Google admite que deixa os criadores de aplicações aceder a dados do Gmail

Os programadores da empresa deixaram de ter acesso em 2017, por motivos de protecção da privacidade. Sistemas de inteligência artificial monitorizam o cumprimento das regras.

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A carta foi divulgada a dias de uma audição da tecnológica no Senado Reuters/DADO RUVIC

O Google admitiu que continua a permitir a programadores de aplicações analisar e partilhar dados das contas do Gmail dos utilizadores. Basta que estes o autorizem, no momento da instalação.

Trata-se de uma prática que a própria empresa fazia antes de Junho de 2017 para fins de publicidade segmentada, mas que deixou de fazer em prol da privacidade.

Ainda assim, a empresa defende o acesso por terceiros a dados do email – e a forma como o vigia – numa longa carta endereçada ao Senado norte-americano. Foi tornada pública esta quinta-feira, pelos próprios senadores, mas data de Julho de 2018, altura em que uma investigação do jornal norte-americano Wall Street Journal  revelou que várias aplicações instaladas pelos utilizadores permitiam a programadores de fora do Google ter informação sobre as contas de email. Isto inclui os contactos com quem os utilizadores mais trocam mensagens, as viagens que as pessoas fazem, e o tipo de produtos que compram.

Em troca, as pessoas têm acesso a ferramentas que servem, por exemplo, para ajudar a organizar a caixa de entrada ou a comparar preços de produto. O problema é que a troca nem sempre é clara e, de acordo com o Wall Street Journal, alguns programadores chegam a ter acesso às conversas electrónicas das pessoas. Num dos casos expostos pelo jornal, cerca de oito mil mensagens foram lidas na integra por analistas de um distribuidor de aplicações para ajudar a treinar o sistema informático daquela empresa.

A informação levou o Senado norte-americano a interrogar o Google sobre as suas práticas de privacidade. A conclusão foi que "existia uma falha de supervisão por parte do Google para garantir que os dados do Gmail estavam devidamente salvaguardados." Agora, conhece-se a argumentação usada pela empresa. Foi assinada por Susana Molinari, a vice-presidente de políticas públicas e assuntos governamentais do Google.

“Como outros fornecedores de email damos opções e escolhas sobre como as pessoas acedem e usam o seu email, incluindo o uso de programas informáticos para personalizar mensagens de correio electrónico, planeadores de agendas e sistemas de gestão de relações”, escreveu Molinari, que admite que o Google permite aos programadores de aplicações do Gmail – que é usado por cerca de 1400 milhões de pessoas – aceder a informação dos emails dos utilizadores desde que “sejam transparentes” sobre esse facto.

“Na maioria dos casos, conseguimos detectar e suspender aplicações enganadoras ou que não são transparentes”, disse Molinari.

A equipa do Google não entra em detalhes sobre como as aplicações podem ter acesso aos dados dos utilizadores, nem divulga o número de aplicações que já foram encontradas a violar as regras de privacidade do Google. Garante, no entanto, que a empresa tem mecanismos para evitar eventuais problemas.

Aprovação manual

De acordo com a explicação de Molari, qualquer aplicação que precise de acesso aos dados do Gmail tem de passar por uma aprovação manual do Google. “Se forem aprovadas, usamos ferramentas de aprendizagem automática (algoritmos que usam inteligência artificial) para monitorizar as aplicações”, explicou Molinari. “Se detectamos diferenças significativas no comportamento da aplicação, esta volta a passar por um sistema de revisão manual.”

Independentemente da decisão do Google, Molinari frisa que as aplicações apenas têm acesso aos dados dos utilizadores se estes autorizarem. Por norma, o pedido surge em tópicos numa caixa branca que as pessoas têm de autorizar para instalar uma nova ferramenta de email. "Também mostramos lembretes sobre os dados que os utilizadores estão a partilhar quando usam estas aplicações, bem como o controlo para removerem o acesso", notou Molinari. 

Os senadores dos EUA escolheram divulgar a justificação do Google a cinco dias da audição pública do Google, da Apple, do Twitter e da operadora de telecomunicações AT&T. O objectivo é avaliar as políticas de privacidade de dados dos grandes gigantes tecnológicos.

O tema ganhou particular relevância no começo do ano, com o escândalo de privacidade do Facebook, em que se descobriu que informação de milhões de utilizadores da rede social chegaram, sem consentimento da rede social, à Cambridge Analytica, uma empresa de análise de dados que trabalhou para a campanha de Donald Trump em 2016.

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