Terceira travessia obrigou a “desviar” terminal do Barreiro

Grupo de trabalho para avaliar nova localização continua com reuniões quinzenais, mas não há compromissos com datas. Presidente do porto de Lisboa diz que calendários dependem da vontade dos envolvidos e “muito em particular da autarquia”.

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NFS - Nuno Ferreira Santos

A construção de um terminal de Multimodal no Barreiro não pode pôr em causa a futura construção da Terceira Travessia do Tejo (TTT).

É por ter esta premissa em mente que, explicou ao PÚBLICO a presidente da Administração do Porto de Lisboa (APL), Lídia Sequeira, foi decidida e sujeita ao estudo de avaliação de impacto ambiental a localização do Terminal Multimodal do Barreiro. Porém, ainda antes de se saber a decisão final da Agência Portuguesa do Ambiente, e depois de conhecidas as críticas contundentes da Câmara do Barreiro por causa da localização escolhida, o processo acabou suspenso, e foi criado um Grupo de Trabalho para voltar a estudar a localização.

As divergências que aparentemente existem entre autarquia e Porto de Lisboa não assentam em propostas muito distintas - na verdade, significa instalar a infra-estrutura pesada na frente de rio em localizações que distam cerca de 800 metros. Mas que fazem toda a diferença para a câmara do Barreiro aceitar, ou não, o que se pode transformar numa “parede de contentores” que tapará as vistas privilegiadas para Lisboa e prejudicará uma área da cidade de que os barreirenses já usufruem actualmente.

De acordo com os documentos a que o PÚBLICO teve acesso, a localização do terminal do Barreiro sugerida pela autarquia, e com uma “solução de vistas” que viabilizava tanto o terminal como a terceira travessia, foi aprovada em sessão de Câmara em Abril de 2016 e entregue em Julho desse mesmo ano ao actual Conselho de Administração da APL, altura em que o Porto de Lisboa concluiu um “estudo de delimitação de âmbito”, um procedimento que antecede o próprio Estudo de Impacto Ambiental.

Já este ano, durante as sessões públicas de esclarecimento que organizou para debater o projecto, o presidente da Câmara do Barreiro aparece citado na imprensa a referir “que o Terminal Multimodal do Barreiro não pode pôr em causa a TTT”, e que “não pode pôr em causa as vistas - e até as pode potenciar”. Porém, e de acordo com a nota técnica que elaborou durante a consulta pública do Estudo de Impacto Ambiental (que terminou em Junho de 2017), a Câmara do Barreiro mostra-se desfavorável à proposta da APL, insistindo que as duas fases do terminal têm de se deslocar um pouco mais a nascente.

Recorde-se que o projecto da Terceira Travessia do Tejo, que chegou a ter concurso lançado, foi suspenso em 2011, por causa da degradação da situação económica do país. Na altura, a Terceira Travessia estava ligada ao projecto de Alta Velocidade ferroviária - mas o troço Lisboa-Poceirão foi o primeiro a ser sacrificado. Ainda sem nenhum tipo de decisão formal, o ministro do Planeamento, Pedro Marques, já admitiu que ela pode avançar após a decisão de alargar a oferta aeroportuária da região de Lisboa à margem sul, e ao Montijo.

Consenso ou não?

Questionada pelo PÚBLICO sobre a razão por que apresentou uma proposta diferente daquela que tinha sido acordada com a Câmara do Barreiro, Lídia Sequeira limita-se a relembrar que “todos os trabalhos desenvolvidos no âmbito do Estudo Prévio e do Estudo de Impacte Ambiental que foram objecto do processo de Avaliação de Impacto Ambiental” foram acompanhados e consensualizados “com os parceiros do Projecto da Plataforma Multimodal do Porto de Lisboa”, isto é, com a Câmara Municipal do Barreiro, a Baía do Tejo e a Infraestruturas de Portugal. “A Câmara Municipal do Barreiro tinha conhecimento deste projecto desde a legislatura anterior”, afirma Lídia Sequeira.

Rui Lopo, vereador do planeamento no executivo comunista, e que agora é vereador na oposição, não desmente, e afirma que foi um dos processos mais participados de sempre. Mas confirma que quando verificaram a proposta que estava em consulta pública no Estudo de Impacto Ambiental tiveram de se manifestar contra, por ela não respeitar a solução de vistas que sempre tinham defendido.

Lídia Sequeira defende que o layout constante do Estudo Prévio e do Estudo de Impacte Ambiental do Terminal do Barreiro, “que se reforça, foi previamente consensualizada com todos os parceiros”, foi adequado “à necessidade de salvaguardar o corredor previsto para a Terceira Travessia do Tejo” e que continua a ser esse o sentido da criação do Grupo de Trabalho instituído pela ministra do Mar para voltar a estudar uma solução.

Este Grupo de Trabalho, que para além dos representantes dos ministérios do Mar e do Planeamento é composto pela APL, Câmara do Barreiro e Infraestruturas de Portugal, continua a “desenvolver os seus trabalhos” com uma periodicidade quinzenal. Mas a presidente do porto de Lisboa não se compromete com qualquer previsão para que o projecto possa voltar a ser submetido a avaliação ambiental.

“O calendário [para a continuidade do projecto] depende da vontade conjunta dos parceiros do Projecto da Plataforma Multimodal do Porto de Lisboa, e muito em particular da autarquia”, disse Lídia Sequeira atirando para a Câmara Municipal do Barreiro o principal ónus da decisão. O PÚBLICO contactou o actual executivo, agora liderado pelo socialista Frederico Costa, mas fonte do gabinete do presidente remeteu os comentários para “mais tarde”, justificando-se com a necessidade de se inteirar melhor de todo o dossier.

O antigo vereador do urbanismo, Rui Lopo, justifica esta divergência com dogmatismos técnicos e com a ausência de um olhar mais abrangente para o território. “Se de facto os municípios pudessem decidir sobre aquilo que querem fazer acerca dos seus territórios, o terminal já estava construído há muito”, afirmou, lembrando que existem no Barreiro condições quase irrepetíveis. “Um porto é sempre uma infra-estrutura pesada, que traz consequências paisagísticas, ambientais, sociais. Mas no Barreiro, fruto talvez da sua genética industrial, esta infra-estrutura é desejada pela população. E isso é uma enorme vantagem”, sublinha o autarca. Outra vantagem é a existência de investidores interessados em avançar com o projecto. “Isto é verdade desde 2012”, assegura. 

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