O que querem os partidos com o inquérito à Caixa?

Nesta terça-feira toma posse a comissão de inquérito à Caixa e nem todos queriam lá estar. Será uma comissão politizada? Prejudicial à CGD? As respostas dos deputados.

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Daniel Rocha

Questões:

1. Quais são os principais objectivos do seu partido nesta comissão de inquérito?
2. Será uma comissão mais politizada do que as anteriores que tiverem bancos como objecto?
3. As principais dificuldades não serão essa politização por um lado ou, de um lado mais técnico, o sigilo bancário?
4. Acredita que a comissão de inquérito será prejudicial à Caixa?

Hugo Soares (PSD)

1. Os objectivos que temos passam por cumprir o objecto da comissão. O que foi a gestão da Caixa naquele período de tempo e tentar perceber porque a Caixa chegou a esta situação. Porque os portugueses são os accionistas e tem de ser apurado tudo até às últimas consequências.

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2. Julgo que a comissão tem de ser sustentada num trabalho técnico, análise de documentos. Agora é evidente que tem uma componente política. Todas as intervenções têm por base um respaldo dos deputados que é técnico, mas tem de ser político. Coisa diferente é ser politizada. Espero que não seja politizada, nem partidarizada. Não é esse o nosso objectivo. Não vamos com preconceitos nem com alvos direccionados e daí o horizonte temporal ser mais alargado. Temos de apurar todas as responsabilidades, sejam de quem forem. 

3. Aparentemente, não me parece que haja uma vontade dos partidos à esquerda que seja firme, inequívoca e sem tibiezas nesta comissão de inquérito. A esquerda mostrou-se muito adversa à comissão de inquérito. E ainda não percebi porquê. Julgo que esta será a principal dificuldade. As outras dificuldades que motivaram a constituição da comissão de inquérito, que passavam sobretudo pela não resposta do Governo e falta de informação, estão ultrapassadas, porque o Governo é obrigado a prestar informações. Espero que a principal dificuldade não seja a partidarização. 

4. Não, pelo contrário. O que é prejudicial é esta desconfiança em relação à gestão da Caixa. 
 

João Paulo Correia (PS)

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1. O nosso principal objectivo é esclarecer a gestão que foi feita durante o período anterior a 2015, que é o período que coincidiu na sua esmagadora parte com a anterior governação. Queremos perceber as tomadas de decisão que foram feitas pelas sucessivas administrações e os prejuízos que foram causados ao banco, para que a Caixa assuma estas necessidades de recapitalização. Mas também queremos avaliar as não tomadas de decisão. E porquê naquele período? Estranhamos que o PSD proponha uma comissão de inquérito que recai na sua governação quando teve informação sobre a actividade da CGD e da entidade supervisora. É muito importante esclarecer porque o anterior Governo decidiu não agir. Porque a capitalização que foi feita em 2012 não resultou. 

2. Veremos. É certo que nasce da vontade de um único partido. Esta pergunta está inflacionada de o partido proponente ter usado esta obrigatoriedade. Se parece mais politizada é porque o partido que a propõe tem usado a comissão de inquérito nos discursos como joguete político.

3. Enfrentaremos iguais dificuldades de outras comissões como o Banif e do BES e estamos muito empenhados no esclarecimento dos nossos objectivos.

4. Não tenho a certeza, mas não será favorável à situação da Caixa, porque é um banco em actividade. Esse objectivo central sempre foi do PSD e CDS. Estar com uma comissão de inquérito a um banco que está em actividade não é favorável, o mais certo é contar que seja prejudicial.

Moisés Ferreira (BE)

1. Vamos ver como se desenrola a comissão de inquérito, mediante a informação pode haver outros caminhos por onde ir. O que para o BE interessa é perceber se a actual necessidade de recapitalização recorre do avolumar de imparidades dos anos anteriores e, se sim, quais são as imparidades. Se apareceram pela deterioração da actividade económica ou se resultaram de uma fraca análise ao risco de créditos concedidos. Até se pode colocar a questão da utilização da CGD. Também há a questão de perceber se foram operações normais ou se pode suscitar dúvidas legais. E se assim for, reencaminhar as conclusões para o Ministério Público.

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2. Creio que as comissões de inquérito têm sempre essa dupla vertente. Veremos com que atitude estão os partidos nesta comissão de inquérito. O BE sempre recusou que fosse uma comissão de inquérito à recapitalização e se assim fosse seria absurdo e imprudente. Parece-nos que esse objectivo é claramente um objectivo político, de uma agenda de até privatização da Caixa. Creio que o PSD tem demonstrado que tem esse objectivo político e basta ver as declarações nos últimos anos sobre a comissão de inquérito. O objectivo do BE é defender a Caixa como banco público. 

3. Pode ser uma dificuldade. Comissões de inquérito sobre bancos têm sido sobre bancos em resolução ou já moribundos. Isso agora pode levantar dificuldades. Daí o BE manter a proposta que se realize a auditora forense, como instrumento mais adequado.

4. Depende do rumo que os vários partidos traçarem. Se for no sentido de apurar responsabilidades sobre quem tomou decisões, isso salvaguardará a Caixa para futuro. Se o objectivo for o de desvalorizar a Caixa, isso prejudica, mas o BE não alinhará nessa discussão e nesse objectivo. 

João Almeida (CDS)

1. O principal objectivo é o de avaliar aquilo que foi a gestão da Caixa durante este período - que é um período longo - e perceber até que ponto a Caixa, sendo banco público, teve uma gestão diferenciadora. A segunda tem a ver com o facto de ser ou não uma gestão adequada e de como concedeu ou não crédito.

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2. É mais política por uma razão: é um banco em que o accionista é o Estado. A gestão tem sempre a decisão do accionista, como o Estado é accionista, tudo aquilo que tenha a ver com as decisões do accionista, que é político, é também objectivo da CPI. 

3. Os poderes que a comissão de inquérito tem dão para aliviar tudo isso. À partida não são de nenhuma dificuldade. O facto de o objecto ser mais político, não obriga a que seja mais politizada. Não pretendemos isso. A comissão de inquérito vai passar por várias administrações e várias tutelas.  Não há uma orientação do objecto para determinada orientação partidária.

4. Não. Acho que todos os que participamos na comissão de inquérito queremos que um dos objectivos deve ser o esclarecimento público. Não é a comissão de inquérito que leva a que a Caixa esteja sobre pressão. A indefinição na orientação da CGD, o facto de há meses se falar numa recapitalização e não se saber o valor, de se conhecer uma administração e essa não tomar posse… Esses, sim, foram factores de instabilidade da Caixa. A comissão de inquérito deve contribuir para a transparência.

Miguel Tiago (PCP)

1. Em primeiro lugar importa destacar que o PCP, desde o primeiro momento, identificou nos autores da Comissão de Inquérito, PSD e CDS, uma intenção que não é esclarecer coisa nenhuma, nem defender o interesse público, sobretudo numa altura em que se discute a recapitalização da Caixa. Apesar de não ser o objectivo do inquérito, não vamos deixar, ao longo da comissão, de fazer com que o PSD seja responsabilizado por fazer um inquérito ao banco público ao mesmo tempo que este banco está a trabalhar e num processo de recapitalização. Não é o nosso objectivo, mas não vamos estar com os mesmos objectivos do PSD. O nosso objectivo é apurar a verdade. O PCP foi contra a constituição da Comissão de Inquérito. Participaremos nos trabalhos com empenho, pelo apuramento da verdade e das responsabilidades políticas.

2. Julgo que o enfoque sobre as responsabilidades partidárias pode vir a ser muito maior, porque a Caixa foi e é gerida, ao longo do tempo, por PS, PSD e CDS, e são esses os partidos que têm participado nos sucessivos governos.

3. Para o objectivo do apuramento das responsabilidades políticas não se pode considerar que a politização seja um problema. Se estamos a apurar responsabilidades políticas é natural que o assunto seja politizado, tal como noutras comissões. Do ponto de vista técnico, o sigilo bancário tem-se revelado nestas comissões como um obstáculo ao apuramento da verdade, mas não tem prejudicado a capacidade do apuramento politico. Podemos ficar sem saber quem recebeu o dinheiro, mas ficamos sempre a saber que a supervisão, a lei e os governos o permitiram. Uma comissão de inquérito não vive de apurar responsabilidades criminais. Percebemos na mesma como funcionam os esquemas.

4. Já está a ser. Como é compreensível num sistema que vive da confiança e da estabilidade – o principal activo da banca é a confiança dos depositantes –, num banco em que estão a ser lançadas tantas dúvidas é natural que haja perdas. Pode não ser fuga de depósitos, mas investimento que possa estar a ser afastado, por exemplo. Qual é o elemento de publicidade de um banco? A Caixa está há meses com uma campanha publicitaria anti-Caixa feita pelo PSD e CDS. Com Maria João Lopes

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