Catalães em suspenso no dia marcado para conhecerem o seu novo líder

Puigdemont não excluiu estar de regresso a Espanha e a Barcelona, mas pediu garantias ao presidente do parlamento – quer saber que não será detido. Rajoy afirma que o ex-president “não será presidente de nada”.

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Um boneco típico da Catalunha moldado à imagem de Puigdemont Jon Nazca/Reuters
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Dois espanhóis passam diante do edifício do parlamento catalão com a bandeira nacional Rafael Marchante/Reuters

Dia 30 de Outubro, os catalães acordaram sem saber se os membros do seu governo iriam aparecer para trabalhar e, nesse caso, se seriam detidos. Era o primeiro dia útil da vigência do artigo 155 da Constituição, invocado por Mariano Rajoy para dissolver o parlamento autonómico e a Generalitat, e para convocar eleições. Dia 30 de Janeiro, a dúvida é outra: vai Carles Puigdemont aparecer em Barcelona e tentar chegar ao parlamento, para onde continua marcada a sessão de investidura na sequência das eleições de Dezembro?

Puigdemont parece ter desenvolvido um certo gosto por provocações. Nessa última segunda-feira de Outubro, publicou no Instagram uma fotografia tirada a partir do pátio do Palau da Generalitat, com a legenda “Bom-dia” – horas depois sabia-se que estava em Bruxelas. Esta segunda-feira, publicou uma do Passeio Picasso, uma das vias que dá acesso ao parlament, no Parque da Ciutadella. “A 24h da minha investidura. Pelo país. Pelas liberdades. Pelas nossas instituições. Pela democracia. Pela dignidade. Pelo futuro. Por ti #RepúblicaCatalana”, escreveu na rede social.

Ao final do dia, mantinha-se a incógnita sobre o que pretende fazer – sábado à noite, numa decisão polémica, o Tribunal Constitucional concluiu que não podia suspender a sessão de investidura nem anular a nomeação de Puigdemont, feita pelo presidente do parlamento, Roger Torrent. Ao mesmo tempo, definiu que Puigdemont só pode fazer o discurso de posse presencialmente (e não de forma telemática, como pretendia) e depois de autorizado por Pablo Llarena, o juiz do Tribunal Supremo que tem a instrução do processo por “rebelião, sedição e desvio de fundos” contra o anterior executivo.

Os juízes do Constitucional reuniram-se para debater o recurso apresentado pelo Governo, que esperava que o Tribunal aceitasse pronunciar-se (numa reunião futura), o que suspenderia a sessão parlamentar. A resolução é justificada pela “urgência excepcional do caso”, mas vários peritos em Direito Constitucional consideram-na ilegal – ou pelo menos nula, pois os juízes pronunciaram-se sobre algo que não chegaram a admitir a trâmite.

Puigdemont diz que não pedirá autorização, já que “mantém os seus direitos de deputado”; e a sua coligação apresentou um recurso ao próprio Constitucional contra as medidas que definiu, considerando-as “nulas de pleno direito”.

No caos catalão, onde cada dia acontece algo inédito, o primeiro-ministro afirmou-se “reconfortado” com a resolução. Mas sabe que a decisão não lhe foi totalmente favorável, o que nunca acontecera no processo de independência da Catalunha. Rajoy defendia até que não se podia recorrer preventivamente contra a investidura. Foi a sua vice, Soraya Sàenz de Santamaría, que insistiu (mesmo depois do parecer negativo, o primeiro, do Conselho de Estado).

Torrent sob pressão

Cabe a Torrent decidir: ou mantém a sessão e a nomeação de Puigdemont, podendo depois suspender o plenário para ganhar tempo, ou adia-a antes de a começar para nomear outro candidato. O seu silêncio é revelador da situação deste deputado da ERC (Esquerda Republicana da Catalunha), num dia em que membros do seu partido defenderam que “ninguém é insubstituível”. Contrariaram assim as declarações públicas de dirigentes da coligação com que Puigdemont se apresentou (Juntos pela Catalunha), obtendo mais votos do que os republicanos de Oriol Junqueras, detido desde o início de Novembro.

“Torrent tem duas filhas, sabe o que o espera”, disse um membro da direcção do PP, citado pelo diário catalão (independentista) Ara, sugerindo que será acusado de desobediência à Justiça. Puigdemont foi claro no que espera dele: numa carta, pede-lhe “apoio” para que garanta a imunidade parlamentar que estabelece que só pode ser detido em caso de “flagrante delito”.

Entretanto, dos quatro ex-conselheiros e agora deputados eleitos que se mantêm em Bruxelas, três apresentaram a renúncia aos seus lugares, evitando assim pôr em risco a maioria independentista. Detidos permanecem, para além de Junqueras, Jordi Sànchez, “número dois” da lista de Puigdemont. Ambos viram o juiz Llarena recusar o seu pedido para participarem na sessão de investidura, mas deverão poder delegar o seu voto. Sànchez foi entretanto eleito presidente do grupo parlamentar da Juntos pela Catalunha.

“Um senhor fugido da Justiça, um senhor que pretendeu liquidar unilateralmente a soberania e a unidade nacionais, evidentemente não pode ser presidente de nada”, garantiu Rajoy, numa rara entrevista à rádio Cope. Num processo em que eleitores votam para dar a maioria a partidos cujos líderes estão detidos, em fuga ou acusados há poucas garantias. O que se sabe é que terça-feira de manhã já estarão encerrados pela polícia todos os acessos ao Parque da Ciutadella

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