Países europeus não estão a fazer o suficiente para proteger cidadãos da poluição atmosférica

Relatório refere que legislação europeia é pouco eficaz: ajuda a reduzir as emissões de poluentes, mas a qualidade do ar não melhora ao mesmo ritmo. Além disso, muitos países membros não estão a aplicá-la devidamente. Por ano, há 400 mil mortes prematuras na UE atribuídas à poluição atmosférica.

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Reuters/JASON LEE/ARQUIVO

Um relatório do Tribunal de Contas Europeu (TCE) publicado esta terça-feira dá conta de que a maioria dos países membros da União Europeia não estão a fazer o suficiente para proteger a saúde dos cidadãos da poluição atmosférica, sobretudo ao falharem na transposição de uma directiva europeia  – e que as medidas já aplicadas “não produziram o impacto esperado”.

Todos os anos, há cerca de 400 mil mortes prematuras na UE devido à poluição do ar, indica o relatório, sobretudo causadas pelo efeito das partículas em suspensão, do dióxido de azoto e do ozono troposférico. Quem vive em zonas urbanas tem mais propensão para desenvolver este tipo de complicações de saúde.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece que a poluição atmosférica é o maior risco ambiental para a saúde na UE. Além das 400 mil mortes prematuras anuais (ocorridas antes de atingida a esperança média de vida no país), gera ainda centenas de milhares de milhões de euros de custos externos relacionados com saúde, refere o relatório. Em 2017, a poluição do ar provocou cerca de 6600 mortes prematuras em Portugal.

Pelo menos 23 dos 28 países da União Europeia não cumprem os limites estabelecidos de emissões de poluentes como o óxido de azoto e partículas em suspensão, de acordo com o Tribunal de Contas Europeu. "Continuam a existir impactos consideráveis para a saúde pública", disse Janusz Wojciechowski, um dos autores do relatório, citado pela Reuters.

O presidente da associação ambientalista Zero, Francisco Ferreira, admite que o relatório “não traz nada de novo”: “É sabido que não estamos a conseguir cumprir os valores limite de partículas e de dióxido de azoto.” O professor universitário reconhece o efeito negativo da poluição atmosférica na saúde humana e nos ecossistemas, argumentando ainda que não tem havido, quer à escala europeia, quer à escala nacional, vontade e urgência política para resolver estes problemas”.

O Tribunal de Contas aponta ainda que que “as normas de qualidade do ar na UE são muito menos exigentes do que as orientações da OMS” e recomenda que esta directiva seja actualizada. Nas recomendações, é pedido que a Comissão Europeia tome medidas mais eficazes para proteger os cidadãos da poluição atmosférica, dando-lhes prioridade e integrando-as noutras medidas europeias.

Mais do que actualizar a Directiva Qualidade do Ar Ambiente (de 2008), que define as normas de qualidade relativas à concentração de poluentes presentes no ar, Francisco Ferreira diz ao PÚBLICO que é preciso “garantir a sua aplicação”.

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Poluição em Paris, França REUTERS/Philippe Wojazer

“Olhando para os resultados, a verdade é que a qualidade do ar tem vindo a melhorar mas isso não é suficiente”, reconhece o ambientalista. Nas recomendações, é ainda pedido que a Comissão Europeia tome medidas mais eficazes para proteger os cidadãos da poluição atmosférica, dando-lhes prioridade e integrando-as noutras medidas europeias.

No relatório é mencionado que, além das doenças respiratórias e pulmonares, os poluentes atmosféricos podem ser responsáveis por doenças cardiovasculares, do fígado e do sangue, assim como acidentes vasculares cerebrais (AVC). Os dados da Comissão Europeia indicam que a poluição atmosférica causa, em média, mais de 1000 mortes prematuras por dia – um número dez vezes superior ao número de mortes em acidentes rodoviários.

O médico Agostinho Marques, director do serviço de pneumologia do Hospital de São João, explica ao PÚBLICO que a poluição agrava doenças crónicas, como a asma e a doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), mas pode também originar outras complicações de saúde, como o cancro (sendo os pulmões o órgão mais exposto à poluição).

Questionado sobre se existe alguma maneira de minimizar o impacto negativo da poluição na saúde, Agostinho Marques diz que a única forma passa “pela pressão da opinião pública”, “sair para a rua e exigir bom ar”. “Não há outra forma. A poluição penetra implacavelmente.

Em resposta ao relatório, a Comissão Europeia disse que está a tentar reduzir a poluição e defendeu a sua política. "A Comissão está plenamente consciente de que há uma necessidade urgente de aumentar a qualidade do ar na Europa", disse um porta-voz do executivo comunitário. Um porta-voz da Comissão apontou melhorias em algumas áreas e recordou que abriu processos contra seis Estados-membros por não cumprirem as suas obrigações relativas à qualidade do ar. 

Já no início do ano, Francisco Ferreira dizia ao PÚBLICO que faltam medidas de emergência em Portugal para quando a qualidade do ar é má. “O ano de 2017 foi realmente mau” nesse aspecto, disse, sobretudo quando se falava de concentrações de dióxido de azoto. A nível nacional, os centros de Lisboa, Porto e Braga são as zonas onde a poluição é maior.

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