Marcelo e Trump na Casa Branca: de que tweet se fará a história?

Se a agenda bilateral pode conhecer alguns avanços, as questões multilaterais que Marcelo não deverá evitar podem não passar de uma nota de rodapé. Mas todos estarão atentos aos sinais e ao que podem significar.

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Uma semana depois de Putin, Marcelo aperta hoje a mão a Trump LUSA/ALEXEI DRUZHININ / SPUTNIK / KREMLIN POOL

“O tempo é precioso nestes encontros, não falamos sobre assuntos em que estamos 100% de acordo, nem 0% de acordo, não adianta nada”. O aviso do ministro dos Negócios Estrangeiros, a propósito da reunião que Marcelo Rebelo de Sousa vai ter com Donald Trump nesta quarta-feira, ajuda a baixar expectativas. Muitos são os assuntos em que os dois chefes de Estado estarão em desacordo, mas a reunião é de trabalho e os temas multilaterais a que o Presidente português se tem referido constantemente e que se aplicariam que nem uma luva ao homólogo norte-americano – populismos, proteccionismos, migrações, segurança e defesa - poderão não passar de uma nota de rodapé.

A agenda bilateral poderá ter, assim, uma maior repercussão e resultados mais visíveis no imediato - para isso tem estado a trabalhar o ministro dos Negócios Estrangeiros, que se desdobrou em reuniões preparatórias em Washington esta semana. O empenho de Portugal na NATO, o envolvimento dos dois países no Atlântico com a Base das Lajes como fulcral no combate ao terrorismo, os investimentos recíprocos com Sines à cabeça, como possível porto de entrada do gás líquido americano na Europa, e a grande comunidade portuguesa nos EUA, com cerca de 1,4 milhões de pessoas, poderão conhecer alguns avanços, sobretudo depois da reunião bilateral alargada que se segue ao encontro a dois, na Sala Oval.

Sobre este, significativa será a performance dos dois mediáticos Presidentes, as declarações de Marcelo a seguir e sobretudo algum tweet (ou ausência dele) com que o norte-americano resolva brindar Portugal. Deste feedback se fará a história, pelo menos para consumo imediato.

No jogo de aparências em que se tenta interpretar como correram os encontros de alto nível com Donald Trump nem tudo é o que parece. Da primeira vez que Angela Merkel foi à Casa Branca ficou o momento em que a chanceler alemã tenta apertar a mão ao Presidente norte-americano e este olha para o outro lado e não cumpre o protocolo. Mas pouco depois escreve no Twitter ter tido “a GREAT meeting” com Merkel. Pelo contrário, o encontro de Abril com Emmanuel Macron foi definido como um “bromance” que ia de vento em popa, com o Presidente francês a responder em força ao tremendous handshake do homólogo americano. Mas tanta cumplicidade deu a Trump espaço para lhe sacudir um “pequeno pedaço de caspa” do casaco, para que pudesse ser perfeito. E assim ridicularizá-lo.

Decerto o encontro entre Marcelo Rebelo de Sousa e Donald Trump não terá tão ampla e atenta cobertura mediática. O encontro na Sala Oval deverá ser curto, o suficiente para o Presidente português abordar os temas que leva trabalhados, e não está prevista conferência de imprensa no final (além das declarações de circunstância no início). Apenas a tradicional foto do aperto de mão – com mais ou menos braço, maior ou menor sorriso, acompanhamento à porta, ou não.

Do que resultar deste encontro se saberá depois: por Trump, via Twitter, caso escreva as suas impressões sobre este encontro, e por Marcelo, que depois estará na chancelaria da embaixada portuguesa e na recepção “Toast to America”, onde há-de falar aos jornalistas. E se bem o conhecemos, muito.

Certo é que o Presidente luso é o primeiro chefe de Estado europeu a reunir-se com o homólogo norte-americano depois da polémica reunião do G-7, cuja história se fez também de fotografias e tweets. Mesmo sendo Portugal um pequeno país da Europa do Sul, é um Estado da União Europeia e isso tem a sua importância, até porque acontece na véspera do Conselho Europeu que terá as migrações como prato forte. 

Como disse ao PÚBLICO o antigo director do Instituto de Estudos de Segurança da União Europeia, “aquilo que se espera dos governantes europeus neste momento é mostrarem unidade perante o unilateralismo do Presidente americano". E Marcelo sabe como fazer: falando sempre do exemplo nacional. Não por acaso, Marcelo promulgou a nova Lei da Nacionalidade antes de embarcar e Portugal foi um dos países que abriu portas aos refugiados do navio Lifeline. Por contraste, fica quase tudo dito.

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