Considerações críticas sobre o prazer e o negócio dos gin-tónicos na alvorada do Verão de 2018

Infelizmente todas as modas tendem para o conformismo, disfarçado por excentricidades pontuais. É assim com o gin-tónico, a começar pelo nome.

Em português de Portugal dizemos gin-tónico. A concordância é feita com gin, que se escreve à inglesa com n no fim, para rimar com tchin-tchin e não, como seria lógico, gim.

Ouço e leio dizer-se gin-tónica em que a tónica vai buscar a água tónica. Acho horrível. Os espanhóis são mestres do mundo e merecem ter uma maneira única de se referirem à bebida favorita. Os portugueses que inteligentemente tanto vão buscar inspiração a Espanha como ao Reino Unido também merecem uma designação especial, que é gin-tónico, assim com hífen, em que se sugere (gritando, com razão) que é o gin que é tónico, mais do que a água. É preciso, no entanto, reconhecer que gin-tónico vem de um tempo em que só havia uma boa água tónica, a Schweppes.

Nas bebidas as proporções são tudo e devem ser apuradas para cada gosto através de testes sucessivos, usando pequeníssimas quantidades.

Na moda actual diz-se taxativamente - pelo menos em Portugal e no Reino Unido - que a proporção correcta é de 1 para 4. Nomeadamente: 50 mililitros de gin para 200 mililitros de água tónica.

Este ratio dá uma água tónica temperada com gin e não um gin-tónico. Porque é que se teima neste 1 para 4? Pela pior das razões: porque dá mais lucro aos profissionais. Uma garrafa de gin de 7 decilitros dá assim para 14 gin-tónicos. Considerando que uma garrafa custa em média 14 euros aos profissionais cada gin-tónico custa 2 euros: 1 euro pelo gin e outro euro pela água tónica, isto fingindo que uma garrafa de 200 mililitros da Fever Tree custa 1 euro.

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Daniel Rocha

Como emendar a mão? No mínimo peça mais meia-medida de gin para ficar 75 mililitros. Assim com 200 ml da tónica o gin-tónico fica um agradável 1 para 3 com mais uma pinguinha de gin.

O ratio clássico do gin-tónico é de 1 para 2: 100 ml de gin para 200 ml de tónica. Se é dessa proporção que gosta basta pedir duplo gin. Mas atenção: não lhe podem cobrar o preço de dois gin-tónicos. Se cobrarem peça dois gin-tónicos com o gin à parte e complete a bebida, ficando com uma garrafa de água tónica para as corridas.

Outro problema é a extraordinária promiscuidade entre marcas e profissionais. É habitual as marcas oferecerem o gin (e a água tónica e os copos e a formação...) em troca de promoção. Os profissionais de bar aceitam porque poupam dinheiro mas quem se lixa é o cliente. No entanto os profissionais portugueses são muito bons e basta apelar ao profissionalismo deles para lhe darem valiosas sugestões.

Um aspecto deprimente do gin-tónico são os copos. São todos balões à espanhola para poderem levar muito gelo e uma garrafa inteira de 200 mililitros - está certo. Aquilo que não se aceita é a grossura boçal do vidro. Começa logo pelos baldes que oferecem as marcas quando se compra uma garrafa. As marcas podem ser boas mas os copos são mastodontes, pesadíssimos, feios, com cores berrantes e vidro grosso de mais para os lábios humanos. São assim os copos da Tanqueray, da Beefeater 24, da Sipsmith (highball) e da Number 3, só para citar uns nomes com obrigação de serem menos toscos.

Assim como não passaria pela cabeça de ninguém beber um bom vinho num copo de vidro grosso também só se deve beber um gin-tónico de um copo de vidro fininho.

Parte-se mais? É preciso mais cuidado? Claro que sim. Mas o prazer vale a pena. Há uma barreira entre a bebida e a boca - quanto mais fina for, maior o prazer.

Depois de muito experimentar acho que o melhor copo é da Spiegelau, especificamente concebido para o gin-tónico contemporâneo. Vem em caixas de 4 que custam 30 euros. Estão quase sempre esgotadas mas há sempre um comerciante algures na Europa que as tem. O vidro é finíssimo e, sobretudo, o formato é muito bem pensado. Não é a meia-bola e força das copas rascas - abre e fecha com elegância, permitindo sempre dois cubos gigantes de gelo, caso se esteja para aí virado.

Claro que é sempre possível optar por um copo de highball muito grande e alto com vidro fininho. Têm de permitir que circule livremente a bebida à volta de 2 cubos gigantes, de 15 centímetros.  São é muito caros e, no caso dos copos antigos, difíceis de encontrar. Também são difíceis de segurar - mas são divertidos, que é o que interessa.

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