O “gelato” italiano chega ao Porto com sabor a Norte

Duas arquitectas trocaram os esboços pela alquimia do gelado italiano. Agora no Porto há um autêntico laboratório de sabores onde toda a arte é criada sob o olhar do público

Nelson Garrido
Fotogaleria
Nelson Garrido
Nelson Garrido
Fotogaleria
Nelson Garrido

No início da Rua do Bonjardim, a dois passos do Rivoli, há uma casa nova para os amantes de gelado — longe de ser um gelado qualquer. Aos sabores e produtos portugueses, duas amigas juntaram a técnica dos "gelatieris" italianos. É esta a proposta da Gelataria Portuense, que abriu as portas há quase duas semanas.

A ideia partiu de duas arquitectas. Ana Ferreira e Ana Gonçalves faziam um percurso profissional que dizem “normal”: o curso, trabalharam na área e seguiram por ali fora, a tentar evoluir na carreira. “Só que eu tenho 40, a Ana tem 45 e parece que de repente decidimos mudar de vida”, diz Ana Ferreira. Uma “certa altura” tornou-se na “altura certa” para partirem para Itália à procura do segredo de verdadeiro gelado italiano: dizem que o descobriram em Bolonha, naquela que foi a cidade-casa de Ana Ferreira quando esteve num programa de mobilidade Erasmus.

Hoje, para além de diplomadas em arquitectura, carregam o canudo e a arte de serem chefs "gelatieris". “Eu andava todos os dias a pensar que tinha de fazer alguma coisa diferente, alguma coisa que gostasse e que fosse para o resto dos meus dias.” Um dia — até lhe dizem que teve uma epifania — lembrou-se de que “não havia gelados italianos no Porto.” Apesar de a ideia não ser verdadeira — há de facto algumas gelatarias italianas na cidade —, Ana não desistiu e chamou a colega de profissão, Ana Gonçalves, para uma demanda pelo mundo dos chefs e da verdadeira culinária por detrás da gelataria italiana.

Foto
Nelson Garrido

Estudaram o mercado português e italiano, bebendo das influências do que viam e provavam. Acabaram por descobrir a peça essencial que faz os gelados que hoje servem aos portuenses: a máquina Effe da Cattabriga, inventada em 1927 pelo manufactureiro de gelados, o italiano Otello Cattabriga.

Na verdade, apesar de ser uma máquina, é ela que faz com que estes sejam dos gelados mais artesanais da cidade. E que permite que o gelado produzido seja “muito suave e muito macio” e “claramente mais denso”, como é comum na gelataria italiana.

Um gelado que carrega o selo de ter “muita, muita qualidade”, querendo contrastar com aqueles “gelados em que só se mistura o pó com água ou leite”. Esta é, pelo contrário, uma receita com muita química envolvida: “Estudamos a arte da química, a ligação das moléculas, a hidratação da proteína e toda essa parte da química do gelado que permite que ele seja diferente e que tenha outro sabor e outra textura na boca.”

Foi assim que conseguiram juntar o vinho do Porto a um puré de pêra e nozes caramelizadas e transformar um chá verde Matcha com chocolate branco e framboesa. A alquimia chega mesmo aos sabores clássicos do figo com requeijão de ovelha e mel. Um processo complexo a que qualquer pessoa pode assistir, pois é por trás do balcão que está outro dos segredos deste espaço: os clientes podem assistir à alquimia da transformação de fruta, chocolate, chá ou vinho num denso e cremoso gelado, retirado com uma “pá como se fosse o padeiro”, brinca Ana Ferreira.

Gelataria laboratório

O grande desafio que se colocava às duas arquitectas era o de fazer diferenciar o seu produto perante as dezenas de gelatarias que foram aparecendo na cidade nos últimos anos. Para isso, foi preciso “trazer o chef de culinária ao gelado”. E, para Ana Ferreira, o jogo de proporções entre sabores e a utilização de “ingredientes verdadeiros”, sem serem pré-preparados, são os elementos diferenciadores dos gelados servidos neste espaço.

A aposta das duas arquitectas passa também por desmistificar a ideia de que o gelado é uma guloseima e de que é muito calórico. “O gelado italiano não é bem assim”, nota Ana. “Um gelado industrial tem 20 ou 30% de gordura. Um gelado italiano tem, no máximo, 10%. Não é um produto assim tão mau quanto isso. Aliás, em Itália, até é considerado um produto extremamente nutricional”, explica.

A produção é adaptada consoante os produtos e as frutas da época, para que o gelado seja sempre produzido a partir de ingredientes naturais. “Queremos ter sabores que sejam de cá, frutas portuguesas, de preferência o mais perto possível, de produtores locais para ir directamente à origem. O nosso mirtilo é biológico do Douro”, explica a arquitecta.

A Gelataria Portuense oferece 22 sabores. Seis deles são “de colecção”, por serem criados pela casa e variarem consoante os produtos que certa estação do ano dá. A cozinha é uma autêntica sala de experiências de sabores que valem a este espaço o título de “gelataria laboratório.”

Lê o texto completo em FUGAS.PUBLICO.PT

Sugerir correcção
Comentar