Ministério Público questiona credibilidade de ex-procurador-geral de Angola

Procuradora opôs-se a acareação entre Cândida Almeida e arguidos, alegando ser humilhante para a magistrada, mas confronto de versões aconteceu mesmo assim.

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O Ministério Público não dá grande credibilidade às declarações que o ex-procurador-geral da República de Angola, João Maria de Sousa, prestou e pode vir ainda prestar aos juízes que estão a julgar o processo Operação Fizz. “Está amplamente demonstrado que manteve ou mantém relações de amizade com Paulo Blanco”, um dos arguidos do caso, “o que poderá condicionar a sua resposta” como testemunha, declarou esta quarta-feira a procuradora que acompanha o caso em tribunal, Leonor Machado.

Como ex-procurador-geral da República, cargo que desempenhou até há pouco tempo, João Maria de Sousa teve a prerrogativa de responder por escrito às perguntas que lhe foram formuladas pelo tribunal português sobre o caso em que um magistrado do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Orlando Figueira, é suspeito de ter arquivado dois processos em que era visado o vice-presidente de Angola Manuel Vicente, a troco de 760 mil euros. O seu testemunho seria útil para aferir da fiabilidade dos relatos dos arguidos, que negam as acusações de corrupção e de branqueamento de capitais de que são alvo e justificam alguns procedimentos seus com a grande proximidade que garantem ter existido à data dos factos entre o DCIAP e a procuradoria-geral da República angolana.

Asseguram, por exemplo, que entre 2011 e 2012  a então directora deste departamento do Ministério Público, Cândida Almeida, lhes deu instruções para partilharem com as autoridades judiciais angolanas informações sobre investigações que decorriam em território nacional e se encontravam em segredo de justiça, uma vez que se tratava de casos em que o Estado angolano era parte nestes processos, na qualidade de queixoso. E que ela própria se reuniu quatro ou cinco vezes com João Maria de Sousa com o mesmo objectivo, reuniões nas quais garantem ter estado presentes.

Cândida Almeida manteve versão

Ouvida em tribunal na qualidade de testemunha, a magistrada negou tudo – o que fez com que o tribunal aceitasse, a pedido da advogada de Paulo Blanco, fazer uma acareação entre Cândida Almeida e os dois arguidos, para confrontar as diferentes versões dos factos. Fê-lo contra a vontade da procuradora Leonor Machado, que alegou que o procedimento não serviria senão para humilhar a magistrada, que saiu da liderança do DCIAP em 2013 e passou para o Supremo Tribunal de Justiça.  

De facto, Cândida Almeida manteve tudo o que disse antes: afirmou ter memória de um único encontro com o procurador-geral da República de Angola, destinado não a discutir processos judiciais concretos mas sim a preparar uma acção de formação para magistrados angolanos que ia ter lugar em Lisboa. De frente para os juízes, nunca se virou para os arguidos, que prestavam declarações imediatamente atrás de si na sala de audiências, nem mesmo quando desmentiu que alguma vez os tivesse mandado partilhar informações confidenciais com José Maria de Sousa.

Orlando Figueira trabalhava sob as suas ordens no DCIAP, departamento do qual saiu em 2012 para ir trabalhar para o sector privado – para o BCP, que já na altura tinha capitais angolanos, e para outro grupo privado à frente do qual estava um banqueiro também angolano, Carlos Silva. Para o Ministério Público, estes empregos mais não eram do que álibis para receber as luvas que lhe eram devidas por ter arquivado os processos judiciais do ex-vice-presidente de Angola.

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