Num mundo ideal, em que os impostos sobre o rendimento cumprissem o seu papel redistributivo, não seriam necessários impostos sobre a propriedade. Acontece que na OCDE o top 10% de famílias mais ricas possui 50% da riqueza e ganha 25% do rendimento. Esta riqueza é rendimento acumulado! A distribuição mais desigual da riqueza mostra que a progressividade do IRS não cumpre cabalmente a sua função. Portanto, os impostos sobre a propriedade são fundamentais para a justiça fiscal. Uns incidem sobre o valor desta e são pagos anualmente – Imposto Municipal sobre Imóveis, em Portugal. Outros são devidos no momento em que um imóvel é transacionado e dependem do seu preço. Em Portugal, como em outros países, revestem duas formas: o Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT) e o Imposto sobre as Mais-Valias; o primeiro sobre o preço de venda, o segundo sobre a diferença entre o preço de venda e o preço de compra do imóvel.

Em países em que as autoridades partilham informação com a comunidade científica – contrariamente a Portugal, onde não existem dados oficiais sobre preço e características de bens imobiliários – existem estudos sobre impostos ao estilo do IMT e mais-valias. Uma consequência destes impostos é os proprietários não venderem a casa, ou atrasarem a venda, em face de uma mudança de emprego, por exemplo. A isenção de imposto de mais-valias quando o montante é utilizado para habitação própria leva à compra de casas maiores ou não mudança para menores. Os EUA introduziram em 1997 uma isenção total de imposto de mais-valias até meio milhão de dólares com um impacto substancial nas vendas de casas e um aumento de cerca de 25% na mobilidade dos indivíduos, em especial aqueles que tinham interesse numa casa mais pequena (divorciados, casais cujos filhos deixaram a residência familiar). No Reino Unido, no rescaldo da crise de 2008, as casas de menor valor ficaram isentas do imposto semelhante ao IMT, originando um aumento do número de vendas. Em Toronto, a introdução de um imposto semelhante, de apenas 1,1%, levou a uma redução de 15% no volume de vendas.

Podemos argumentar que a "taxa Robles "não teria grande impacto nas famílias, desde que os valores de transações às quais se aplicasse fossem devidamente escolhidos. Em Nova Iorque desde 1989, e em New Jersey desde 2004, existe o chamado “Imposto Mansão”, que cobra 1% sobre todas as transações de casa de valor superior a um milhão de euros. Ou seja, uma família que compre uma casa de um milhão paga dez mil dólares, enquanto se a casa valer 900 mil não paga nada. Analisando mais de três milhões de transações, os economistas Kopczuk e Munroe concluem que existe uma concentração imediatamente abaixo da fasquia do milhão de dólares, o que evidencia manipulação do preço para evitar o imposto e reduz a receita fiscal. Para além disso, existe um pequeno número de casas – 0,7% das transações – que não são vendidas devido ao imposto. Os ricos que deixam de comprar a sua mansão podem até não ser uma prioridade de política pública. Mas também é certo que as mansões que não mudam de donas não ajudam os mais pobres ou as classes médias.

Não há nada de errado em utilizar os impostos sobre a propriedade para procurar melhorar a situação das famílias de classe média. Não devemos evitar um instrumento fiscal por ele ter custos económicos, como foi sendo sugerido ao longo destes dias de discussão – todos os impostos os têm! Mas devemos escolher, de entre os existentes, aqueles que geram menos distorções. O IMI consegue fazer tudo o que a "taxa Robles" faria – tornando-se mais progressivo, sendo diferenciado em função da utilização dos imóveis, diminuindo com a duração da propriedade para residências não permanentes. Com duas vantagens evidentes – o IMI incide sobre o valor do imóvel na caderneta predial, fixado por lei e não manipulável, contrariamente ao preço de venda, e não desencoraja transações. Se for para alterar os impostos sobre a transação, então isentem-se as casas mais baratas de mais-valias e IMT. Dinamiza-se o mercado habitacional da classe média e baixa, com uma diminuição de preço em bónus.

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico