Benditos brasileiros

Eu estava calibrado para só descobrir defeitos e coisas más. Eu estava mal calibrado. Eles estavam bem. E fizeram-me bem.

Estava eu sentado no muro da praia e chegaram três carros de onde desembarcou uma dúzia de brasileiros com vinte e tal anos e três crianças. Estavam todos bem dispostos mas não daquela forma agressiva em que o divertimento é mais um dever do que uma condição.

Abriu-se a mala dum carro onde havia uma geleira com frango assado. Estariam a almoçar? Não, só duas pessoas é que foram buscar frango. Os meninos brincavam com bolas mas calmamente, sempre a olhar para as mães.

Na minha cabeça eu queria descobrir o que estavam a fazer. Mas não estavam a fazer nada. Estavam a chegar à praia. Não tinham pressa nenhuma nem ansiedade de arranjar um bom lugar ou saber se a bandeira estava amarela.

Enquanto estavam ali de roda dos carros os que tinham fome aproveitavam para comer qualquer coisa. Outros conversavam amenamente. Era feriado e aquilo que estavam a fazer não podia ser catalogado.

Não havia comandos ("Passa-me aí o...") nem pedidos ("Sabes onde está a...?"). Cada um estava completamente à vontade. Eram amigos mas não tinham rituais nem palavras de ordem. Estavam todos bem, da maneira como calhava.

Um menino saltou para a praia e exclamou: "A areia está macia! Está macia, mãe!" Parecia-me que todos eles só estavam calibrados para descobrir qualidades e coisas boas.

Já eu tinha ido para ali porque já não aguentava a multidão. Os brasileiros ensinaram-me a não ser parvo. Eu estava calibrado para só descobrir defeitos e coisas más. Eu estava mal calibrado. Eles estavam bem. E fizeram-me bem.

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