Agora sim, BFF

A “geringonça” não se partirá, mas o PCP já escolheu um caminho diferente. O risco, porém, é bem medido.

O Governo tomou posse a 3 de Dezembro de 2015 e, nesse dia, Paulo Portas deu-lhe o nome. “Geringonça”, disse ele, no debate do programa do Governo. A palavra, tirada de um texto de Vasco Pulido Valente aqui no PÚBLICO, foi o que nos ficou na memória, mas Portas não trazia só um qualificativo. O segundo tinha três palavras, lembra-se? “Ficam hoje escolhidos os seus BFF — Best Friends Forever. Catarina best friend de António, António best friend de Jerónimo, Jerónimo best friend de Heloísa, e só isto não é novidade. Com eles escolheu governar e com eles poderá tropeçar. Dependendo deles, ficará ou cairá. É a vida.”

Lido três anos depois, o discurso de Portas parece um acto tão falhado como a perspectiva de um diabo nas contas: a “geringonça” não caiu e, mais do que provavelmente, não cairá. Mas, talvez recuando a esse mesmo discurso, possamos ler no discurso um pressentimento de como se moveriam as peças deste novo xadrez. Dê um desconto aos qualificativos — próprios do púlpito parlamentar — que já voltamos aos dias de hoje: “O BE já está na lapela de António Costa. É a vontade do Partido Comunista que decidirá o destino do Governo de Portugal.”

Como é próprio do PCP, a estratégia move-se lentamente. Mas desde Outubro, quando as autárquicas trouxeram uma surpreendente derrota, que se percebe na direcção comunista uma mudança de discurso. Medida, claro. Mas nas últimas semanas cada vez menos subtil — sobretudo se olhada ao seu espelho nesta maioria, o Bloco de Esquerda.

Anote os sinais da última semana: um jornal (o Negócios) descobre que o Governo cortou um bónus nas pensões de longa duração — o PCP reprova, o BE aceita; o Governo desenha uma solução para compensar a Euribor negativa — o PCP não se entusiasma, o BE canta vitória perante um ganho sem retroactivos; o Governo acerta uma nova taxa que penaliza a rotatividade de trabalhadores precários — o PCP critica-a, por legalizar o precariado, e o BE elogia, por ser meio caminho andado.

Em pouco tempo, vimos muita aproximação, ouvimos vários elogios. Claro que o Bloco é o Bloco, mas o de Catarina quer ser governo e luta para ter mais peso, para influenciar mais. O PCP é diferente: já só espera a oportunidade para saltar para as ruas, que é onde está a alma do comité central — e a razão da sua subsistência.

Para o PCP, o risco é medido: a avaliar pelas sondagens, em 2019, o seu contributo não vai ser preciso para fazer uma maioria ou para impedir a direita de voltar. Para Costa, tanto mais fácil: se não houver imprevistos até lá, terá escolhido o seu BFF. Aquele que é mesmo forever.

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