Não, não foram os exames…

Para promover o sucesso escolar e combater o abandono precoce não é de mecanismos de limpeza e de exames que precisamos.

1. Os cursos vocacionais no ensino básico afastaram compulsivamente do ensino regular milhares de alunos, nos últimos anos. Alunos com historial de repetência e mais de 12 anos foram relegados para estes cursos, verdadeiros becos sem saída, que funcionaram, na prática, como mecanismos de “limpeza” das escolas no que respeita aos casos de insucesso escolar.

Segundo dados da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, no ano letivo 2013/14 matricularam-se naqueles cursos cerca de 10.000 alunos, do 2.º e do 3.º ciclo; no ano de 2014/15 foram já cerca de 24.000 os alunos matriculados; e no ano letivo que agora termina, foram cerca de 28.000. Com o tempo, o processo de eugenia do ensino regular ganharia mais eficácia, ficando nas escolas e no ensino regular apenas os considerados melhores. E assim se melhoraram os indicadores sobre os resultados escolares dos alunos do ensino regular. Não, não foram os exames, nem foi a maior exigência!

2. Melhorar os resultados escolares através de mecanismos de seleção e de relegação dos alunos com dificuldades significa desistir de ensinar todos, significa condenar precocemente milhares de jovens a um futuro desqualificado e desqualificante, significa não cumprir o que está estabelecido na Lei de Bases, significa comprometer o futuro dos jovens e do país.

Em boa hora, pois, o atual governo extinguiu o ensino vocacional, propondo às escolas, em alternativa, meios e condições para a promoção do sucesso escolar de todos os alunos, procurando transformar a diversidade existente nas escolas numa vantagem. Com esta decisão, no próximo ano letivo, o mecanismo de limpeza não funcionará plenamente. Os alunos com um histórico de insucesso escolar manter-se-ão no ensino regular e nas escolas, pelo que pode acontecer que as taxas de repetência venham a ser afetadas negativamente. Esperemos que não, mas se tal acontecer, será, por uma vez, por boas razões.

3. Promover o sucesso escolar é o desafio mais importante e mais difícil enfrentado pelos professores e pelas escolas. Um desafio que exige atenção particular ao primeiro ciclo, onde tudo começa, e que requer a mobilização de recursos para o reforço das equipas e dos meios pedagógicos. Exige, sobretudo, mais tempo de trabalho e de estudo por parte dos alunos com os seus professores.

Tão urgente como a promoção do sucesso escolar é o combate ao abandono escolar, evitando a saída antecipada de jovens que atingem os 15 anos de idade sem concluir o ensino básico. Tal requer ofertas alternativas de formação, do tipo dos Cursos de Educação Formação (CEF). Mas, ao contrário do que se passava com os cursos vocacionais, estes cursos devem servir para retirar alunos do abandono escolar, não para afastar alunos do ensino regular.

Para promover o sucesso escolar e combater o abandono precoce não é de mecanismos de limpeza e de exames que precisamos. Os exames são apenas instrumentos de avaliação da qualidade das aprendizagens. São como os termómetros, permitem medir a febre, não curar da doença. Em nenhum país do mundo, em nenhum tempo histórico, em nenhum ciclo de ensino, os exames provocaram a melhoria dos resultados escolares. E o nosso país não é uma exceção. Não, não foram os exames!

Ex-ministra da Educação

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