Banco de Portugal perde "vice", tensão com o Governo continua

José Ramalho pediu a Carlos Costa para sair já, por razões pessoais. Marcelo tenta mediar conflito entre Governo e BdP. Carlos Costa não quer abdicar do nome vetado.

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Administração do Banco de Portugal perdeu um dos dois vice-governadores dro Daniel Rocha
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José Ramalho alegou razões pessoais para deixar já o cargo de vice-governador Enric Vives-Rubio
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Carlos Costa quer voltar ao Parlamento para "esclarecer todos os pontos" levantados pela reportagem da SIC Enric Vives-Rubio

O Banco de Portugal (BdP) já só tem cinco administradores em funções, depois de o actual vice-governador José Ramalho ter pedido a Carlos Costa para não ficar à espera de substituto - numa carta em que alegou razões pessoais para sair, sabe o PÚBLICO. José Ramalho acumulava o cargo de vice-governador do BdP com a presidência da comissão directiva do Fundo de Resolução, tendo sido já substituído pelo administrador Luís Máximo dos Santos nesta última função. Ficam, assim, três lugares já em aberto no órgão de topo do banco central. A que se juntará mais um que aceitou ficar à espera de um substituto para sair - Pedro Duarte Neves, precisamente o outro vice-governador em funções.

Mas nem o número reduzido de administradores em funções fez o governador do banco central recuar no braço-de-ferro que tem aberto com o Governo, para a escolha dos novos nomes para a sua equipa. Segundo apurou o PÚBLICO, Carlos Costa tem dado sinais de não abdicar da promoção de Rui Carvalho, o director do departamento de mercados, nome que propôs ao Governo e que já foi "chumbado" duas vezes pelo ministro das Finanças. Uma recusa que levou o governador a retirar toda a lista de quatro nomes que tinha entregue a Mário Centeno no início da semana passada (apesar de haver luz verde do Governo para três desses nomes).

Foi perante este impasse que o Presidente da República recebeu Carlos Costa no último fim-de-semana, em Belém, numa tentativa de ajudar a ultrapassar as divergências. Mas ontem, a tentativa presidencial ainda não tinha dado frutos - os nomes de Carlos Costa ainda não tinham sido enviados ao Parlamento. Pelo que, aos jornalistas, Marcelo optou esta segunda-feira por dar uma resposta cautelosa - e genérica - sem falar da reunião em Belém: "Não posso confirmar coisa nenhuma. Continuamos a fazer tudo, o Presidente também, no sentido de consolidar o sistema financeiro. É nisso que estamos a trabalhar todos, ainda teremos pela frente meses de trabalho nesse sentido. (...) Estamos todos a remar na mesma direcção. É isso que tem acontecido e que vai acontecer."

Mesmo genérica, a declaração de Marcelo dá um sinal importante para a esquerda parlamentar: a de que não tenciona deixar cair o governador, num momento em que este voltou a ser o alvo da esquerda: uma reportagem da SIC, sobre a gestão que o Banco de Portugal fez do caso BES, que mostrou documentos que Carlos Costa não entregou na comissão de inquérito realizada em 2015, chegou para que o Bloco e PCP voltassem a pedir a saída do governador, mas também para o líder parlamentar do PS, Carlos César, anunciar uma "reflexão" no PS sobre o tema.

António Costa foi mais prudente: disse na sexta-feira (e reiterou esta segunda-feira) que a “função” do Governo é “trabalhar leal e construtivamente” com o BdP na “estabilização do sistema financeiro”, que está “bastante melhor”. Deixando até a indicação de se ter conformado com um governador que preferia não ter no banco central: “Temos que aprender a trabalhar com as instituições tal como elas existem. É o que nós fazemos com o governador do BdP no dia-a-dia”. 

Esta segunda-feira, também Carlos Costa deu um sinal claro de pretender resistir às pressões para uma sua demissão. Em reacção à reportagem da SIC - e às críticas da esquerda -, o governador pediu para ir ao Parlamento "esclarecer todos os pontos" levantados por esta nova polémica, acusando a televisão de dar "informações gravemente distorcidas", que diz pretenderem "desacreditar a conduta do Banco de Portugal". A audição terá o acordo de todos os partidos e pode acontecer ainda esta semana. O primeiro-ministro reagiu a esta intenção com ironia: “Acho que é sempre saudável que haja um acompanhamento por parte da AR da actividade de supervisão e, se o governador [Carlos Costa] quer dialogar com a Assembleia, excelente”.

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