Programa eleitoral de Corbyn comparado à "nota de suicídio" de 1983

Propostas, que só deveriam ser reveladas na próxima semana, incluem renacionalização dos comboios, correios e de parte da rede energética. Líder trabalhista fala em medidas "muito populares".

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Neil Hall/Reuters

Propostas “radicais” que recordam as ortodoxias socialistas do passado ou um conjunto de ideias “reformistas” capazes de evitar a pesada derrota nas legislativas que as sondagens prevêem? Num dia caótico, que começou com uma embaraçosa fuga de informação, o Partido Trabalhista britânico aprovou esta quinta-feira “por unanimidade” o seu programa eleitoral, por entre teorias da conspiração e muitas críticas.     

“Acreditamos que as políticas do nosso programa são muito populares, uma oferta que irá transformar as vidas de muitas pessoas e garantir que a 8 de Junho teremos um Governo que trabalhe para a maioria, não apenas para alguns”, disse o líder trabalhista, Jeremy Corbyn, à saída da reunião da cúpula do partido. 

O texto, que só deveria ser publicado na próxima semana, ainda não foi divulgado, mas não deve ser muito diferente das versões que chegaram quarta-feira à noite a várias redacções e que levaram o Daily Telegraph a escrever: “O programa de Corbyn para levar o Reino Unido de regresso aos anos de 1970”. Uma análise repetida pela própria primeira-ministra, Theresa May, que acusou a oposição de propor “um regresso ao passado”.

Entre as propostas, muitas delas já incluídas no programa com que Corbyn foi eleito, está a renacionalização dos transportes ferroviários — privatizados pelo governo de John Major em 1994 —, dos correios e de uma parte do sistema de distribuição e fornecimento de energia, bem como a abolição progressiva das propinas universitárias e o aumento do orçamento do serviço nacional de saúde financiado através da subida de impostos sobre as grandes empresas e os maiores rendimentos.

O programa, que inclui também o regresso das negociações colectivas em alguns sectores, “arrisca-se a colocar a economia britânica em marcha atrás”, reagiu a confederação industrial CBI. Paul Johnson, director do Instituto de Estudos Fiscais, disse ao Guardian que a proposta trabalhista implicaria um envolvimento do Estado na economia “inédito desde 1970, talvez mesmo desde 1940” e vários analistas compararam-na ao programa do trabalhista Michael Foot, em 1983, e que ficaria conhecido como “a mais longa nota de suicídio da História” face à retumbante vitória de Margaret Thatcher.

John McDonnell, porta-voz do Labour para a economia e um dos poucos a ter acesso prévio ao programa — o que levou a oposição interna a acusar os aliados de Corbyn pela fuga de informação (e estes a retribuírem as suspeitas) — negou as comparações com Foot, assegurando que as propostas do Labour são “extremamente modernas e progressistas”. O jornal Guardian lembrou também sondagens que mostram um grande apoio à renacionalização dos comboios e correios (uma das medidas mais polémicas do Governo de David Cameron) e prevê que o fim das propinas seja muito popular entre os mais jovens.     

A Economist escreve que a proposta “não vai cativar mais ninguém a não ser os apoiantes de Corbyn”. Mas com as sondagens a colocarem os trabalhistas 20 pontos atrás dos tories (que ambicionam eleger deputados em círculos que há décadas pertencem ao Labour), a estratégia de radicalização pode cativar os mais desiludidos, diz a editora de política da BBC Laura Kuenssberg. “Este será uma eleição em que os britânicos não poderão dizer ‘eles são todos iguais’”.      

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