Empresa pública usa homem de confiança de Oliveira Costa para validar despedimento colectivo

António José Duarte era o braço direito de José Oliveira Costa e tornou-se peça chave na investigação do Ministério Público ao desvio de mil milhões de euros no BPN.

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NFS NUNO FERREIRA SANTOS - PUBLI

A empresa pública Parvalorem (criada exclusivamente para gerir activos tóxicos do BPN) nomeou como perito num despedimento colectivo um membro da direcção de contencioso e recuperação de crédito, António José Duarte, que no BPN/SLN, era o braço direito de José Oliveira Costa. E que se tornou uma peça chave na mega investigação do Ministério Público ao Banco Insular, entidade virtual desconhecida do Banco de Portugal e do Fisco, para onde o BPN desviou quase mil milhões de euros.

A Parvalorem, tutelada pelo Ministério das Finanças, e chefiada por Francisco Nogueira Leite, indicou António José Duarte, como perito num processo de despedimento colectivo contra sete trabalhadores que recusaram assinar acordos de rescisões. A acção está em curso e remonta a 2015. Os sete bancários estavam inicialmente incluídos num grupo de 49, dos quais 42 aceitaram propostas para saírem da empresa. Uma trabalhadora grávida declarou-se insolvente e foi salva pelo Ministério do Trabalho ao abrigo da lei.

A nomeação de António José Duarte para ser o perito da empresa pública, destina-se a validar em tribunal o despedimento colectivo contra os sete trabalhadores que o impugnaram.

“Confirmo que fui indicado pela Parvalorem perito no processo 3620/16.8, o que foi aceite pelo tribunal”, disse ao PÚBLICO António José Duarte.

Actualmente, António José Duarte integra a direcção de contencioso e recuperação de crédito da Parvalorem, a área que recebe os pagamentos e coloca os clientes em contencioso, tendo-lhe sido atribuídas funções na gestão da carteira de créditos incobráveis da ex-SLN (agora Galilei) de 1,1 mil milhões de euros.

A sua importância junto da administração de Francisco Nogueira Leite releva da sua remuneração, em termos brutos, que ascende a 6.614 euros, dos quais 4.175 euros são remuneração complementar. Recebe 773 euros de isenção de horário e 80 euros de diuturnidade (grau de antiguidade de 18,62 anos). O vencimento base (escala 12) é de 1.584 euros.

Foi a 23 de Agosto de 1999 que o antigo assessor de José Oliveira Costa entrou no BPN, onde se tornou conhecido como sendo o “homem” de confiança do presidente.

Durante as investigações que se abriram, depois de o BPN ter colapsado, em 2008, alvo de uma mega burla perpetuada ao longo de anos pelos seus dirigentes, António José Duarte passou a cooperar com o Ministério Público e o Banco de Portugal, que não o acusaram. E percebe-se porquê. O curriculum e o grau de entendimento dos detalhes dos movimentos financeiros ajudaram as autoridades a seguir o rasto do dinheiro desaparecido. É que, entre 2002 e 2007 (quando Oliveira Costa se afastou), foram desviados do BPN 9,7 mil milhões de euros: cerca de 5% do PIB português.

Quando, a 7 de Fevereiro de 2009, esteve em São Bento, a depor no quadro do inquérito parlamentar à falência e nacionalização do BPN, António José Duarte confirmou que tinha conhecimento da criação das off-shores para onde o BPN canalizava volumosas quantias destinadas a sustentar o grupo SLN, sem informar o Banco de Portugal. E que o objectivo era contornar o excesso de exposição do banco ao seu accionista.

O bancário¸ que entre 1999 e 2006 exerceu funções como administrativo na direcção de operações do BPN, antes de assumir o cargo de assessor de Oliveira Costa, explicou aos deputados que, ele próprio, registara “operações para o BPN, BPN Cayman, BPN IFI, em Cabo Verde e Banco Insular" por ordem dos seus superiores. Relatou ainda, entre outras coisas, que “entre 2002 e 2009” houve “várias centenas de movimentos entre o BPN e o Banco Insular”, a instituição fantasma usada para encobrir movimentos financeiros em larga escala, pois não era conhecida do BdP e do Fisco.

O Ministério Público apurou que entre 2002 e 2007, o Banco Insular concedeu, no total, pelo menos 788 milhões de euros em créditos, sob a forma de conta corrente caucionada, através do chamado Balcão 2, ou seja, fora do balanço oficial das contas do BPN (estas fiscalizadas pelo BdP). E que o dito balcão 2, concedeu crédito a 59 entidades offshore da SLN e ao seu próprio presidente, Oliveira e Costa, que somaram 537 milhões de euros (da verba retirada dos 788 milhões).

A propósito do Banco Insular, um dos grandes accionistas da SLN, Joaquim Coimbra dirá: "O BI não existia, era virtual. Juridicamente creio que existia, mas, enfim, esteve sempre escondido. Na verdade, nem sei o que aquilo era. Se calhar era um refúgio, sei lá. Tudo o que sei é o que vem surgindo na comunicação social. Há muita coisa que venho tomando conhecimento só agora.” Joaquim Coimbra acabou por reconhecer ter ouvido falar do Banco Insular, quando Oliveira Costa era presidente, mas sempre julgou tratar-se de uma referência ao Bilhete de Identidade.

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