A corrupção em educação

O plágio é talvez o caso mais conhecido de fraude académica porque passou a figurar explicitamente em regulamentos e códigos de ética.

Práticas de corrupção na área da educação em Portugal começam a ser noticiadas com alguma regularidade nos media, mas certamente com menos visibilidade social dada a vertigem de novos detalhes sobre processos judiciais em curso, com protagonistas tão diversos como ex-governantes, banqueiros ou dirigentes desportivos.

No jornal Expresso, de 12 de maio, há duas notícias sobre eventual corrupção na área da educação: uma que refere que “A Polícia Judiciária suspeita que possa ter havido corrupção nos contratos que possibilitaram obras faraónicas em várias escolas da Parque Escolar” (p. 6) e outra que dá conta de uma investigação por parte da Inspeção-Geral de Educação e Ciência sobre eventual fraude na reapreciação de classificações de exames nacionais de português do 12.º ano (p. 22).

No jornal PÚBLICO de 14 de maio, noticiava-se também que o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida deixava transparecer preocupação com a integridade na investigação, recomendando a criação de uma Comissão Nacional para a Integridade Científica que, entre outras coisas, deveria tratar de casos relacionados com “suspeitas de fabricação, falsificação e de omissão deliberada de dados indesejáveis, que são violações graves do ethos da investigação” (p.14). Neste mesmo jornal, de 17 de maio, uma das manchetes refere o julgamento à porta fechada do reitor de uma universidade privada, por alegado desvio de dinheiro daquela instituição (p.16). 

Nenhum destes exemplos configura o que tem sido, nos anos recentes, a preocupação recorrente nas instituições de ensino superior – a fraude académica. O plágio é talvez o caso mais conhecido de fraude académica porque passou a figurar explicitamente em regulamentos e códigos de ética. Mas há muitas estratégias de sobrevivência escolar ilegítima no sistema educativo, frequentemente aprendidas e ensaiadas no ensino secundário e, mais tarde, reforçadas no ensino superior.

A relação entre fraude e corrupção nem sempre é evidente, e a definição do que é corrupção também não é consensual, não apenas entre profissionais que lidam quotidianamente com problemas desta natureza (sobretudo na área jurídica, fiscal, criminal e jornalística), como também entre especialistas de diferentes áreas das ciências sociais e humanas. De igual modo, a perceção social sobre a corrupção também se tem alterado consoante as épocas históricas, as tradições culturais e religiosas, os sistemas políticos e, entre outros fatores, os graus de desenvolvimento económico e o desenvolvimento moral dos indivíduos. Seria, aliás, fundamental não esquecer que o desenvolvimento moral, como o demonstra alguma psicologia especializada, tem uma relação com o desenvolvimento cognitivo, e ambos têm muito a ver com as nossas experiências de vida e com os sistemas e contextos de educação e formação, cujos processos deixam muitas vezes a desejar em termos de qualidade científica, pedagógica e democrática.

Ainda assim, é interessante notar, a propósito das conclusões de um relatório recente encomendado pela Comissão Europeia (Special Eurobarometer 2017), que o sistema educativo, em diferentes países, comparativamente com outros sistemas e serviços da administração pública, é visto como menos suscetível a práticas de corrupção. Do meu ponto de vista, um dos obstáculos que pode explicar uma eventual menor sensibilidade a práticas de corrupção dentro do sistema educativo (práticas que, por vezes, são naturalizadas ou passam despercebidas) é a crença nas virtudes da educação como principal antídoto contra a corrupção.

A educação é muito importante, mas não resolve por si só um problema que é estrutural em muitas sociedades. Esperar o contributo crítico da educação para que a corrupção possa ser evitada não deve impedir-nos de admitir que os sistemas educativos são, eles próprios, paradoxalmente, contextos altamente propícios a essas práticas.

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