Kasparov, a lenda do xadrez, volta aos campeonatos 12 anos depois

Durante o período em que esteve afastado do xadrez, o antigo campeão mundial dedicou-se ao activismo político – sendo um forte opositor do regime de Putin e contestando a administração Trump – e a temas como a inteligência artificial.

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Kasparov foi o número um do xadrez durante duas décadas NFACTOS/FERNANDO VELUDO/ARQUIVO

Garry Kasparov foi o mais novo campeão mundial de xadrez e manteve-se praticamente invencível de 1985 a 2005, quando decidiu afastar-se das competições. Agora, depois de 12 anos afastado da modalidade, o jogador decidiu voltar para a competição de rápidas e semi-rápidas de St. Louis, cidade no estado norte-americano de Missouri que é considerada a capital do xadrez. A informação foi confirmada pelos organizadores da competição.

“Com um jogador como o Garry, dá para ver que ele tem a tentação de jogar”, afirmou o director executivo do clube de xadrez de St. Louis, Tony Rich, citado pela Forbes. “Portanto não demorou muito a convencê-lo”, admite. Em comunicado, Kasparov – distinguido pela Federação Internacional de Xadrez como um grande mestre da modalidade – afirmou que era uma honra voltar à competição, que decorrerá entre 14 e 19 de Agosto.

No torneio de St. Louis, a quarta etapa da competição internacional Grand Chess Tour, dez jogadores vão competir por um prémio total de 150 mil dólares (cerca de 132 mil euros), valor esse que será dividido pelos jogadores, consoante o lugar em que terminarem. Este torneio acontece poucos dias depois do evento anual Sinquefield Cup, que se realiza na mesma cidade e também pertence ao Grand Chess Tour.

Como estas provas de St. Louis são recentes, a organização quis evidenciar a forma como a competição mundial tem crescido ao longo dos anos. “E há lá melhor maneira de o fazer do que incluir o melhor jogador de xadrez que alguma vez existiu?”, indaga Tony Rich, em declarações à Forbes.

“Estou pronto para ver se ainda me lembro de como se mexem as peças. Se não, será que conseguirei anunciar a minha re-reforma depois?”, brincou Garry Kasparov, na quarta-feira, no Twitter, confirmando a sua participação em St. Louis.

Em 1985, quando tinha 22 anos, Kasparov tornou-se o campeão mundial de xadrez mais novo de sempre, ao derrotar Anatoly Karpov. Entre esse ano e 2005, Kasparov esteve em primeiro lugar do ranking mundial 23 vezes.

Forte opositor de Putin

Para além de jogador de xadrez profissional, Kasparov é também activista político. Na altura em que abandonou as competições, em 2005, o azeri naturalizado russo e croata disse que se iria dedicar à política e à escrita, considerando que a Rússia seguia “uma direcção errada” e que iria fazer tudo o que podia “para se opor à ditadura de Putin”.

Em 2016, Kasparov lançou um livro, intitulado O inimigo que vem do frio (Winter is coming, em inglês), em que compara o Governo russo à saga Guerra dos Tronos — tecendo uma crítica feroz ao Presidente russo, Vladimir Putin. Fã da série da HBO, Kasparov disse encontrar semelhanças entre Putin e a personagem de Tywin Lannister.

A sua oposição ao regime russo fez com que Kasparov cumprisse, em 2007, uma pena de prisão de cinco dias depois de ter participado numa manifestação contra o Governo russo, que não estava autorizada. Num tweet de 2016 dirigido a Mike Pence, Kasparov escrevia que Putin “era um líder forte da mesma forma que o arsénico era uma bebida forte”. E não é só o Kremlin que Kasparov tem vindo a atacar: o antigo campeão mundial de xadrez também tem contestado, sobretudo através do Twitter, as ligações da Administração Trump à Rússia.

Para além do activismo político, Kasparov dedicou-se também a temas como a inteligência artificial — interesse suscitado depois ter jogado duas partidas de xadrez na década de 90 contra o supercomputador da IBM, o Deep Blue, vencendo uma e perdendo a outra. Foi este o ponto de partida para que escrevesse o livro Deep thinking: where machine intelligence ends and human creativity begins (algo como Reflexão profunda: onde acaba a inteligência das máquinas e começa a criatividade humana, numa tradução livre), em que considera que não existe uma guerra entre os humanos e as máquinas, já que estas últimas são dominadas por nós.

Regresso ao xadrez temporário

Apesar de não jogar a nível profissional ultimamente, Kasparov tem continuado a jogar em algumas partidas e a promover a importância da prática do xadrez. Na página online do Grand Chess Tour, lê-se que o “lendário Garry Kasparov” é “um dos maiores embaixadores do xadrez a nível mundial”, tendo inspirado o Grand Chess Tour e ajudado a solidificar a parceria entre os organizadores.

Ainda assim, este regresso ao xadrez é temporário. Kasparov disse que não fazia tenções de deixar para trás a escrita, o activismo político e o tempo passado com a sua família.

Para além de Kasparov, também estarão em competição outros nove grandes mestres do xadrez em St. Louis: Hikaru Nakamura, Fabiano Caruana, Levon Aronian, Sergei Karjakin, Viswanathan Anand, Ian Nepomniachtchi, David Navara, Le Quang Liem e Lenier Dominguez.

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