuleiro está dividido em oito peças, cada uma com cem metros de comprimento) e podia ter provocado o colapso da ponte, descreve Sérgio Carrinho. A solução foi colocar rails ao longo do tabuleiro, que ficou mais apertado e impede o cruzamento dos camiões.

Ao Parlamento chegaram as reclamações das gentes da terra, os partidos uniram-se e fizeram uma série de projectos de resolução, aprovados por unanimidade, recomendando ao Governo a construção de uma nova ponte mas até agora nada. Até podia ser uma solução numa qualquer parceria público-privada e não seria uma novidade: a Ponte João Joaquim Isidro dos Reis (que na altura intercedeu junto do Governo pela obra) foi construída com um contrato de PPP, pela empresa francesa Fives-Lille entre 1908 e 1910.

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